Dirigir e viajar, por qualquer meio de transporte, embora ainda não tenha experimentado o riquixá, estão entre minhas atividades favoritas. E faço as duas coisas com muitíssima frequência. Mas sempre tem alguma coisinha que me surpreende, mesmo sendo eu uma pessoa curiosa, que lê tudo, ouve tudo e se informa de todas as formas possíveis.
Um par de anos atrás trafegávamos pela rodovia Castello Branco, uma estrada estadual em São Paulo. Meu marido Ricardo no volante, mãe no banco de trás e eu no do carona. Trânsito mais ou menos pesado, mas andando, e nós na faixa da esquerda. Pouco depois de Alphaville, o carro da frente faz um desvio inesperado de direção. Foi tudo muito rápido: o carro da frente fazendo o “S”, o objeto estranho no meio da pista e meu marido copiando a trajetória do carro adiante. Apesar dos bons reflexos, passamos parcialmente por cima do obstáculo. Ao olhar para trás, enquanto era “ejetada” para outra pista por uma Kombi, vi uma peça que parecia um cardã de caminhão, mas não quis acreditar. Afinal, cardã não cai assim. Pensei que era algo que havia caído de uma caçamba. Mas com os carros desviando e/ou passando por cima, era difícil entender o que era. Ao tirar as mãos do volante para ver o alinhamento, o Ricardo percebeu que o carro puxava para o lado. Imediatamente fomos para o acostamento. Paramos atrás de seis carros e duas motos, todos com o pisca-alerta ligado e com um, dois ou mais pneus furados. O tragicômico foi que enquanto descíamos do carro continuavam chegando veículos. Enquanto pegava meu celular para ligar para a concessionária para avisar do objeto contei 12 automóveis, uma Kombi e duas motos, mas quando ainda estava na espera continuava parando gente.
O motorista do carro imediatamente atrás de nós estava ao meu lado no acostamento e escutei claramente o diálogo surpreendente que ele teve com a atendente da concessionária:
— Eu queria reportar que tem um objeto na pista na rodovia Castello Branco, na altura do km 26, sentido interior. É melhor vocês mandarem alguém para retirá-lo e vários guinchos, pois tem diversos carros e motos que precisam de socorro mecânico.
— … (Não sei o que a atendente disse)
— Se é uma emergência? Neste momento tem 12, não, 13, não, 14 veículos e continuam chegando. O que você acha?
Faço um parênteses aqui para dizer que nunca deixo de me surpreender com o despreparo dos atendentes de call centers de todos os tipos — chame de receptivos, ativos, qualquer coisa. É raríssimo alguém bem treinado. Pior ainda quando é uma pessoa que deve lidar com emergências, como seria o de alguém que está numa concessionária de estrada e que teria de estar pronto para esse tipo de chamado.
Mas voltemos ao múltiplo acidente. No nosso caso, o estrago foi “apenas” o pneu dianteiro esquerdo. Digo apenas porque comparo com os outros. A maioria acabou com dois pneus do mesmo lado e não tinha nem como sair de lá. No nosso caso, enquanto eu telefonava para a concessionária, meu marido foi pegar o estepe, macaco etc. Eu já estava sendo abordada pelos outros motoristas que queriam fazer um grupo para ver se seria o caso de fazer uma ação coletiva contra a concessionária, já que muitos tiveram grandes prejuízos, inclusive com quebra de suspensão. Mas ele é cavalheiro e não ia pedir para minha mãe ajudar a tirar todas as coisas do porta-malas e trocar o pneu, né? Vendo a situação, um motoqueiro que havia parado porque o companheiro dele havia passado por cima da peça, veio ajudar espontaneamente, sem que ninguém nem falasse nada. Supereducado, atento, contou o Ricardo. Ao terminar, não quis nem aceitar uma caixinha. Mas disse uma coisa que meu marido nunca esqueceu e que eu sempre conto: “Não precisa me agradecer, mas quando vir alguém que precise de ajuda, lembre de mim e ajude essa pessoa.” Não é lindo? Nessas horas volto a acreditar na humanidade. E sempre que ajudo alguém, me lembro dele.
Fora essa parte linda da história, o resto foi um perrengue. Consertamos o pneu no dia seguinte para não ficar sem estepe e na segunda-feira entrei em contato com a concessionária. Manda prova disso, daquilo e aí descobri uma coisa: apesar de pagarmos pedágios caríssimos, a empresa não tem lá muita responsabilidade sobre a via. Alega que o contrato é de vistoriar a pista a cada “xis” horas (depende de cada concessão, mas os intervalos são de algumas horas, mesmo em vias muito transitadas) e como aquela estrada havia sido vistoriada, sei lá, uma hora e meia antes e não havia nada, ela não tinha nenhuma responsabilidade. É sério.
Até hoje não entendo a lógica disso. Se eu pago para a concessionária manter a via, ela deveria ser responsável por mantê-la em condição de trânsito. Se ela considera que a responsabilidade é do veículo que deixou cair a peça, ela que processe a empresa de caminhões. Mas deveria ser dela de quem eu deveria receber a indenização. Por analogia, penso no caso do vazamento de lama de Mariana. O processo é contra a empresa Samarco. Se ela considerar que um determinado executivo ou fornecedor é responsável, ela tem todo o direito de processá-lo, mas não faria sentido o Estado processar o senhor Fulano de Tal. No caso da estrada, o pedágio é pago à concessionária para que ela cuide da estrada.
Do grupo de vítimas do cardã assassino (pois era disso mesmo que se tratava), cada um resolveu a história de uma forma. Teve gente que pagou do próprio bolso,outros que brigaram com a concessionária, depois com a empresa de caminhões, entraram no juizado de pequenas causas… Um complicador a mais foi o seguro da empresa de caminhões estava vencido. Enfim, mais uma daquelas tarefas das quais eu cuidei e que me deram muito trabalho. Mas o faço pelo princípio. Nos custou um pneu novo, bem caro. E muito, muito tempo. Mas brigo pelo que é certo e para que cada um faça o que deve fazer, apesar de me matar de raiva e de me fazer despender um tempo que não tenho. No caso, a empresa de caminhões, já que com a concessionária era favorecida por um contrato que estava do lado dela. De bom, apenas ter conhecido aquele motoqueiro que nem entrou no grupo de acidentados e cujo nome não me lembro, mas que me deixou uma linda lição de vida.
Mudando de assunto: até que enfim recomeçou a Fórmula 1. Tenho problemas de abstinência entre o final de uma temporada e o começo da outra. Apesar de algumas novidades como as regras para os treinos de classificação, tem coisas que parece que nunca mudam. Como comentarista achar que Fernando Alonso por ser experiente e bicampeão mundial não erraria quando acertou o carro de Estéban Gutiérrez. E ainda o mesmo comentarista insistir em dizer quando o mexicano desceu e foi ver se estava tudo OK com o colega que ele teria feito isso por saber que ele, Gutiérrez, tinha cometido um erro. Me poupe. Mesmo sendo de madrugada e já um pouco sonolenta, vi várias vezes a cena e era nítido que Gutiérrez não mudou nem um milímetro a trajetória nem freou antes. E sim, por mais brilhante que Alonso seja tanto ele quanto outros já erraram e continuarão a fazê-lo. Se fosse fácil dirigir um carro a 300 km por hora haveria milhões de pilotos. Ainda bem que não aconteceu nada com nenhum deles. E, claro, adorei a largada do Kimi Räikönnen, na curva, por fora. Na parte cosméticos e perfumaria, amei a pintura retrô da Ferrari, o preto fosco da Red Bull e o capacete do Kimi Räikönnen. E o prata das Mercedes continua lindo.
NG