É comum eu ler testes de carros em que o autor dá destaque ao fato de a carroceria se inclinar nas curvas, nos carros nossos de todo dia, classificando o efeito como demérito.
A rolagem é conseqüência do momento decorrente da distância entre o centro de gravidade e o eixo de rolagem (roll axis) do veículo. Veja na foto acima que o RBR está rolando, perceptível tanto pela distância entre aerofólio dianteiro e solo, nas extremidades, quanto pelo ângulo do braço de controle superior em cada lado, em que o esquerdo encontra-se menos inclinado que o direito. Pouco, mas rola.
Há maneiras de evitar a rolagem, por meio de suspensão ativa ou mesmo fazendo uso de amortecedores ativos nos carros de rua, mas será necessário ou benéfico não haver rolagem? Praticamente nada, em especial por haver custo nisso, nada é de graça.
A Bose, conhecida fabricante de sistemas de áudio, tem um programa de suspensão ativa e há um vídeo que tem rodado o mundo há cerca de três anos mostrando a diferença entre seu sistema e uma suspensão convencional. Veja:
É impressionante, não? Mas tudo isso custa muito e por enquanto não chegou à indústria automobilística. Todavia, o atual Mercedes Classe S, lançado no Salão de Genebra deste ano, apresenta uma suspensão que a fábrica chamou de Magic Body Control e que foi até alvo de um curioso comercial mostrando a cabeça de uma galinha enquanto o corpo se mexia, em analogia com as rodas se mexendo e a carroceria, não. Mostramos esse comercial no final do ano passado junto com um da Jaguar também envolvendo um galináceo.
Fica claro que, já que a rolagem existe, a contramedida é oferecer mais resistência a ela pelas molas — mais duras, de constante mais elevada — ou pelos amortecedores, com mais carga de compressão. Ou as duas combinadas.
Pelas molas é o caminho mais fácil, porém ao custo de desconforto de rodagem. É aí que entra a barra estabilizadora, um nome impróprio porque ela não estabiliza nada, apenas faz diminuir a rolagem. Por isso mesmo tem o nome correto em várias línguas: anti-roll bar, barre anti-roulis, barra anti-rollio (inglês, francês e italiano). Os alemães, entretanto, estão na nossa, ou ao contrário: Kurvenstabilisator. Mas também se vê o conceito de estabilização nas línguas citadas.
A barra faz diminuir a rolagem porque quando o carro rola e roda externa à curva “sobe” em relação à carroceria, a barra, que funciona por torção, oferece resistência. Além de ter de vencer a mola da suspensão na rolagem, a carroceria tem de vencer essa resistência adicional.
Depreende-se pelo desenho acima que a barra estabilizadora só oferece resistência quando uma roda tende a “subir” em relação à outra. Se as duas rodas subirem juntas, ter a barra ou não é indiferente.
Fica, então, claro, o papel da barra, que não é de “estabilizar” coisa alguma, mas contribuir para a resistência à rolagem sem prejudicar o conforto de rodagem.
Ou seja, pode-se ter a mesma resistência à rolagem com ou sem barra estabilizadora.
É exatamente o que a indústria faz ao produzir carros de baixo preço. Aplica mola de suspensão mais dura (de constante mais alta) e dispensa a barra estabilizadora. O “prejuízo” é apenas o rodar menos confortável.
Celta e Focus
Dois carros são bons exemplos disso. O Celta nunca teve barra estabilizadora dado seu objetivo de custar o menos possível e, entretanto, é excelente de curva, apenas rodar não é tão confortável. O Focus de primeira geração tinha barra estabilizadora na suspensão traseira. Junto com a suspensão dianteira, era a melhor suspensão que existia, o último grande trabalho do renomado engenheiro da Ford, Richard Parry-Jones, antes de se aposentar em 2007. No Focus de segunda geração a barra traseira foi suprimida em nome da redução de custo — “Custo, o Fantasminha”, como costumo dizer. Foi preciso usar molas de constante mais alta (mais duras) para compensar a eliminação da barra e se perdeu conforto, embora a excelente suspensão multibraço continuasse a desempenhar seu papel com maestria.
A barra estabilizadora tem um efeito perverso no eixo motriz. Quando a roda externa “sobe” numa curva, a barra puxa a interna para cima, diminuindo o peso nela e conseqüentemente a aderência e a tração.
Foi exatamente por isso que quando comecei a correr de Opala na década de 1970 eu retirava a barra traseira (permitido), uma vez que não se podia usar diferencial autobloqueante, ou tração positiva. Eu queria tração, especialmente nas curvas para a direita, em que a reação do eixo ao torque do motor tende a aliviar peso na roda direita. Eu sabia que a rolagem aumentaria, mas ter mais tração era prioridade. Resultado, o meu Opala era mais rápido nas saídas de curva que os outro.
Por isso até acho graça quando alguém diz que determinado carro rola ou, pior, quando diz que o rolling é excessivo, como é comum falar dos Fiat Palio de primeira geração ou mesmo do atual Uno.
Se rolagem fosse algo desprezível o Citroën 2CV não teria vida longa e nem teria se transformado no ícone de transporte racional e barato que é.
Há três anos e meio escrevi matéria sobre barra estabilizadora, vale a pena revisitar. Nela eu conto o que acontece quando ela falha, como ao quebrar ou se soltar.
BS