Meu nome é Conrado Pimenta, tenho 29 anos e minha história de vida com carros é similar à de 90% dos usuários do AUTOentusiastas, mas, o que vou contar aconteceu no dia 17/11/2016 e foi uma das melhores experiências automobilísticas que tive. Tudo começou quando um amigo mandou uma mensagem no grupo do WhatsApp comentando que estava havendo uma ação de divulgação da Stock Car em um shopping aqui de Belo Horizonte, já que, naquele último fim de semana, tivemos a primeira corrida da Stock Car no novo circuito de Minas Gerais — o Circuito dos Cristais, em Curvelo.
A premissa da promoção era simples: ir a um simulador e bater o tempo de 1:41.000 em Interlagos, no jogo “Automobilista”, para ganhar ingressos da Stock Car. Eu estava bem decepcionado, pois meu orçamento está extremamente apertado atualmente e não consegui credenciais para ir à corrida, mas essa oportunidade mudava tudo! Era a chance que eu esperava! A ida ao simulador em si já valia a visita ao shopping, pois era um daqueles simuladores em que você fica dentro de uma esfera que simula o movimento do carro, algo que se eu tivesse em minha casa decretaria o fim da minha vida social.
No mesmo dia eu fui ao shopping — uma quinta-feira, antepenúltimo dia da promoção, uma vez que a corrida já era no domingo — para matar a curiosidade de jogar em um simulador em que sempre sonhei e tentar a sorte na promoção dos ingressos. No grupo do WhatsApp, a pessoa que enviou a notícia comentou que um amigo seu havia conseguido passar e com folga, fazendo 1:38.000, mas o cara era viciado em simuladores e andava de kart direto!
Eu vendi meu volante em 2014 (forçadamente, para fazer um swap meu “Red Hot Chili Celta”, mas essa história fica para depois) e andei pouquíssimas vezes de kart. Isso me deixou ainda mais ansioso que o habitual. Mas algo que me ajudava a ter esperanças era que eu conhecia a pista muito bem, pois jogo nela no rFactor há bastante tempo, e no “Automobilista” também, que já tenho um em casa. Embora eu jogue com controle de Xbox, que é completamente diferente de usar um volante de qualidade, pelo menos o traçado eu já conhecia.
Agora, imaginem vocês, para alguém que praticamente dá F5 no site de rastreio de encomendas, esperar meio-dia para tentar a chance no simulador foi muito difícil, acho que foi a tarde mais longa de trabalho que tive em alguns anos.
Decidido a tentar a sorte e acabar com a tortura da espera, saí meia-hora mais cedo do trabalho rumo ao shopping, que fica a 10 minutos distante. Chegando lá, me dirigi, a passos largos e rápidos, ao local do simulador e fui para a fila. Ela não estava muito grande e havia dois simuladores disponíveis, mas era o suficiente para me fazer esperar por aproximadamente 45 minutos.
Chegada a minha vez, sentei no banco do simulador, que tinha bom apoio, apesar de não ser do tipo concha. Lá dentro, havia um painel completo de um carro (apesar de não ser funcional) e um projetor atrás, que exibia à minha frente a imagem do jogo. A promotora veio me auxiliar, passou as informações do que fazer e do que não fazer com o volante, ajustei a distância do banco fazendo o teste de colocar o pulso na parte superior do volante, ela afivelou o cinto de 4 pontos e deu a partida para eu começar.
O coração estava disparado, eu estava nervoso e sem saber o que esperar. Logo que a simulação começou, já senti o tranco do simulador inclinado, pois a volta lançada te joga na Subida do Café. Em aceleração máxima na reta dos boxes, já sabia que deveria frear próximo à placa dos 100 metros para entrar certo no S do Senna. No momento em que aperto o freio, descubro o quão duro ele era e que precisava ser pressionado bem forte, mas descobri isso da pior maneira, passando direto e me estrebuchando no muro!
Ok, vamos voltar ao traçado, velocidade máxima no fim da Reta Oposta e frear novamente na placa dos 100 m para fazer a Curva do Lago. Consegui frear melhor, mas faço uma nova visita à área verde. Nem preciso me estender muito em narrar o restante desta volta e da próxima, as duas a que tinha direito. Fiz somente 1:58 “alto”, tempo que nem foi válido, uma vez que fiquei mais tempo do lado verde do que do lado cinza!
Ainda um pouco atordoado com o movimento do simulador, saio meio chateado e desmotivado para o fim da fila. Informo meus amigos do grupo do WhatsApp que o simulador é “EXTREMAMENTE difícil”. Nisso já eram aproximadamente 18 horas. Teria que buscar minha esposa (ela comigo na foto de abertura) no trabalho às 20h30, o que me dava mais 2h30m para tentar conseguir. Eu queria muito conseguir, era a minha única oportunidade de ir ver a Stock de perto, de graça e fazendo algo que eu amo, que é jogar e pilotar em simuladores.
Determinado a ir melhor, esperei mais uma hora e fui pela segunda vez. Já consegui fazer um tempo válido, mas fiquei na casa de 1:55. Só que tinha algo a meu favor, a mecânica da promoção era a seguinte: você poderia dar duas voltas ou andar 4 minutos, mas se fizer uma volta abaixo dos 1:50 você poderia dar mais uma volta! Isso me animou muito, pois já estava pegando o jeito do carro e os pontos de frenagem da pista.
Corri de volta para a fila, pedi para segurarem meu lugar, fui à Americanas em 5 minutos e comprei algumas barrinhas de cereal, afinal estava com fome e nervoso e precisava ficar calmo para me concentrar na pilotagem. Após mais 40 minutos de fila, estava na minha terceira tentativa, já consegui fazer 1:46 “alto” na primeira volta, o que me dava direito à volta da repescagem. Aproveitei a oportunidade e fiz 1:44.688, uma saída na Curva do Lago e na saída da Junção me prejudicaram muito. Até o segurança veio lamentar que eu estava quase conseguindo, pois ele assistiu pelo monitor externo.
Nesse meio tempo, umas quatro pessoas já haviam conseguido, e de certa forma elas me deram muita energia para continuar, e nesse momento tive certeza de que era plenamente possível bater aquele tempo. Um outro competidor falou que estava tentando desde que o shopping abriu às 10 da manhã! Infelizmente não teria aquela oportunidade, então teria que ser na próxima, pois o horário de buscar a minha esposa já se aproximava.
Na quarta tentativa, já às 20h15, fui mais confiante e consegui virar até 1:42 “baixo”, o que não era suficiente, mas me dava direito à repescagem. Estava com medo, freando muito antes das marcas, para tentar corrigir melhor as trajetórias dentro das curvas. A essa altura, eu já havia me acostumado com o balanço do simulador e as forças que ele fazia conforme eu contornava o templo paulista da velocidade.
Aberta a última volta, fui com a “faca nos dentes, amigo!”, tentando frear o mais tarde possível e ainda executar corretamente as curvas. Senti que estava mais rápido a cada curva. As correções que fazia quando o carro saía de traseira já eram naturais para mim e eu conseguia colocar o carro onde queria e de um jeito muito mais seguro do que nas primeiras tentativas. Mesmo dando uma escapada na Curva do Lago, quando cheguei à Junção vi que o tempo estava mais baixo que o habitual. Na Subida do Café eu estava fazendo o traçado mais rápido, perto das zebras e da entrada dos boxes, quando da forma mais clichê do mundo me lembrei do Senna “ali” em Interlagos em 1993. “Lutei tanto… vai ter que dar” e praticamente puxei o volante de tanto apertar o acelerador.
Ao cruzar a linha de chegada, olhei o tempo: “1:40:400”. Só de lembrar eu me arrepio! Para alguns, aquilo era algo extremamente insignificante, mas, para mim, foi uma vitória imensa! Um dos meus sonhos, de ver de perto uma categoria tão importante como a Stock iria se realizar, e não por sorte, mas pela minha realização, pelo meu “esforço”. Soltei o volante e comecei a gritar dentro do simulador! Dei um soco no ar — que não foi no ar, mas numa estrutura do simulador (minha mão ficou roxa por um bom tempo), mas a adrenalina era tão grande que não senti a menor dor.
Saí completamente extasiado do simulador! O pessoal da promoção tocou a corneta — tal qual a tradição em Monza — anunciando que havia saído mais um vencedor e aquilo me deixou extremamente feliz. Liguei para a minha esposa para contar a feliz novidade — e avisar que já estava indo buscá-la, pois estava atrasado! — e na volta dirigi de forma totalmente oposta à que estava fazendo minutos atrás. Estava devagar, curtindo o passeio e saboreando minha vitória, tal qual os pilotos na F-1 até voltar para os boxes.
Na sexta à noite recebi uma ligação da organizadora da promoção perguntando se eu havia recebido o e-mail com as informações sobre o ponto de encontro para a viagem de domingo cedo para Curvelo. Entretanto, uma coisa me surpreendeu: ela informou que haveria uma volta rápida entre os participantes. “Como assim?”, perguntei. ”Os oito melhores classificados no simulador terão direito a uma volta rápida dentro do nosso carro de Stock”. Aquelas palavras fizeram o chão se abrir sob os meus pés! A possibilidade de dar uma volta no “stockão” me deixou tresloucado! Não acreditava que tinha aquela chance! Era mais uma oportunidade de ter um sonho realizado!
A sexta e o sábado passaram muito rápido, apesar da minha ansiedade para que o domingo chegasse. A vontade de que esses dias passassem rápido era tanta que me dediquei em fazer tudo muito bem, fazendo os dias passarem rápido. É raro alguém acordar com tanto bom humor num domingo às 5 da manhã, mas eu estava indo para Curvelo ver a Stock, pelo meu mérito e o melhor, de graça, pois no momento tenho muitas outras prioridades econômicas na minha vida.
Eu e minha esposa — a quem só tenho a agradecer pela vontade de me ver feliz indo ao evento, e que, após passar o dia debaixo do sol ouvindo motores, começou a tomar gosto pela coisa e já fala em irmos ver a F-1! — rumamos para o hotel onde pegaríamos as credenciais e o transfer para Curvelo, que fica a aproximadamente 160 quilômetros de Belo Horizonte.
A viagem foi mais longa do que eu desejava e o motorista do ônibus ainda errou o caminho para o autódromo, mas chegamos sãos e salvos. Nem liguei para o fato de estar sem internet, pois não conseguiria atualizar o Instagram com a cobertura do evento. A alegria que eu sentia era muito maior, mas também estava extremamente ansioso — que novidade… — já que não sabia se eu estava classificado para a volta rápida no Stock.
Após a corrida do Brasileiro de Turismo, o organizador da promoção disse: “Pessoal, vou chamar os nomes que estão classificados para a volta rápida, quem for chamado vem aqui do meu lado e começa a vestir o macacão e assinar o termo de responsabilidade”. O meu coração disparou e eu estava na expectativa de “zerar” parcialmente a vida, andando num carro de corrida incrível. Foi quando ele falou meu nome — na 6ª posição — e esta foi a segunda vez que fiquei incrédulo em três dias!
Mal podia acreditar que mais outro sonho meu se tornaria realidade! Em contraponto à minha felicidade enorme, minha esposa estava totalmente preocupada, achando que poderia dar algum problema ou acidente. Expliquei a ela que era só uma volta rápida, não haveria outros carros na pista e que em menos de 3 minutos eu estaria de volta! Ela tirou uma foto minha com a credencial no peito, feliz igual criança que ganhou de Natal o brinquedo que esperou o ano todo.
Passando pelo paddock, a caminho da pista, ainda vi o Reginaldo Leme… Quis ir lá tietar, mas como tinha que ir correndo para a volta rápida, perdi essa oportunidade. Quando chegou a minha vez de entrar no carro, eu já estava pronto! Macacão oficial homologado, balaclava, capacete e celular para filmar a experiência. Entrei com certa facilidade no carro e aguardei o camarada que ia me auxiliar a me prender no banco.
Porta fechada, V-8 roncando, bandeira verde dando a liberação para o carro sair e eu já senti o quão forte é a aceleração de um carro que é projetado somente para ser rápido numa pista. Antes da primeira curva, um grampo à direita, o piloto — me disseram que era o piloto do Safety Car, a adrenalina foi tanta que mal perguntei seu nome — freou com tudo na placa dos 50 metros. Eu nunca tinha desacelerado de forma tão brutal e rápida. Meu único impulso naquela hora foi gritar, mas não de medo, de êxtase! Era uma das melhores sensações que eu já havia sentido nos meus 29 anos de gearhead.
Nunca havia sentido a força G agindo de forma brutal sobre o meu corpo, não fazia ideia do quão bom era estar naquele monstro V-8 da Stock! Com dificuldade, filmei a volta, pois queria aproveitar cada momento ao máximo, pois sabia que ele passaria muito rápido. Ao final da volta, agradeci ao piloto pela experiência sensacional que eu acabara de vivenciar e saí do carro o mais rápido possível, pois haviam outras pessoas que iriam andar depois de mim.
Mas a parte mais esperada ainda não havia chegado, que era a corrida propriamente dita. É absolutamente fantástico ver a corrida na TV e olhar para o lado de fora de onde você está e ver aquela quantidade de carros roncando num volume tão alto que eu nem imaginei que fosse possível! Mais alto que todos os shows de rock que ouvi, e eu incluí na conta AC/DC, Iron Maiden e outras feras!
As duas corridas foram muito bacanas, cheias de ultrapassagens na reta dos boxes e muitas trocas de posição. O ápice da emoção da galera aconteceu na segunda corrida, em que o Barrichello teve pane seca praticamente na última curva. A torcida se decepcionou bastante, pois estavam todos torcendo para que ele ganhasse, visto que na visita aos boxes o dele era o mais concorrido, disparado.
Depois dessa experiência fantástica, espero muito poder fazer dessa corrida o início de uma tradição que espero passar para meus filhos. Foi um dia em que eu realizei sonhos e que tive certeza de que eu tenho o hobby certo!
Conrado Pimenta
Belo Horizonte – MG