Está chovendo um pouco, asfalto molhado. É tarde e não tem ninguém nas estradas. Paro num semáforo. Hum, está bem vazio agora…
Puxo a alavanca do câmbio para a esquerda. Na tela, o D muda para S1 (modo esportivo). Empurro a borboleta no lado direito do volante. S1 muda para M1. Semáforo vermelho e. . . agora. Verde! O acelerador no talo, durante uns décimos de um segundo eu sinto as quatro rodas procurando aderência no asfalto. Encontrou, agora, vamos!
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O som dos três cilindros é meio diferente, e a aceleração é forte e gostosa. O câmbio é robotizado, e assim acelerando tudo que dá, no modo M não preciso tocar nada. Chegando na faixa vermelha do conta-giros, vem o som “bop”, que é quando a ignição é cortada no motor pela troca de marcha. A troca é rápida e não dá para sentir nenhuma interrupção na força, pois o motor elétrico dá mais um pouco de torque nestes momentos. Se tivesse em asfalto seco e com pneus quentes, eu teria chegado a 100 km/h em 4,4 segundos.
Quando eu soube que a BMW vai fazer o i8, pensei que seria um carro elétrico como o i3, mas não é assim. O i8 é um carro híbrido, como um Toyota Prius, só que o i8 tem 366 cv e 58,1 m·kgf de torque. A velocidade máxima é de 250 km/h.
Acho que fazer um híbrido é um pouco de moda, ou rotina, já que todo mundo faz híbridos agora, só que o i8 é bem longe de um carro convencional. É um carro bem esportivo, com um mini-motor de 1,5 litro, potência bastante alta e consumo baixo, estrutura da carroceria de compósito de fibra de carbono, portas-tesoura e 2+2 lugares. Tem mais algum carro assim no mercado? Acho que não.
Chegando em casa bem tarde e não querendo incomodar ninguém, aperto o botão edrive e o carro fica todo silencioso — se tiver energia na bateria, claro. Em geral posso dizer que isso não é um problema, porque é muito fácil colocar um pouco de energia na bateria. No momento que se coloca o carro no modo esportivo e se usa o carro numa maneira “normal”, o motor de combustão também começa carregar a bateria. Pode-se perguntar se o consumo de gasolina fica muito alto fazendo isso. É algo relativo, muito relativo no caso do i8.
Dirigindo a 110 km/h na rodovia com só motor elétrico ligado o consumo é zero, claro. Quantos quilômetros de autonomia nesse modo? Uns 25 apenas. Para mim é muito pouco, e não sou só eu que pensa assim. Na China híbridos que têm um autonomia de pelo menos 50 quilômetros gozam de alguns incentivos ou privilégios. Como esse ciclo de teste na China é feito, não sei, mas acho que o i8 não consegue chegar a 50 quilômetros. A autonomia pelo Novo Ciclo Europeu de Condução (NEDC) é de 37 quilômetros, segundo informação de BMW. A bateria no carro é bastante pequena, capacidade de apenas 7 kW·h, e disso só 5,2 kW·h pode ser usado na prática. Assim o uso apenas elétrico é muito limitado.
Mudando para o modo normal na mesma velocidade, 110 km/h, o computador de bordo diz que o consumo fica na região de 30 km por litro. Tem-se que cuidar muito do acelerador para se conseguir um consumo tão baixo, mas pelo menos 20 km/l é fácil e muito, muito bom, lembre-se que é um carro com 366 cv !
Mudando o modo mais uma vez nessa velocidade, para o Sport, o consumo aumenta para uns 12 km/l. Isso não é só porque o motor gera energia elétrica para a bateria. O câmbio vai de D6 para S5 e as rotações do motor sobem bastante. O barulho do motor fica mais alto também. O motor faz esse ronco meio raro para um motor de três cilindros. Parece um pouco como um V-6 grande em rotação não muito alta. Alguns anos atrás quando dirigi um Audi A2 1.4 TDI de três cilindros, o som do motor era bem parecido. Só que o motor do i8 é a gasolina 1,5-litro e turbo, tem 150 cv mais do que o A2, e chega perto de 7.000 rpm!
Escutando o ronco do motor, mudando várias vezes entre Sport e Normal eu fico meio confuso. Parece-me estranho, uma válvula no escape pode fazer uma mudança assim? Ou. . . estou escutando um barulho sintético, um ronco que não é verdade. Será que é algo que vem do sistema áudio do carro? Baixo o vidro da porta e o ronco por fora também fica mais alto. Ãh? Com muita curiosidade, faço uma pesquisa na internet. A-rá!, é verdade, o barulho do motor vem do áudio. Dentro do carro há quatro alto-falantes para isso e por fora háum alto-falante meio grande no lado esquerdo, onde poderia ter sido colocado um silenciador do escapamento, se o carro tivesse um sistema com dois tubos.
Fico todo confuso, o ronco no modo Sport é bacana, sem dúvida, cada pessoa que o escuta fica com um sorriso grande. Eu também. E esse som parece de verdade, só que. . . não é.
Acho que vai ter muita polêmica entre autoentusiastas no mundo sobre isso, e deixo isso para lá, o ronco me faz sorrir e eu estou gostando muito trocando marchas usando as borboletas no volante. Acelerando ou desacelerando forte, o motor faz um “bop” na troca para cima e um aumento curto da rotação do motor no momento que se troca marcha para baixo, não tem como não gostar disso.
Eu quero escutar esse ronco do motor quando o carro estiver parado no “neutro”. Só que no momento que se sai de S para D com o carro parado, o motor morre, vai para “N” também, claro. Não tem como fazer uns roncos com o motor com o carro parado? Com motor parado no “N” eu aperto o acelerador só para ver se acontece algo. E, o motor liga, mas “livre” o motor não é, parece um pouco sufocado e acho que o gerador está carregando a bateria. É evidente que a BMW não quer que alguém fique “brincando” com o acelerador com o carro parado.
O câmbio é de seis marchas e a troca automática é muito bem feita, sempre rápida e macia ao mesmo tempo e em qualquer um situação a marcha certa esta ali. Ah, só uma coisa que eu não gosto, as borboletas solidárias ao volante. Entendo que isso poderia ser bom se tivesse um carro para track days, quando se pode ficar com os mãos no volante sempre. Só que a direção não é tão direta/rápida e no uso normal eu fico várias vezes querendo trocar marcha sem saber onde está a borboleta certa. Para cima ou baixo? Esquerda ou direita? Eu prefiro muito mais as borboletas que ficam fixas na coluna do que no volante, assim sempre se sabe onde ficam as borboletas, – pela esquerda e + pela direita.
Eu disse que o carro não é muito bom para um circuito, como assim? Sim, a problema principal são os pneus. O standard é 195/50R20 e 215/45 R20. O carro de avaliação estava com os pneus opcionais 215/45R20 e 245/40 R20. Para o desempenho do carro isso simplesmente não é suficiente, e até nas estradas normais eu fico sem aderência, principalmente nas rodas dianteiras.
O carro deu algumas saídas de frente bastante graves em algumas curvas quando eu o dirigi com muita inspiração. O ESP ajuda um pouco, mas é bem evidente que falta aderência. Entendo porque, cada carro tem seus compromissos, e a BMW priorizou um consumo baixo.
Falando de pneus, na rodovia os pneus fazem bastante barulho e eu me surpreendi com isso. O i3 tem um barulho dos pneus que é bastante baixo e pensei que a separação entre o chassis de alumínio e carroceria de compósito de fibra de carbono fosse o motivo, mas como o i8 faz um barulho mais alto deve haver outra razão. que acho não ser só dependente da largura dos pneus. Tudo bem, o barulho não é tão alto como num Porsche 911, é suportável, só que pensei que fosse menos. O ruído do vento é bem mais controlado.
O conforto no carro é bom no geral, sem dúvida. As molas e amortecedores são firmes e num nível que para mim é perfeito, nunca firme ou mole demais. A direção também é boa e o carro simplesmente é muito gostoso de dirigir. No assunto do chassis só tem uma coisa para melhorar. Quando se vai de uma faixa para uma outra, cruzando as linhas pintados no asfalto, o carro serpenteia um pouco, quase parecendo uma moto com o pneu atrás bastante gasto e plano. Raro isso.
Os bancos são confortáveis e dão bom suporte para dirigir de modo esportivo. E os bancos +2 atrás? Ai, meu Deus. É só para crianças mesmo. Alguém com 1,65 m de altura fica com a cabeça no teto e o espaço para pés e pernas é nada mais do que diminutivo. Eu me sentei ai atrás e consegui ficar lá, mas com cabeça, não, o corpo inteiro, todo torto. Para um adulto é só algo para viagem bem curtas, coisa de emergência. Mas, por outro lado, como sou pai com filhos, gosto muito de ter condições levá-los no carro que uso, e nisso o i8 funciona bastante bem.
Usando o carro. tive a oportunidade de levar vários amigos, e entrar e sair do carro é um capitulo. . . diferente. Eu vi tantas maneiras diferentes de entrar e sair do carro que nunca imaginei possível, e entrar e sair do banco traseiro é muito complicado, e agora vou fugir um pouco do tema.
Na área de saúde há uma medida que eu acho bem interessante: quantos pontos se precisa para se levantar do chão? Ok, sente-se no chão, com as pernas para frente. Bom, agora coloque um pé bem perto das suas nádegas, dobrando a perna, sem tocar nada com as mãos e tente se levantar com essa perna apenas. Isso é se levantar com um ponto. Você conseguiu? Parabéns! Então você é qualificado para entrar e sair do BMW i8.
Tudo bem, pode ser que você vá conseguir usar o carro se você precisa até três pontos para levantar do chão. E se for mais do que três? A vida com um i8 vai ser bastante complicada. No final do meu uso do i8 eu entrava e saía dele como se o carro fosse meu. Minha dica para entrar no carro é essa:
Para abrir a porta há um botão, elétrico, na parte traseira da porta. Apertando-o pode-se levantá-la. Depois vire as costas para o carro e caia dentro do carro com o traseiro primeiro. Agora suas panturrilhas vão tocar a borda do exterior do carro, que se estiver sujo e/ou sua roupa for clara vai sujar (se você ver alguém com calça suja ou molhada aí atrás das panturrilhas, você sabe que ele tem um i8). Com as nádegas dentro do carro e os pés fora é só levantar as pernas e virar para dentro. Simples depois de uns dias com o carro. Sair do carro é parecido e se tem que usar pelo menos uma mão para se levantar do carro, também uma coisa que se aprende depois um tempinho. Até que no final do uso com o i8 eu já gostava dessa maneira diferente de entrar e sair.
Dentro do carro, o interior parece algo entre um BMW normal e o i3 com duas telas, e com um tempo de uso se aprende como usá-lo sem confusão. Se houver alguma dúvida sobre algo, o manual é acessível na tela grande na parte de cima do console. Uma coisa que acho meio estranho foi que a câmera de ré que funciona bem no escuro, inclusive. Pelo vidro traseiro tem-se uma visão que dá para usar um pouco. Mas teve um momento que eu fiquei em dúvida sobre o que tinha atrás do carro, e para ver melhor eu abri a porta um pouco, como se faz num Lamborghini quando se dá ré, e. . . o i8 parou! Não quer dar mais ré não? É assim com BMW. Porta aberta? A alavanca vai sozinha para “N” e o carro não anda.
Então, pode ser que eu tenho várias coisas para reclamar do carro, mas são coisinhas. Em geral eu gostei esse i8, até muito. Ele é divertido, diferente, econômico no uso (não para comprar, o preço na Europa é uns 150 000 euros, equivalente a cerca de 480 mil reais ), prático pelo tipo de carro. Tem tração nas quatro rodas, com o fio na tomada o carro sempre tem a temperatura que você quer na partida, parece um bom carro para os invernos no norte da Europa.
Depois de devolver o i8 sentimos muita falta dele, todos nós na família, as crianças também. O filhão, porque o carro é “bacana”, rápido e tem um ronco legal. Minha filhinha, porque “As portas são divertidas e dá para chegar até a escola com o motor elétrico, e isso é bom para o meio ambiente”.
Bem, é verdade. Parabéns, BMW, com o i8 vocês encantaram a família inteira. E nas estradas faz tempo de eu não dirigia um carro que chamasse tanta atenção, muita gente olha, faz fotos e conversa no posto.
É difícil esquecer os dias com esse BMW i8.
HJ
Fotos: Hans Jartoft e Björn Vesterdahl, exceto onde indicado