O Paulo Roberto, meu colega e designer no estúdio da Ford Willys brincava falando sério que “o desenho de um veículo eu começo pelo tamanho das rodas”. Brincadeiras a parte, o tamanho das rodas e seu desenho é fundamental para a definição do estilo veicular. Além das rodas eu incluiria também a distância entre eixos e os balanços dianteiro e traseiro como ponto de partida para um bom projeto. Henry Ford no início do século passado já se preocupava com o tamanho das rodas e com a distribuição correta do volume e da massa do veículo entre eixos, com pouquíssimo balanço dianteiro e traseiro.
Fazendo um parêntese, quando eu escrever roda nesta matéria, entenda-se conjunto roda+pneu
Outra empresa, a Citroën, por exemplo, tem sido ao longo de sua história uma das fábricas de automóveis mais preocupadas nas proporções corretas de seus projetos.
Rodas pequenas em relação ao volume do carro tendem a desvalorizar o projeto, deixando-o parecer como um carrinho de rolimã. Distãncia entre eixos curtas com balanços dianteiro e traseiro grandes deixa o veículo parecer uma gangorra.
E como não é tão bonito um sedã com traseira volumosa e rodas pequenas:
E como é bonito um veículo com as proporções otimizadas:
Vamos falar um pouco a respeito do projeto das rodas
Rodas
Quanta tecnologia além do tamanho e estilo as rodas devem conter em seu projeto para atender a todos os requisitos necessários ao bom desempenho do veículo.
Em primeiro lugar, as rodas devem ser leves e com momento de inércia otimizado a um valor mínimo.
Ser leve para reduzir a massa não suspensa, facilitando o acerto das suspensões em termos de constante de mola e amortecimento, além de reduzir o peso do veículo. Rodas com menor inércia facilitam as acelerações e diminuem a carga nos freios nas desacelerações.
As rodas devem ser resistentes e duráveis, e por isso testadas com muito rigor, pois uma falha pode resultar em graves acidentes.
Sendo as rodas consideradas itens de segurança elas são “life time”, ou seja, devem manter a função indefinidamente e quando não, devem alertar o motorista quando alguma coisa porventura não for bem. Este alerta pode ser através de barulhos, vibrações sentidas no volante, desalinhamento etc., que obriguem o motorista a levar o veículo a uma oficina para a verificação de um possível problema.
Como referência, cito alguns testes estruturais a que as rodas são submetidas:
– Impacto em buraco de concreto com cantoneiras de aço com os freios travados, transferindo toda a carga para o eixo dianteiro. Velocidades do veículo, carregamento e profundidade do buraco definidos pelos procedimentos de engenharia.
– Impacto em uma guia com inclinação de 20° em relação a linha longitudinal do veículo. Também neste teste a altura da guia e as velocidades do veículo e o carregamento são definidas pelos procedimentos internos de engenharia.
Para ambos os testes, tanto as rodas como os elementos de direção não podem quebrar e devem continuar operacionais. Entortar mas não quebrar. Desalinhamento das rodas, amassamento das rodas e furos nos pneus são condições aceitáveis após os testes.
As rodas devem ter dimensões internas que permitam abrigar os freios sem folgas criticas com os discos e pinças. Devem também ajudar na ventilação dos freios trocando calor com o meio ambiente. Quanto mais fechada for a roda pior a troca de calor.
Outro item importante é o off-set da roda, que nada mais é do que a distância entre a superfície de apoio da roda e seu plano central vertical. O off-set pode ser positivo, negativo ou zero dependendo das características de cada projeto, tração dianteira ou traseira etc.
A definição correta do off-set da roda garante as boas características direcionais do veículo e evita possíveis vibrações transmitidas do solo para o volante de direção.
O diâmetro das rodas também influencia a performance do veículo. Rodas menores têm o efeito de encurtar as relações da transmissão e rodas maiores, ao contrário, têm o efeito de alongá-las.
Outro ponto importante é o “spring back” da roda que nada mais é que que o efeito elástico de mola quando no aperto dos seus parafusos de fixação, como garantia adicional para que não haja perda de torque. É um efeito similar a uma arruela de pressão. O spring back é conseguido através de um pequeno desnível, da ordem de 2 a 3 décimos de milímetro, entre a superfície de apoio da roda e o plano interno do circulo dos parafusos.
Nas rodas de liga é mais difícil conseguir este efeito pois o alumínio é mais deformável e menos elástico que o aço. Alguns projetos utilizam uma arruela cônica incorporada aos parafusos de fixação para evitar a deformação plástica durante o torque de aperto.
Outro ponto não menos importante é que a face externa da roda fique sempre para trás do plano do ombro do pneu, como garantia de proteção a raspar as rodas na guia durante as manobras. Vale também para rodas com calotas.
Veja o leitor quantas interações existem no projeto de uma roda além de seu estilo ! Aparência e função é o grande desafio dos designers e engenheiros para a excelência do projeto das rodas.
Outros fatores
Na realidade a interação dimensional de um veículo é ainda maior. Somado ao tamanho das rodas e a distância entre eixos e seus balanços dianteiro e traseiro, temos a sua altura em relação ao solo e as distâncias transversais entre rodas (bitolas dianteira e traseira).
Existe uma relação direta entre a altura do veículo, seu centro de gravidade (CG) e a bitola das rodas para minimizar a rolagem da carroceria em manobras transientes. A altura do CG deve ser sempre menor que a metade da bitola média. Como referência genérica, a divisão da metade da bitola media pela altura do centro de gravidade tem que ser maior que 1,2.
A massa distribuída entre eixos facilita a solução de conforto do veículo e também o balanceamento dos freios otimizando a transferência de carga em desacelerações.
Veja o leitor como é difícil compromissar a aparência com a função. Em uma próxima matéria pretendo abordar outros detalhes que certamente fazem a diferença para um bom projeto veicular.
CM