Durante as mais de nove horas ao volante do Renault Sandero R.S. na penúltima semana do Teste de 30 Dias, quase sete foram realizadas no pior dos mundos para um autoentusiasta, especialmente por ser este Renault, definitivamente, um carro realmente dedicado a genuínos autoentusiastas. Isso quer dizer que a maior parte do tempo foi passada não em puro desfrute das capacidades esportivas do Sandero R.S. mas sim enfurnado em congestionamentos. Tempo perdido? Não, pelo contrário, horas reveladoras.
Em muitos comentários dos leitores do AE sobre o teste do Sandero esportivo há uma dúvida recorrente: será que dá para usar este Renault no dia a dia? A esportividade faz dele um tormento quando a idéia é rodar tranquilamente? A resposta é um sonoro NÃO! Após tantos quilômetros em cidade (863 desde o começo do teste) mas especialmente depois do ritmo torturante desta semana, que resultou na mísera média de 15,9 km/h em 110 km urbanos, afirmo que a vida a bordo é boa mesmo quando não é possível rodar no estilo “flying lap”.
Marginal parada e as consequentes tentativas de escapar da paradeira enveredando por ruinhas de bairro. Trocas de marcha sem fim, pulos de aceleração frequentes, afoitos, a cada chance de passar dos 50 km/h. Tudo isso diplomou o Sandero R.S. como válido veículo multitarefa. A temida suspensão dura se mostra plenamente suportável, a resposta do acelerador, imediata e consistente, aliada ao câmbio curto conferem agilidade excepcional. Os comandos bem ajustados (o engate fácil das marchas, o peso certo do pedal da embreagem e sua efetiva resposta e a excelência oferecida pelo sistema de direção – rápido mas não excessivamente pesado) se juntam à boa ergonomia. É um carro que não sofre e nem faz sofrer quando caímos na armadilha dos congestionamentos. Outro destaque positivo é a altura em relação ao solo, que não implica nas desagradáveis raspadas das partes baixas. Nem mesmo o bicudo spoiler, a saia dianteira sob o para-choque, se esfrega demasiadamente nas entradas/saídas de garagem.
Estas conclusões são quase um paradoxo considerando que o R.S. tem “pedigree” de real esportivo, não é apenas mais um cordeiro em pele de lobo mas sim lobo em pele dele mesmo, lobo. E os dentes pontudos, olhos inflamados e cara de mau fui conferir em uma viagem rodoviária que ocupou um dos dias da semana, um pulo em real “fast-forward” da capital paulista à vizinha Indaiatuba (e por “fast” entendam fast mesmo…). No trecho, pouco mais de 200 km ida e volta, aproveitei para confirmar a real capacidade do Sandero R.S. ser veloz em curva e em reta, como também itens relacionadas aos aspectos práticos: habitabilidade, climatização, capacidade de carga e, especialmente, o consumo.
Ah, o consumo! Em tempos de bolso raso o item preocupa. Comprar um esportivo de verdade, com pegada “sangue-ruim” não só na aparência pode parecer uma ação burra em tempos bicudos. Mesmo que não haja nem de longe no mercado um carro que divirta tanto por menos de R$ 70 mil a família e a patrulha da sustentabilidade pode achar tudo uma besteira, certo? Pode ser, mas aqui vão os argumentos para você que está com vontade mas com certo medinho…
Lembra-se do câmbio curto, as marchas sequenciais, uma pertinho da outra, que levam ao nirvana na hora de pular do pedágio? Sim, ele está lá e aos 120-130 km/h o motor gira lambendo a marca dos 4.000 rpm o que, claro não é o regime ideal para gastar pouco. Todavia a viagem confirmou que rodando na velocidade que manda a lei não há desconforto auditivo. O motor apesar de girar alto não “entra na cabine” pois a insonorização é correta. Você o ouve, e a voz é grossa, mas instigante e não incômoda. Dá para conversar sem gritar, dá para ouvir música. E nesta rotação, um cutucãozinho no acelerador faz o R.S. pular aos 160 km/h ou mais em um flash, o que se espera de um real esportivo.
Se fosse equipado com uma 6ª marcha longa o câmbio seria um 5+E o que, definitivamente, não combina com esportividade e principalmente é, como veremos, desnecessário. Alongar a sexta obviamente implicaria em mexer nas restantes relações, mas o “desnecessário” deriva do consumo verificado, pois mesmo sendo malvadíssimo com o acelerador ao abastecer confirmei aquilo que o computador de bordo informava: média de 11 km/l, registro estupendo para o tratamento dado.
Cair ao nível de detalhe de como surpreendente é esta marca depois do que fiz na viagem é arriscado. Basta apenas dizer que na retilínea e bem sinalizada rodovia dos Bandeirantes explorar o fôlego do esportivo foi possível. Em velocidade elevada o Sandero R.S. prossegue “na mão”, o volante está nas mãos e não as mãos agarradas a ele. Consta que o defletor no final do teto não é figuração, mas sim protagonista, oferecendo real “downforce. E aquela parte inferior do para-choque traseiro, estiloso, imitando um extrator de ar? Pode até ser fantasiosa, mas que combina com a atitude do R.S.. combina, e pode ajudar.
Nas conhecidas alças de acesso a outras rodovias achei campo de prova perfeito, curvas semelhantes as que se encontram em autódromos que deram a oportunidade de ousar. Nestes 21 dias rodar uma pista real infelizmente não foi possível. Paciência; BS, PK e AK fizeram isso no Haras Tuiuti e a mim restou conferir o soberbo equilíbrio do R.S. em situação transgressiva, em rodovia, uma licença poética em nome da informação.
Um termo impublicável (!!!!) foi proferido pelo meu acompanhante quando na tradicional curva em subida de característico asfalto rosa entrei como se não houvesse amanhã, sem reduzir a velocidade. A curva fecha progressivamente e bem no meio dela, sentindo os pneus fazendo trabalhando sem reclamar, a maldade máxima: cortar a aceleração e “chamar” o volante para dentro da trajetória. Na maioria dos carros de tração dianteira como o Sandero R.S. isso causaria desequilíbrio na traseira. Sabem o que aconteceu? Nada!
Ao termo chulo do companheiro se seguiu o exultante comentário “parece um kart!”. Sim, parece. Um kartão seguro, plantado com pregos à trajetória que você escolher e cujo excelente câmbio permitirá sempre achar a relação que perfeita para, durante a fase de apoio, ir gradualmente afundando mais e mais o pé sem que o despejar mais potência gere perda de aderência. A sensação é sempre a de que ele suportaria mais velocidade de entrada, uma ação mais decidida no volante e abuso na pressão do pedal da direita. De novo afirmo com plena convicção que o conjunto do Sandero R.S. suportaria sem nenhuma necessidade de mudança ao menos mais três dezenas de cavalos. Sugestão à Renault, já cogitada por muitos, é criar um torneio monomarca para este carro. Porém, não mais uma categoria para quem já é piloto mas sim para os donos de Sandero R.S. que usam seu carro no dia a dia e que em um fim de semana topariam participar de um evento curto: treino e classificação no mesmo dia (sábado, para deixar o domingão para a família!), a exigência de manter o carro 100% original e de obrigatório, apenas uma gaiola de proteção, tipo desmontável. Pneus, óleo e combustível subvencionados (vinde patrocinadores!) e taca-lhe pau. Sonhar não custa…
Recoloco os pés no chão. O resumo da semana é que mesmo em trânsito torturante ele funciona bem demais, faz 8 km/l de gasolina, tem climatização adequada, a central multimídia funciona e leva você e sua família (mais três) com conforto adequado. Na rodovia, levado como se o Brasil fosse a Alemanha, diverte e ainda faz 11 km/l. E custa menos de 70 mil reais… Parece mentira, não é? Mas é verdade e a competência dinâmica e a efetividade global torna os pecadinhos cá e lá cada vez menos importantes. Quais? Ah, os instrumentos do painel não se enxergam bem a não ser que as luzes de posição estejam ligadas. Ao acabamento das partes plásticas do interior a manjada textura imitação de fibra de carbono cairia bem? Talvez. É tudo bobagem, mas os olhos poderiam brilhar mais. Mas não precisa: a uma semana da devolução deste Renault a tarefa de ter transformado um simplificado hatch em uma máquina de fazer sorrir merece palmas sem reparos. A cada dia que passa gosto mais do Sandero R.S.
RA
RENAULT SANDERO R.S.
Dias: 21
Quilometragem total: 1.158,2 km
Distância na cidade: 863,6 km (74,6%)
Distância na estrada: 294,6 km (25,4%)
Consumo médio: 8,2 km/l (69,9% gasolina-30,1% álcool)
Melhor média: 14,1 km/l (gasolina)
Pior média: 6,8 km/l (álcool)
Média horária: 22,3 km/h
Tempo ao volante: 51h40
Leia o relatório da primeira e da segunda semana.
FICHA TÉCNICA SANDERO R.S. 2,0 | |
MOTOR | |
Designação | Renault F4R |
Instalação | Dianteiro, transversal |
Tipo | 4 tempos, 4 cilindros em linha, bloco de ferro fundido, cabeçote de alumínio |
Nº de válvulas por cilindro/atuação | Quatro, atuação indireta por alavanca-dedo roletada, fulcrum com compensador hidráulico |
Nº de comandos de válvula | Dois, no cabeçote, acionamento por correia dentada |
Cilindrada | 1.998 cm³ |
Diâmetro x curso | 82,7 x 93 mm |
Taxa de compressão | 11,2:1 |
Potência | 145 cv (G) e 150 cv (A); a 5.750 rpm |
Torque | 20,2 m·kgf (G) e 20,9 m·kgf (A); a 4.000 rpm |
Corte de rotação | 6.500 rpm |
Formação de mistura | Injeção eletrônica no duto |
Combustível | Gasolina comum e/ou álcool (flex) |
TRANSMISSÃO | |
Câmbio | Transeixo dianteiro, manual de 6 marchas mais ré, todas sincronizadas |
Relações das marchas | 1ª 3,73:1. 2ª 2,10:1; 3ª 1,63:1; 4ª 1,29:1; 5ª 1,02:1; 6ª 0,81; ré 3,54:1 |
Relação do diferencial | 4,12:1 |
Rodas motrizes | Dianteiras |
SUSPENSÃO | |
Dianteira | Independente, McPherson, braço triangular, mola helicoidal, amortecedor pressurizado e barra estabilizadora |
Traseira | Eixo de torção, mola helicoidal, amortecedor pressurizado e barra estabilizadora integrada ao eixo |
DIREÇÃO | |
Tipo | Pinhão e cremalheira, assistência eletroidráulica, diâmetro de giro 10,6 m |
FREIOS | |
Dianteiros | A disco ventilado de Ø 280 mm |
Traseiros | A disco de Ø 240 mm |
Auxílio | Servofreio com câmara de vácuo de 10″ |
Circuito hidráulico | Duplo em “X” |
RODAS E PNEUS | |
Rodas | Alumínio, 5,5J x 16 (opcional 6,5J x 17) |
Pneus | 195/55R16V (opcional 205/45R17V) |
Estepe | Temporário 185/65R15 (80 km/h) |
DIMENSÕES | |
Comprimento | 4.068 mm |
Largura | 1.733 mm/2.000 mm com espelhos |
Altura | 1.499 mm |
Distância entre eixos | 2.590 mm |
PESO E CAPACIDADES | |
Peso em ordem de marcha | 1.161 kg |
Porta-malas | 320 a 1.200 litros |
Tanque de combustível | 50 litros |
DESEMPENHO | |
Aceleração 0-100 km/h | 8,4 s (G) e 8 s (A) |
Velocidade máxima | 200 km/h (G) e 202 km/h (A) |
CÁLCULOS DE CÂMBIO | |
v/1000 em 6ª | 33,8 km/h |
Rotação a 120 km/h em 6ª | 3.550 rpm |
Rotação à velocidade máxima (6ª) | 6.000 rpm |
MANUTENÇÃO | |
Revisões | A cada 8.000 km |
Troca de óleo do motor | A cada 8.000 km |
GARANTIA | 3 anos ou 100.000 km |