Mais do que contar o que mudou no HB20 hatch, gostaria de entender o sucesso desse sul-coreano caipira, feito em Piracicaba (SP). Antes de contar as (poucas) mudanças que o HB recebeu, melhor explicar o que considero fenômeno. Enquanto quase toda a indústria de automóveis que produz por aqui passa por uma enorme crise, a Hyundai paulista vai muito bem, obrigado. Assim como as nisseis Honda e Toyota, que continuam acelerando, o HB20 passa ao largo da crise. Segundo Cássio Pagliarini, diretor de marketing da Hyundai, o que mudou foram os carros em estoque na fábrica: normalmente se trabalhava com dois dias de produção como estoque, o que agora aumentou para sete ou oito dias. Mesmo assim, a fábrica continua trabalhando 24 horas por dia, em três turnos, e a produção deverá bater sua capacidade máxima, de 180 mil HBs em 2015. Só para comparação, fabricantes tradicionais — depois de redução de turnos, férias coletivas, demissões etc. — estão com o estoque no pátio da ordem de 50 dias. E olhe que a Hyundai/Brasil trabalha com único modelo, o HB20, com três versões (hatch, sedã e “aventureiro”). Se isso não é um fenômeno em meio a um País que bate no guardrail em todas as curvas da política e economia, não sei como explicar o significado desta palavra.
Mesmo assim, a Hyundai resolveu dar um “banho de loja” no seu produto, mudando um pouco o visual e refinando a parte mecânica.
Na estética, as mudanças foram mínimas, apesar de alterarem principalmente a frente do HB20 hatch, o único modelo que agora recebeu este facelift de meia-vida. Como de hábito, o HB recebeu as novidades após três anos de produção, o que indica uma vida de seis anos para o produto.
Simples de contar: mudou a grade dianteira, que passou a ser hexagonal, inclusive aproveitando o mesmo espaço das duas grades que eram separadas pelo pára-choque. Faróis e lanternas traseiras mantém o formato, mas foram aperfeiçoados. Os faróis, na versão de topo Premium, contam com LEDs diurnos (DRL – Daytime Running Lights) e refletores canhão. Na traseira, as lanternas das versões Premium e Comfort Style agora são Clear Type (distribuindo a luminosidade de forma mais homogênea), além da inversão de posição da parte vermelha e translúcida. Exceto pela grade (que lembra alguns modelos da Ford), as alterações externas são bem sutis, como é o caso dos pára-choques. Só quem tem o HB agora “antigo” vai perceber. Algumas firulas internas também foram alteradas, com frisinhos e mudanças bem sutis. Claro o obrigatório Black Piano (nome marketeiro para o velho preto brilhante) também aparecem em alguns detalhes e painel.
Também quem gosta mais de celulares do que carros ficará mais feliz, já que surge o opcional da central de entretenimento/informação BlueMedia, que permite espelhamento com com smartphones e, a partir de 2016, com iPhones.
Claro, novos desenho de rodas de liga e calotas, tecidos diferentes nos bancos completam a renovação.
As mudanças são simples, mas conseguiram animar o visual do compacto premium de 3,90 m de comprimento. Aliás, surge uma versão chamada Premium, só com motor 1,6, que traz mais sofisticação, como estofamento em couro marrom escuro, mais dois airbags, ar digital, espelhos com rebatimento automático e outros quetais. Porém, seu preço não chega a ser tão atraente: com câmbio automático e central multimídia vai aos R$ 63.535. Nesta faixa, já existem muitas boas opções de outras marcas em categorias superiores. Ainda mais que a versão mais básica do HB20 — a Comfort 1,0 (com ar-condicionado, direção assistida, vidros e travas elétricas) começa nos R$ 38.995.
Consumo A
Mecanicamente, as mudanças foram mais profundas no HB20 com motor 1,6 quatro cilindros, que tinha consumo categoria B no Inmetro/PBE, e agora passou a A, como já acontecia com o 1,0 três-cilindros. Ambos são flex. Os dois motores ganharam novos pistões “mini-saia”, isto é, com saias mais curtas e de menor atrito. Definitivamente, os pistões canecões estão foram de moda por conta do meio ambiente. Também ganharam novos anéis (novamente menor atrito), velas de irídio e nova programação de gerenciamento eletrônico de motor. Uma solução inteligente está no alternador, que carrega mais a bateria quando o motor não está em situação de carga, como em frenagens e uso prolongado do freio-motor. Ou seja, usa mais energia que seria desperdiçada. Porém, a assistência de direção continua hidráulica e ainda existem outros recursos para serem adotados para maior economia de combustível.
Nas versões 1,6, ambos os câmbios — manual e automático — agora têm seis marchas. Uma boa mudança, principalmente no automático, que era bem fraquinho com suas quatro marchas “bicudas” e com grande distância entre as relações. O câmbio automático conta com o “me-engana-que-eu-gosto”, ou seja, a possibilidade de trocas manuais. No HB20 1,0 o câmbio manual continua com cinco marchas.
Aliados a pneus “verdes”, de menor atrito de rolamento, os carrinhos ficaram entre 6% (1,0) e 6,5% (1,6) mais econômicos, segundo a Hyundai. Um bom resultado para poucas mudanças. Porém, apenas o motor 1,6 perdeu o famigerado “tanquinho” de partida a frio (com aquecimento da flauta de injeção). O bendito reservatório continua no 1,0.
Potência e torque máximos permanecer os mesmos, com 80 cv a 6.200 rpm e 10,2 m·kgf a 4.500 rpm no motor 1,0 de 4 válvulas por cilindro. No 1,6 16v os valores são 128 cv a 6.000 rpm e 16,5 m·kgf a 4.500 rpm, sempre com álcool. Com gasolina a potencia cai para 75 cv e 122 cv, respectivamente.
Além das sutis melhorias no motor, que até deixaram o funcionamento mais suave, pequenos ajustes surgiram nestes três anos de produção. A suspensão, por exemplo, está mais amigável, abrasileirada, sem barulhos de amortecedores. E no geral, ambos os HB20 (1,0 e 1,6) continuam agradáveis de dirigir. Não mais que agradáveis, sem grandes destaques, bem “escola japonesa”: tudo certinho, tudo funciona, mas sem uma personalidade marcante. O 1,6 acelera direitinho (0 a 100 km/h em 9,3 s), enquanto o 1,0 é um pouco lerdão (14,9 s). Máxima de 160 km/h e 190 km/h, respectivamente para o 1,0 e 1,6, com álcool.
A economia de combustível pode ser percebida principalmente no 1,6, que em sexta marcha (bem overdrive) no câmbio manual, tem seu motor girando a apenas 2.800 rpm a 120 km/h. O único fator estranho está nos novos pneus “verdes”, um equipamento que já evoluiu bastante, mas continua complicado. Estes pneus com sílica têm menor atrito com o piso, melhoram o consumo, mas não gostam de curvas. Qualquer pilotagem um pouquinho mais esportiva e lá vem uma ópera dos pneus, que cantam em qualquer curva mais ousada. Por enquanto, é o preço que se paga para ser mais amigo do meio ambiente. Ficou mais econômico (a Hyundai indica para o ciclo estrada 13,8 km/litro e 14,1 km/litro, para o 1.6 e 1.0), mas ainda distante de um campeão de economia como o VW up!, principalmente o TSI.
Aí surge a pergunta: o HB20 é um carro de entusiastas? Não me parece. É o que muitos consumidores querem, com tudo certinho, boa dose de design ousado e atraente, uma pitada de status… mas um carro para quem não se importa com emoções ao volante.
E voltamos ao inicio desta matéria: quais as razões para o carrinho ser um sucesso não só instantâneo, mas também duradouro? Claro, confiabilidade na marca, desenho, status, acabamento correto, durabilidade (que já parece boa, depois de três anos de produção) ajudam a explicar. Mas existem alguns fatores desconhecidos, que valem milhões para qualquer fabricante, já que todos sonham em fazer um modelo com tanto sucesso. O HB20 está sempre entre os cinco mais vendidos, às vezes em segundo lugar, desbancando tradicionais concorrentes como o VW Gol e só perdendo para o Onix em setembro.
Entre as qualidades para ser um carro desejado, certamente está a marca. Até poucos anos atrás, a coreana Hyundai, além de pouco conhecida, era mais confundida com os chineses. Com a revolução de design iniciada há menos de uma década, ela conseguiu se alinhar aos japoneses. Algo tão rápido que só consigo comparar a subida de status da marca com a Audi no Brasil. Trazida por Ayrton Senna, no início dos anos 1990, a Audi desbancou Mercedes e BMW em meses no quesito status. Enquanto na Europa um Audi era um mero segundo carro de quem tinha Mercedes ou BMW, no Brasil ela logo se tornou a primeira das alemãs de luxo.
E quanto ao design, novamente voltamos aos anos 1990. Começo dos carrinhos 1,0, todos modelos com motores maiores que tiveram sua cilindrada reduzida, a chegada do Chevrolet Corsa provocou uma comoção exatamente pelo seu design inovador. A ponto de André Beer, então vice-presidente da GM, ir a televisão pedir calma, dizendo que a produção ia aumentar e haveria Corsa para todos.
Pois é, de alguma maneira pouco explicável o HB20 conseguiu reproduzir o duplo fenômeno de status da Audi com a paixão pelo desenho que o Corsa provocou. Pelo menos esta é minha explicação lógica num fenômeno que sempre tem uma enorme dose de falta de lógica. E isto não se explica. É aquela sensação puramente emocional de “quero ter este carro”.
Quem consegue ver mais longe que eu, fique à vontade para ajudar a explicar. Tarólogos e numerólogos são bem-vindos.
JS