Não, o meio-termo entre carro e moto não é o triciclo. Apesar de ter três rodas, numericamente a média entre dois e quatro, o triciclo é apenas uma coisa estranha sobre rodas que consegue reunir todos os defeitos de motos e carros em um único veículo: não faz curva, freia mal, é difícil de pilotar, a gente toma chuva, paga pedágio como um carro, ocupa espaço de automóvel na garagem… a lista de “qualidades negativas” é enorme.
O meio termo, acredito, é o scooter, que realmente consegue reunir muitas das qualidades de duas e quatro rodas. Protege mais os ocupantes, tem a parte mecânica resguardada (sem “graxa” aparente), geralmente tem um grande porta-objetos à prova de chuva e poeira… além de ser fácil de pilotar.
No Brasil, os grandes fabricantes (Honda e Yamaha) dormiram no ponto por décadas, deixando o mercado por conta de empresas menores (Suzuki deitou e rolou com sua linha Burgman – 125, 400 e 650), enquanto o mercado europeu praticamente explodia. Hoje, em alguns países, os scooters são mais da metade dos duas rodas vendidos.
Alguns anos atrás, a Honda (que hoje domina e rege o mercado de menor cilindrada) resolver acordar, lançando o Lead 110 e depois o PCX. Mas são modelos urbanos, que sofrem em qualquer estrada.
Enquanto isso, a Dafra fazia sucesso com seu Citycom 300i, lançado em 2010, um modelo com origem de Taiwan, da Sym, montado em Manaus. Em menor escala, de outra categoria e preço, a Suzuki manteve seu Burgman 400, um “scooterzão rodoviário”.
Finalmente a Honda acordou para os scooters médios, que também encaram uma estrada. Ou quase acordou. Começa a montar em pequena escala o seu Honda 300i em Manaus, e o “quase” fica para seu preço, muito mais elevado do que se esperava. Conto já: R$ 23.590. Ou seja, mais de R$ 5.000 que os Citycom, também 300, que custam R$ 17.890 ou 18.490 (versão S, um pouco mais potente).
Por isso a Honda espera vender apenas cerca de 1.000 unidades este ano, em um segmento que ela chama de Premium. Segundo a Honda, é o dono de um carro de luxo que está cheio de ficar preso em congestionamentos e ver as motos passando. E para esse consumidor, os mais de 23 “contos” não são tanto dinheiro assim. Será?
Para justificar o Premium, o SH300i (cuja linha é sucesso na Europa, principalmente os modelos de menor cilindrada, 125 e 150 cm³) conta com alguns recursos eletrônicas da moda: chave de presença (basta estar no bolso para sair com o SH), lanternas e farol em LEDs, painel completo com mostrador digital com computador de bordo, ABS e otras cositas más.
Mas, esqueçam o preço e vamos analisar o SH 300i.
É um ótimo scooter, já que a Honda não brinca em serviço quanto a soluções técnicas, bem como sua execução.
Seu motorzinho de um cilindro, quatro válvulas e 279,1 cm³, arrefecido a líquido, rende bem: 24,8 cv a 7.500 rpm. Mas seu torque é o mais interessante: são 2,5 m·kgf a 5.000 rpm. E 2,5 “kilos” para um bichinho que pesa só 162 kg é muito torque. Acelera bem, limpa o trânsito e deixa os carros para trás muito rapidamente. O motor, mesmo monocilíndrico, vibra muito pouco e o câmbio CVT, como na maioria dos scooters, é sempre o melhor “automático” que existe. Simples, eficiente e de baixa manutenção é sempre gostoso e fácil de pilotar. Basta acelerar e frear.
O SH 300i vai muito bem no transito urbano e não decepciona em estradas, cruzando a 120 km/h com tranquilidade.
Em viagem, na minha opinião muito pessoal, a maior pentelhação fica para o para-brisa, grande e no estilo penteadeira, quase na vertical. Veda tão bem o vento que a gente fica suando dentro do blusão mesmo a mais de 120 km/h. Além disso, está muito próximo do piloto e, quando se passa em lombadas, dá uma pancada no capacete. E ainda tem uma desvantagem: vem com a moto, como equipamento standard, já que o SH é vendido em versão única e completa. Só vejo duas soluções: ou tira o para-brisa ou mete a serra para ele ficar com metade da altura. Um acessório assim só se justifica na Europa, no inverno, quando se roda com neve batendo na cara.
Não sou radical quanto a este equipamento aqui no Brasil: um para-brisa no estilo bolha de carenagem, bem deitado e desviando o vento para o pescoço e capacete ajuda a proteger e ainda é aerodinâmico. Mas, esta trolha enorme na vertical só serve para quem saiu do carro, mas não gostou da moto. Com para-brisa menor (ou sem) se ganharia em velocidade final e consumo.
Já de estrutura e comportamento dinâmico, o SH é muito eficiente, sem torções no quadro “underbone” (estrutura toda por baixo do scooter) e com suspensões de curso mais longo que absorvem bem a buraqueira, apesar da calibração mais para o esportivo. As rodas grandes, de aro 16″, espantam aquele medo de ser “engolido por crateras” que existe em scooters com rodas pequenas, principalmente de 10 polegadas. Além disso, é bom de curva.
Outra razão para o quadro “baixo” é se conseguir um assoalho plano como o do SH 300i. Realmente é plano. Mas pequeno. Os pés têm posição quase fixa, o que é cansativo em viagens, e o espaço central dá para levar uma manga ou mamão papaia. Espaço plano bom dá para levar melancia entre os pés.
Prefiro um túnel central e um escudo frontal mais inclinado que, além de mais aerodinâmico, permite uma segunda posição para os pés, apoiados no próprio escudo e com as pernas esticadas.
Claro, rodas grandes têm suas vantagens e seu preço: diminuem o porta-objetos embaixo do banco que, no SH, leva apenas um capacete meio apertado. Nada mais. Talvez os documentos.
O estilo como sempre, é uma questão de gosto pessoal. Um pouco tradicional, lembrando mais motonetas (como a Biz) do que scooter, traz toques de modernidade como os LEDs e alguns plásticos cromados, principalmente na frente. Ou seja, tem algo de Jaspion como as motos japoneses atuais e deve agradar.
Resumo da ópera, ou do SH: por algo entre R$ 19 ou 20 mil seria uma ótima opção para deixar o carro na garagem e se ter um veículo gostoso e fácil de dirigir e, com certeza, muito econômico e amigo do meio ambiente. A Honda não divulga consumo, mas diz que, em transito urbano e com um tanque de 9 litros de gasolina, se consegue mais de 300 km de autonomia. Ou seja, pelo menos 30 km/l, um belo consumo em relação ao conforto e performance.
Já por mais de R$ 23 mil é necessário pensar um pouco mais.
JS