Um monte de quilômetros na cidade e poucos — mas bons — quilômetros em rodovia marcaram a segunda semana de convívio com o Renault Sandero R.S.. Antes, porém, um aviso aos navegantes, ou melhor, aos leitores que enviaram comentários sobre a primeira semana deste Renault comigo. Muitos se mostraram entusiasmados com a “pegada” de esportividade deste hatch, mas temem sobretudo o desconforto derivado da rigidez da suspensão. No meu modo de entender o Sandero R.S. está longe de ser um carro desconfortável.
Ele pula em irregularidade? Sim, pula. Ele Passa para dentro da cabine o que seus pneus estão tateando? Sim, passa. Mas em nível plenamente aceitável. Aos macacos velhos, a turminha nascida nos anos 40, 50 ou 60, aviso que não é nada pior do que um Fiat 147 ou um Chevette. À galera sucessiva, os dos anos 70, 80, 90, afirmo que não é pior do que um Mercedes-Benz Classe A ou Kadett GSi. E, mais uma vez, rogo que entendam que o Sandero R.S. foi pensado para ter uma atitude esportiva em termos de motor e chassi, e assim fugiu do padrão (tristemente tacanho…) de esportivar um carro via faixas e rodões e não lhes dar real alma de esportivo, a tal atitude. E agora, à semana…
A viagem tradicional, carro cheio, porta-malas idem e família dentro, gorou. No lugar dela para não faltar com a palavra dada no texto anterior, levamos o Sandero à estrada dos Romeiros, que com suas curvas e asfalto bom é cenário recorrente das avaliações do AE. Porém, antes de falar deste breve mas gratificante passeio, o Sandero R.S. foi usado prosaicamente. Levou criança para a escola, foi às compras no supermercado e realizou diversos e muito típicos trajetos familiares. Para quem o cogita como carro da família, aviso: sem problema. A concessão que se faz ao conforto de marcha é, para mim, aceitável. E largamente compensada pelo excelente conjunto formado por motor-transmissão-suspensões-freios. Levei minha mãe (91 anos) de lá para cá e em nenhum momento dona Flora reclamou. Conhecendo-a há cinco décadas transbordantes, se houvesse desconforto real ela não deixaria de registrá-lo.
Qual o segredo para levar o Sandero R.S. sem sofrer? Da parte de quem guia, dirigir en souplesse, ou seja, passando as marchas sem levar o conta-giros além das 2 mil rpm e descobrir, feliz, que o esportivo raivoso se transforma em um companheiro bonachão. Nessa toada — e muito ajudam os bancos revestidos de espuma macia — a vida a bordo não é tão ruim. É claro que os passageiros do banco de trás sofrem mais do que motorista e seu acompanhante quando aquela irregularidade malvada não pôde ser evitada mas… para quem, como eu, teve Chevette rebaixado (!!!), o Sandero parece um sedã americano dos anos 60, se é que me entendem…
Sem encarar grandes congestionamentos e sem abusar das largadas “dragster style” a cada semáforo, a marca de consumo foi mais do que aceitável, 8,2 km/l, lembrando sempre que rodo em São Paulo em sua porção estilo Himalaia, a região oeste da cidade, cheia de sobes-e-desces. Um destaque neste convívio veio do câmbio: seis marchas parecem ser muitas, mas logo logo descobri que se a ideia não for ganhar de todos no sinal verde, na aceleração, é muito possível sair em 2ª, passar 4ª e logo espetar a 6ª e última marcha. A pouco mais de 40 km/h com o conta-giros levemente acima da marca de mil rpm (!!!) o Sandero R.S. procede sem crise. Não há engasgo, soluço ou tranco e se o pé for ao fundo, a progressão ocorre. Lógico que sem furor, mas tampouco com sonolência. O mesmo ocorre usando 1ª, passando a 3ª e enfim 5ª, ou a receita que você inventar: o fato é que ter este câmbio que os italianos chamam de “ravvicinato”, em tradução livre “encurtado” ou, como já li aqui no AE, apropriadamente, “marchas de relações numericamente próximas”, no qual praticamente não há buraco entre marchas, com a rotação caindo pouco entre elas na escalada, no uso urbano torna-se até recomendável a estratégia de pular marcha. E quanto à embreagem, com duas semanas de hábito a sensação de potro mal domado a cada saída cedeu lugar a de sinceridade total. Uma embreagem que tem um ON e um OFF marcante, mas que permite sim ser modulada quando preciso. Basta apenas “pegar a mão”, ou melhor, o pé.
Aspectos práticos deste Renault não deixam de te lembrar que ele é um pacato Sandero: comando do porta-malas ao lado do banco é um ponto positivo e, ao lado dele está a alavanquinha da portinhola do combustível. Útil também é o controlador de velocidade, hoje em dia um equipamento que deixou de lado seu status de mero auxílio em rodovia para ser protagonista em vias expressas coalhadas de radares-armadilha. A visibilidade oferecida pela ampla área envidraçada e pelos três espelhos retrovisores é parceira do uso urbano. Menos tranquila será a atitude de um dono de R.S. quanto às rodas, as belas e negras rodas de liga leve aro 17”. Uma mínima distração e… o contato imediato de 3º grau com o meio-fio causa riscos horríveis uma vez que o pneu, o excelente 205/45R17V, não forma aquela barriguinha salvadora de aro.
Como dito no início, a viagem ao litoral desmarcada de última hora resultou na visita ao “Avião do JK”, a carcaça aeronáutica do outrora glorioso Viscount presidencial que jaz no início de uma série de ótimas e bem conhecidas curvas. Antes disso, percorrendo a rodovia Castello Branco, a retilínea estrada que leva ao oeste do Estado de São Paulo, registrei a marca recorde de consumo. No trecho de pouco mais de 40 km o computador de bordo informou excelentes 14,1 km/l em condição calma, jamais superando os 120 km/h e conduzindo com atenção redobrada visando o melhor consumo. Na volta, mais relaxado, abusando da velocidade onde fosse possível, no mesmo trecho o registro foi de ainda ótimos 12,4 km/l, tendo a gasolina como combustível.
E nas curvas dos Romeiros? Ora, a felicidade tem nome! É Renault Sandero R.S.: tenho certeza que não há nada que custe menos que esse carro que seja capaz de entregar um comportamento de real esportivo que este hatch oferece. Os freios são sérios, os pneus me desafiaram pois em nenhum momento consegui fazê-los escorregar de verdade. Quanto ao motor, desconfio que a Renault poderia até ter ousado mais. Explico: os 150 cv declarados jamais colocam em crise o conjunto e assim, se 30 ou até 50 cv fossem acrescentados, suponho que não seria necessário alterar nada no restante. O câmbio de seis marchas é um coadjuvante estupendo mas exige interpretação precisa. Como o carro sobra em termos de estabilidade, aderência e freios, logo entendi que podia poupar reduções, entrar mais lançado e em marchas mais altas do que “enforcar” o motor e percorrer curvas com aquela sensação (ruim) de estar na marcha errada e mais devagar do que devia. No lado oposto, com giro mais baixo e em maior velocidade, percebe-se melhor o glorioso apoio dos pneus Continental e o ótimo ajuste da direção, que avisa bem o que se passa entre borracha e asfalto.
Nesses minutos de grande empolgação lembrei-me do Audi RS 4 que naquelas mesmas curvas me deliciou com sua precisão e potência. Diferenças de conceito e concepção à parte, afirmo: me diverti igual com o Sandero R.S.. O Avant RS 4 custa 400 mil reais a mais, tem 300 cv a mais, um caminhão de eletrônica a mais mas… vocês já entenderam! A relação custo-benefício é toda para o Renault. Apenas um reparo merece o câmbio do Sandero R.S., que exige mão precisa e rápida na medida certa. Afobados ouvirão o triste som do anel de sincronização sofrendo com a pressa na passagem de marcha pois é preciso calibrar a mão para não errar. As trocas devem ser precisas e rápidas na medida certa, pero no mucho sob pena de avaria.
Para a próxima semana não há planos definidos a não ser tentar viabilizar a viagem familiar que gorou, e sentir como se comporta o Sandero R.S. no tradicional passeio ao litoral norte paulista. Com frio e tudo…
RA
RENAULT SANDERO R.S.
Dias: 14
Quilometragem total: 836 km
Distância na cidade: 753,8 km (90,2%)
Distância na estrada: 82,2 km (9,8%)
Consumo médio: 7,7 km/l (58,3% gasolina-41,7% álcool)
Melhor média: 14,1 km/l (gasolina)
Pior média: 6,8 km/l (álcool)
Média horária: 19,9 km/h
Tempo ao volante: 42h03
FICHA TÉCNICA SANDERO R.S. 2,0 | |
MOTOR | |
Designação | Renault F4R |
Instalação | Dianteiro, transversal |
Tipo | 4 tempos, 4 cilindros em linha, bloco de ferro fundido, cabeçote de alumínio |
Nº de válvulas por cilindro/atuação | Quatro, atuação indireta por alavanca-dedo roletada, fulcrum com compensador hidráulico |
Nº de comandos de válvula | Dois, no cabeçote, acionamento por correia dentada |
Cilindrada | 1.998 cm³ |
Diâmetro x curso | 82,7 x 93 mm |
Taxa de compressão | 11,2:1 |
Potência | 145 cv (G) e 150 cv (A); a 5.750 rpm |
Torque | 20,2 m·kgf (G) e 20,9 m·kgf (A); a 4.000 rpm |
Corte de rotação | 6.500 rpm |
Formação de mistura | Injeção eletrônica no duto |
Combustível | Gasolina comum e/ou álcool (flex) |
TRANSMISSÃO | |
Câmbio | Transeixo dianteiro, manual de 6 marchas mais ré, todas sincronizadas |
Relações das marchas | 1ª 3,73:1. 2ª 2,10:1; 3ª 1,63:1; 4ª 1,29:1; 5ª 1,02:1; 6ª 0,81; ré 3,54:1 |
Relação do diferencial | 4,12:1 |
Rodas motrizes | Dianteiras |
SUSPENSÃO | |
Dianteira | Independente, McPherson, braço triangular, mola helicoidal, amortecedor pressurizado e barra estabilizadora |
Traseira | Eixo de torção, mola helicoidal, amortecedor pressurizado e barra estabilizadora integrada ao eixo |
DIREÇÃO | |
Tipo | Pinhão e cremalheira, assistência eletroidráulica, diâmetro de giro 10,6 m |
FREIOS | |
Dianteiros | A disco ventilado de Ø 280 mm |
Traseiros | A disco de Ø 240 mm |
Auxílio | Servofreio com câmara de vácuo de 10″ |
Circuito hidráulico | Duplo em “X” |
RODAS E PNEUS | |
Rodas | Alumínio, 5,5J x 16 (opcional 6,5J x 17) |
Pneus | 195/55R16V (opcional 205/45R17V) |
Estepe | Temporário 185/65R15 (80 km/h) |
DIMENSÕES | |
Comprimento | 4.068 mm |
Largura | 1.733 mm/2.000 mm com espelhos |
Altura | 1.499 mm |
Distância entre eixos | 2.590 mm |
PESO E CAPACIDADES | |
Peso em ordem de marcha | 1.161 kg |
Porta-malas | 320 a 1.200 litros |
Tanque de combustível | 50 litros |
DESEMPENHO | |
Aceleração 0-100 km/h | 8,4 s (G) e 8 s (A) |
Velocidade máxima | 200 km/h (G) e 202 km/h (A) |
CÁLCULOS DE CÂMBIO | |
v/1000 em 6ª | 33,8 km/h |
Rotação a 120 km/h em 6ª | 3.550 rpm |
Rotação à velocidade máxima (6ª) | 6.000 rpm |
MANUTENÇÃO | |
Revisões | A cada 8.000 km |
Troca de óleo do motor | A cada 8.000 km |
GARANTIA | 3 anos ou 100.000 km |