A BMW R nine T foi apresentada no ano passado, 2013. Ela comemora os 90 anos do lançamento da primeira motocicleta da marca, a BMW R32. Ao falarmos “nine T” soa “ninety”, que em inglês significa noventa, daí o nome.
A BMW começou como fabricante de motores aeronáuticos. Seu símbolo, o círculo dividido nas cores azul e branca, remete a uma hélice em movimento. Muitos dos aviões alemães usados na Primeira Guerra Mundial usavam seus excelentes motores radiais refrigerados a ar. Porém, com a derrota alemã, o Tratado de Versalhes impôs à Alemanha a proibição de fabricar artefatos de guerra. O avião estava entre eles e com isso a BMW se viu numa enrascada. Passou a produzir motores estacionários. Um deles, um motor boxer de dois cilindros, veio a equipar a motocicleta da fabricante Victoria. A congênere Helios fez o mesmo, e logo em seguida se associou à BMW. Em seguida à fusão, o diretor geral da BMW, Franz Josef Popp, pediu ao diretor de Projetos, Max Friz — que antes da guerra trabalhara na Mercedes e durante o conflito fora responsável pelos motores aeronáuticos da BMW —, que estudasse a moto da Helios. A conclusão de Friz foi bem bávara, direta, que o melhor a fazer seria jogar a moto no lago mais próximo.
O mais condenável na Helios, segundo Friz, era a disposição transversal do motor boxer, que acarretava má refrigeração do segundo cilindro, o que ia atrás. Decidiram começar tudo do zero. Fabricar uma moto excelente seria uma boa propaganda para a qualidade dos motores BMW. E assim nasceu a R32 em 1923, a primeira motocicleta BMW, já com a disposição básica que ainda perdura em muitas motos da marca: motor bicilíndrico boxer disposto longitudinalmente e transmissão por cardã. Assim os dois cilindros ficam igualmente expostos ao fluxo de ar. Toda BMW com essa configuração é designada pela fábrica como Série R.
Mesmo a R32 tendo sido lançada em um período economicamente sombrio da Alemanha, com a hiperinflação, ela foi um sucesso. Dei essa volta toda para explicar o porquê do nome de batismo desta R nine T, que considero uma das mais lindas motos já feitas. Mas ainda falta uma coisinha que gostaria de contar: o Dr. Friz tinha muita razão ao estabelecer as linhas básicas da moto, e isso ficou provado na II Guerra, quando o motor das BMW suportou o calor infernal do norte da África. As outras sobreaqueciam e ela, não. O fato da transmissão final ser feita por cardã também fez diferença nessa campanha, já que a abrasiva areia do deserto logo “comia” corrente, coroa e pinhão das outras. Depois da guerra o governo americano mandou que a Harley-Davidson fabricasse algumas cópias da BMW para o seu exército. A Harley fez mil delas.
Os Corvette têm motor V-8 dianteiro, as Harley têm motor V-2 transversal, os 911 têm motor 6-ciindros boxer “de popa” e as motos BMW têm motor 2-cilindros boxer longitudinal. Essas são as disposições clássicas dessas marcas, as que de imediato associamos a elas. Esta R nine T, a meu ver, já nasceu como uma moto clássica; linda e boa .
A cilindrada é de 1.170 cm³, quase 600 cm³ por cilindro. Motor pesado, porém baixo, o que dá à moto um centro de gravidade baixo. Ela é sólida, plantada no chão. Sendo de grande cilindrada e instalado na longitudinal, a reação normal que todo motor tem ao torque, especialmente nas aceleradas mais fortes e repentinas, passa para a moto, levando a incliná-la para a direita. O leitor na certa já viu as osciladas que um motor V-8 ou 6-cilindros de grande cilindrada dá nessas circunstâncias, que chegam a fazer o carro mexer lateralmente. Como na maioria das motos o motor é transversal, essa reação é pouco ou nada percebida e, principalmente, não ocasiona mudança na inclinação. Já numa BMW Série R sentimos esse efeito de maneira bem pronunciada.
Elas são assim e isso demanda a técnica correta de quem pretende pilotá-las nos limites de acelerada em saída de curva. Tem-se que estar preparado para agir segundo as diferentes curvas. Se ela é para a esquerda, a acelerada de saída de curva fará a moto se desinclinar. Mas se a curva é para a direita, a acelerada a levara a se inclinar ainda mais, o que pode gerar uma situação perigosa. Mas é só um cuidado que se tem que tomar e isso se torna automático para um possuidor de BMR R. É uma característica, não um defeito, e esse cuidado só precisa ser tomado em situações de tocada forte; em tocada normal pouco se nota. Mas, afinal, é uma moto feita para motociclistas. Não foi feita para novatos, e gosto disso. Que se aprenda nas outras motos, para depois pilotar uma BMW R.
São 6 marchas, mas com um torque máximo de 12,1 m·kgf a 6.000 rpm já dá para imaginar que vamos metendo marcha e dali a pouco já estamos sem saber exatamente em que marcha estamos. Ela responde de pronto a qualquer acelerada, seja lá em que marcha estiver. Na dúvida, o painel indica a marcha vigente. A potência máxima de 111 cv vem a 7.550 rpm. A frente é pesada, daí que se pode dar boas arrancadas sem muita preocupação com empinadas indesejáveis. O pneu traseiro, no caso, um Metzeler 200/50 R17, traciona muito, e não há controle de tração.
ABS, tem, e não há como desligá-lo. Eu preferia que pudesse, ao menos o do freio traseiro. Os freios são independentes, não são combinados, o que acho bom. Na dianteira, dois discos flutuantes. Na traseira, um. Freia muito.
Na cidade temos que cuidar dos cabeçotes. Por exemplo: nas filas de sinal, não basta livrar o guidão por cima do capô dos carros parados, pois os cabeçotes podem bater no pára-choque do carro. Tudo bem, essa não é moto para nervosos caminhos de rato. Ela convida a longos passeios, longas viagens por paisagens desabitadas. Gostei que o motor pouco emite calor na cidade. Não é uma “moto quente” no uso urbano. O calor só atinge os pés, e mesmo assim não muito.
Os cursos das suspensões são suficientes para encarar sem susto os buracos-surpresa. A massa da moto é grande, o centro de gravidade é baixo, daí que sua trajetória pouco se abala com buracos, e é bom mesmo que não se abale, porque depois de abalada a coisa pode complicar…
Na estrada, bom, na estrada ela está onde foi feita para estar. Que delícia de moto! Coloque a 6ª marcha e esqueça. As trocas de marcha são feitas só para sentir o prazer de trocá-las, porque a 6ª já dá uma tremenda pegada, mesmo em baixa velocidade. Ela acelera como se o motor não soubesse que tem algo a carregar. Ela vao de 0 a 100 km/h em 3,1 segundos, o que é arrancada para os super dos superesportivos. E atinge, segundo a BMW, “mais de 200 km/h”. Calculo que a máxima esteja ao redor de 230 km/h, o que já está para lá de suficiente.
A R Nine T foi desenhada na Califórnia. Pretende agradar quem não suporta mais esse design no estilo “Power Rangers” e “Transformers” que veio dominando e parece que já deu o que tinha que dar. A BMW oferece vários opcionais. Pode-se removera metade traseira do selim, que, por sinal, é plano, e apesar de ser estreito é bom para a garupa. É possível tirar o miolo dos silenciadores para que o ronco fique mais encorpado. Esta de teste estava sem os miolos. Não fica nada exagerado e não incomoda ninguém. A regulagem da mola, única, da suspensão traseira é feita facilmente. Deixei na mais macia e ficou ótima, deu mais tração nas aceleradas em piso irregular. Não há regulagem da suspensão dianteira, que é a tradicional, por garfo, mas com amortecedores invertidos. Tem computador de bordo. Fez ao redor de 17 km/l na estrada e numa tocada razoavelmente rápida, normal numa moto dessas. Com o tanque de 18 litros a autonomia gira em torno de 300 km, o que não é muito, mas também não é pouco.
Pesa, tanque cheio, 222 kg. O banco está a 785 mm do chão. Baixo, e isso é bom, pois em moto pesada é bom poder abrir as pernas para poder firmá-la sem esforço.
Esta moto nos foi cedida pela Eurobike, em cuja loja da Avenida Hélio Pellegrino, em São Paulo, também estão expostas algumas R nine T customizadas pela Johnnie Wash. O espírito dessa moto é esse mesmo, ser maleável para personalizações. Ela me fez desconfiar que a BMW andou lendo a minha mente e tirando as minhas medidas. Sorte da Eurobike que a devolvi antes deste domingo de eleição presidencial, pois estivesse ela comigo acho que sumiria com ela mundo afora até que acabasse este meu desapontamento, e isso poderia levar semanas, talvez meses. Seria um bom remédio, sem nenhuma dúvida.
AK
Vídeo
FICHA TÉCNICA BMW R nine T | |
MOTOR | |
Tipo | Boxer, longitudinal, arrefecido a ar e óleo |
Diâmetro e curso | 101 mm x 73 mm |
Cilindrada | 1.170 cm³ |
Potência máxima | 111 cv a 7.550 rpm |
Torque máximo | 12,1 m?kgf a 6.000 rpm |
Formação da mistura | Injeção eletrônica no duto |
TRANSMISSÃO | |
N° de marchas do câmbio | 6 |
Transmissão final | Cardã |
Embreagem | Multidisco, comando hidráulico |
CHASSI | |
Quadro | Conceito de quadro em quatro seções com quadro traseiro em três seções |
Roda dianteira | Raiada 3,50 x 17″ |
Roda traseira | Raiada 5,50 x 17″ |
Pneu dianteiro | 120/70R19 |
Pneu traseiro | 200/50R17 |
Suspensão dianteira | Garfo telescópico hidráulico invertido com Ø 46 mm, curso de 120 mm |
Suspensão traseira | Monobraço oscilante com BMW Motorrad Paralever, curso de 120 mm |
Freio dianteiro | Disco duplo com Ø 320 mm, flutuantes, pinças de freio monobloco radiais com 4 pistões |
Freio traseiro | Disco com Ø 265 mm e pinça flutuante de pistão duplo |
DIMENSÕES, CAPACIDADES E PESO | |
Comprimento | 2.220 mm |
Largura | 890 mm |
Altura (com espelhos) | 1.265 mm |
Distância entre eixos | 1.476 mm |
Altura do banco | 785 mm |
Tanque de combustível | 18 L |
Peso em ordem de marcha | 222 kg |
Galeria