Minha história de hoje começa por volta de agosto/setembro de 1970, portanto há 46 anos, quando além de trabalhar na Volkswagen do Brasil eu tinha como hobby, nas horas livres, correr de automóvel.
Já contei a história da “Boca seca nunca mais”, lembra-se?
Pois é, os resultados das minhas participações nas provas de estreantes e novatos em Interlagos após aquela estreia trouxeram outros resultados os quais não poderia deixar de comentar, pois eles tem tudo a ver com a história de hoje. Entre agosto e outubro de 1970 foram quatro primeiros lugares e um segundo, e tudo com meu Fusca 1600.
Tudo caminhava tão bem na área esportiva que um determinado dia de setembro recebi a visita de um dos diretores de uma importante concessionária VW de Porto Alegre, a Gaúcha Car. Naquele dia recebi o convite formal para participar da inauguração do Autódromo de Tarumã, que seria no dia 9 de novembro, com patrocínio da concessionária, que arcaria com as minhas despesas de viagem, inclusive a passagem de avião, e da prova. Fiquei assustado com o convite e me comprometi a dar uma resposta o mais brevemente possível. Eu queria saber que prova seria esta, quais as categorias que correriam e o programa como um todo, afinal eu trabalhava e não teria tempo para me ausentar mais do que “enforcar” uma sexta-feira e talvez uma segunda-feira.
Aceitei o convite e aí começaram as minhas preocupações. Fazer o carro chegar a Porto Alegre, quantos dias antes ele precisaria estar pronto para ser transportado? Quem faria o transporte? Quanto custaria? A prova demandaria a compra de pneus, mas quantos? E as despesas de estadia e alimentação? O apoio técnico antes e durante a prova seria dado pela concessionária, mas eu tinha que levar outros equipamentos, ferramentas etc, etc… Eu estava apavorado.
Através de contatos com a Brazul, empresa que até hoje transportava veículos zero-km pelo Brasil todo e também fazia Porto Alegre, consegui uma cortesia do frete. Que alívio, uma despesa a menos!
Orçamento feito, valores apresentados à diretoria da concessionária, luz verde e foi dada a largada.
Viagem marcada, permissão da chefia para faltar dois dias, carro a caminho de Porto Alegre, era só chegar e encontrar as pessoas que me aguardavam na concessionária.
Isto aconteceu na quinta-feira 5 de novembro. O carro já havia chegado, os pneus já estavam montados nas rodas de competição e a parte mecânica já havia saído pronta de São Paulo. O seu visual, digo sinceramente, decepcionava parecia mais um carro de rua do que um carro de corrida.
Fomos ao autódromo fazer o reconhecimento da pista, seus 3.016 metros de extensão, com 12 metros de largura nas retas e 15 nas curvas. A emoção batia forte no peito, estava andando em um autódromo a ser inaugurado e comigo vários outros carros, inclusive alguns importados.
Sexta-feira, treinos livres, sábado, treinos classificatórios e a prova no domingo, esta era a programação.
De volta para a concessionária, uma revisão geral no carro e o início da transformação do visual em carro de corrida. Um letrista supercaprichoso começou a pintar o nome dos patrocinadores que estavam participando do programa. A Gaúcha Car, como já disse, era o maior e mais importante. A Auto Locadora Gaúcha, pertencente ao grupo, também participava. De São Paulo a Marinho Veículos, que dava todo suporte técnico na preparação do motor, câmbio e suspensão. As rodas eram da conhecida fabricante Scorro, jamais se esquecer de mencionar a Brazul Transportes e rádios Marchall, empresa de um amigo que também dava uma “força”.
Treinos e classificação seriam no sábado dia 7.
A classificação foi muito tensa, era um paulista contra uma imensidão de gaúchos e, pior, um paulista patrocinado por uma empresa gaúcha.
Meu até hoje amigo Fernando Esbroglio fez a pole, eu fui segundo e em terceiro outro gaúcho, Sérgio Pegoraro. A nossa prova era para veículos da categoria Turismo classe de 1300 a 1600 cm³. Nada mais nada menos do que 27 carros largariam no domingo dia 8 de novembro de 1970, data oficial da inauguração do Autódromo de Tarumã, em Viamão, região da Grande Porto Alegre.
Terminada a classificação, feliz com os resultados, agora era voltar para a concessionária, fazer uma excelente revisão e, se possível fosse, dormir cedo.
Domingo pela manhã, tudo certo. Equipe pronta, ferramentas, equipamentos, rodas sobressalentes caso fossem necessárias, e uma enorme vontade de correr.
Posição de largada, veículos no grid, público em pé e é dada a largada com a tradicional bandeira do estado, não havia naquela época sinal de luz verde para a largada. Minha largada foi muito boa (foto de abertura). Pulei à frente do pole-position mas este se recuperou e me ultrapassou na segunda curva. O mesmo aconteceu com o carro 28 do Sérgio Pegoraro que me ultrapassou logo em seguida (foto nº 04) e em uma manobra infeliz perdeu o controle do carro e rodou à minha frente. Tentei desviar, mas ao contornar ele girava e o impacto seria inevitável. A frente do seu carro bateu no para-lama traseiro direito do meu, e isto tudo na primeira volta.
Com a batida o pneu traseiro direito ficou raspando no para-lama e eu fui obrigado a parar no boxe para avaliar o problema e dar uma solução para continuar na prova, afinal estávamos só na primeira volta. Se não tivesse parado o para-lama teria cortado o pneu e as consequências poderiam ter sido piores.
Para-lama afastado, pneu livre, de volta à luta. A superioridade do meu carro era grande, havia feito segundo tempo, isto me permitiu uma recuperação de posições a cada volta e tal recuperação foi motivo de atenção da TV que transmitia a corrida ao vivo e ainda mais com uma grande empresa gaúcha como patrocinadora. Deu um retorno fantástico, fiquei sabendo depois.
Resultado final: 1º) Fernando Esbroglio, VW 1600; 2º) Mário Olivetti (de Petrópolis, RJ), VW 1600; 3º) eu, feliz da vida, com direito a pódio e troféu.
Esta foi minha primeira experiência de correr fora da minha cidade, São Paulo, e de Interlagos. Depois vieram outras experiências como correr no Rio de Janeiro, com histórias que pretendo contar em breve.
É de lamentar o pouco caso de algumas autoridades com o automobilismo, por exemplo, as do Rio de Janeiro, que destruiu seu autódromo, e o do Paraná, em Pinhais, na Grande Curitiba, que por pouco não virou um loteamento. O de Goiânia foi salvo pelo gongo, estava destinado a ser um condomínio e acabou sendo reformado, recuperando seu status.
Agradecimentos devem ser feitos a empresários que investem neste esporte e até autódromos particulares constroem, como Alcides Diniz, já falecido, com uma bela pista na sua Fazenda Capuava, em Indaiatuba (SP), e Eduardo Souza Ramos e seu fantástico circuito na Velo Città, em Mogi Guaçu, no interior de São Paulo também.
É isso aí, torçamos para termos novos representantes na Fórmula 1!
RB