Temporada termina com repetecos bons e ruins da F-1 até os campeonatos regionais, sementes plantadas em todo o planeta e a torcida por uma boa colheita. Torcida é para 2016 ser marcado pela consolidação do automobilismo de raiz e a volta das grandes disputas.
Refletir sobre o que aconteceu e prever o futuro é tarefa das mais ambíguas, ou como diria Luiz Carlos de Oliveira (meu primeiro editor no jornal O Estado de S. Paulo, mais conhecido como “Barriga”), “uma linha tênue”: corre-se o risco de apontar o óbvio ou escorregar na criatividade. A F-1 ficou longe disso: a segunda temporada consecutiva de domínio da Mercedes-Benz deixou claro que os alemães são bons em planejamento tanto no futebol quanto naquilo que os ingleses chamam de “ápice do automobilismo internacional”. Graças a um investimento de primeiro mundo, conseguiram formar material humano e tecnológico de primeira qualidade. Enquanto nas pistas desenvolviam um pessoal coeso nos últimos anos dos carros movidos unicamente por motores de combustão interna, nos laboratórios eram pesquisadas as melhores soluções para as tais unidades de potência que transformaram aqueles outrora astros em coadjuvantes.
O resultado é que nem a Renault, tampouco a Ferrari puderam evitar que Lewis Hamilton e, em menor grau, Nico Rosberg, tivessem adversários consistentes na segunda temporada dos carros híbridos. O planejamento alemão deu tão certo que, considerados o retorno publicitário da marca, o montante de patrocínio e os prêmios acumulados em 2016 permitiram que a operação F-1 da Mercedes terminasse com um significativo lucro financeiro. E levante a mão quem insista em dizer que a categoria é um esporte e não um negócio…
A criar um contraponto nesta conclusão, a maneira como a FOM (Formula One Management) e sua controladora CVC Partners exploram a categoria mostram que a ganância e a avareza são valores nada elogiáveis mesmo no cruel ambiente de negócios. Conseqüência da busca desenfreada por lucros e apenas lucros, a F-1 não renova sua legião de fãs ao impor ingressos caros, separar seus artistas do público e insistir em rejeitar o poder de comunicação da internet. Com o poder enfraquecido, Bernie Ecclestone, o líder supremo e quase imortal, tentou revisar profundamente o regulamento da categoria e até lançou uma concorrência para que um fabricante independente fabricasse motores atmosféricos de “baixo custo” para atenuar o domínio crescente dos grandes fabricantes de automóveis. Não deu certo. O ano de 2015 mostrou que a estrutura que Ecclestone desenvolveu em quase meio século de crescimento astronômico será herdada por empresários acostumados a lucrar milhões vendendo o que o público quer comprar, os mesmos empresários que lutam para manter a indústria automobilística lucrando como sempre.
Na base dessa pirâmide estão os campeonatos disputados regionalmente, ou como diem nossos hermanos, os “zonales”. Sem um centésimo da tecnologia ou um milionésimo dos recursos financeiros esbanjados na F-1, aqui o que vale é a diversão materializada na eterna luta entre o homem, a máquina e a velocidade. Carros antigos, a maioria já fora das linhas de produção, em muitos casos modelos clássicos, fazem as vezes de bólidos e possantes capazes de disputar cada freada e contornar curvas em contraesterço espetacular. No Brasil, o grande momento desta vertente foi a Cascavel de Ouro disputada no segundo semestre.
No meio do caminho entre dois pontos estão categorias de base que igualmente vivem uma fase importante de renascimento. A Formula 4 internacional ocupa o vazio deixado pela F-3 que se sucumbiu aos seus custos cada vez mais altos: no campeonato alemão da primeira, o organizador ADAC (Automóvel Clube da Alemanha) anunciou recentemente que dilatou o limite de 42 inscrições para atender a uma demanda superior a 50 jovens pilotos (incluindo quase um décimo de meninas), querem competir na temporada que começa dia 17 de abril. No Brasil, Marcos Galassi segue desenvolvendo seu projeto de F-Inter, um carro a altura da capacidade tecnológica brasileira e da realidade econômica do País.
Outra linha tênue que compõe o cenário do esporte a motor brasileiro diz respeito á linha da vida de nossos autódromos. Ao mesmo tempo que o Circuito dos Cristais, localizado em Curvelo (MG), ganha forma para ser inaugurado em março e os proprietários do autódromo Velo Città desenvolvem estudos para receber categorias como a Stock Car, Interlagos segue alvo de desmandos e irresponsabilidade dos poderes estabelecidos e aqueles que pretendem chegar até ele. A prefeitura paulistana segue gastando irresponsavelmente em reformas de qualidade ridícula e João Dória Jr. lança sua pré-candidatura a sucessor de Fernando Haddad anunciando que “se eleito for vou vender o parque Anhembi, o estádio do Pacaembu e o autódromo de Interlagos”. Honrando a postura da Confederação Brasileira de Automobilismo (CBA), que nada fez para impedir a destruição do autódromo do Rio de Janeiro, a destruição parcial do de Brasília e a inatividade para recuperar as pistas de Caruaru e Fortaleza, a Federação de Automobilismo de São Paulo (Fasp) segue praticando uma política de enfrentamento com a SPTuris (a administradora de Interlagos) que já demonstrou ser tão nula quanto o investimento que a entidade faz para promover o esporte e valorizar os profissionais que vivem do esporte.
Que 2016 venha traga ventos a favor do nosso esporte e para todos os entusiastas que sonham com um automobilismo forte e saudável.
Aproveito para desejar a todos um Ano Novo feliz e profícuo.
WG