Oscar Wilde dizia que não se pode confiar numa mulher que conta a verdadeira idade, pois se ela disser isso, é capaz de dizer qualquer outra coisa. Isto posto, não contarei minha idade, nem a confirmarei ou desmentirei mesmo que insistam, mas vocês poderão ter alguma idéia com o que me lembrei estes dias.
Relendo minhas colunas, me chamou a atenção o comentário de um leitor a respeito do problema que meu tio teve no Citroën 3 CV com o condensador. Condensador? Ora, quantos outros itens os carros não têm mais hoje? E comecei a relembrar alguns – certamente não todos, mas apenas aqueles que saíram por livre e espontânea vontade do baú da minha memória. Aqueles que se esconderam, seja por falta de bits e bites no meu disco rígido mental seja porque não convivi com eles, continuam lá no fundo.
Afogador
A injeção eletrônica tornou obsoleto o afogador – aquele botão de puxar que os carros tinham próximo do volante para ajudar a dar partida e que uma distinta senhora teria achado que era o lugar perfeito para pendurar a bolsa. Se alguém não se lembra, ele servia para enriquecer a mistura de ar e combustível ao dar partida no motor frio e assim permitir que ele “pegasse” com mais facilidade. Era tudo bem mecânico, mesmo. Quando se puxava o afogador, uma borboleta limitava o fluxo de ar na entrada do carburador enriquecendo a mistura ar-combustível. Depois de alguns minutos, era só voltar o afogador para a posição inicial e deixar que o motor recebesse a mistura, digamos, convencional, de ar e combustível. A injeção eletrônica acabou com a necessidade de se ajustar a mistura manualmente — o comando de enriquecimento é eletrônico —e acabou o botão de pendurar bolsas – aliás, lugar deveras incômodo para isto, especialmente no meu caso que carrego bolsas gigantes. Engraçado como as pessoas se lembravam de voltar o afogador para a posição inicial e hoje, com muitas menos operações para fazer, tem gente que nem lembra de acender os faróis do carro à noite…
Carburador
O carburador merece um lugar especial na minha memória. Como já disse aqui, meu primeiro carro tinha não apenas um, mas dois carburadores. Como dizem lá em Sorocaba, ô inferno! Hoje a injeção eletrônica jogou para o esquecimento os carburadores. Pena, no sentido figurado, pois achava um charme saber como era o funcionamento de um, pois faz parte do que chamo de mecânica básica. Basicamente, ele servia para formar a mistura de ar e combustível para permitir que a combustão fosse completa e o motor funcionasse corretamente. Voilá, lembrei das aulas de Física e os tais motores a combustão. A mistura ideal é também chamada de mistura estequiométrica. Lembro que quando aprendi cálculo estequiométrico no segundo grau (fiz Exatas), era minha parte favorita da Química. Mas com as dificuldades que sempre tive, me divertia juntando moléculas que nunca se uniriam e deixando as de oxigênio livres por ai. O que acontecia com elas? Ora, era ar, e ele sumia! Entrava uma coisa e saia outra, mas no meio ainda tinha evaporação, condensação e outros fenômenos físicos ainda não descobertos. A bem da verdade, tenho que dizer que não dava muito certo. Criei muita substância que não existe e com moléculas que nem amarradas se juntariam – mas sempre era divertido e um enorme exercício de criatividade.
Mas voltemos à mistura estequiométrica. Mantê-la a faz com que o motor extraia o maior proveito da densidade de energia do combustível. Se houver menos ar que o necessário, a mistura será rica e causará consumo excessivo de combustível e o motor “afogará”. Se, ao contrário, houver ar demais junto com o combustível, a mistura será pobre e sua queima produzirá menos potência. Claro que o equilíbrio perfeito não foi alcançado de primeira, e nem teve ajuda minha. Na teoria, a relação ideal ar-gasolina seria 14:1, ou seja, 14 partes de ar para uma de gasolina. Digo na teoria, pois isso seria para um motor a gasolina, esta sem álcool nenhum. Mas com as constantes mudanças na proporção de álcool na gasolina, o cálculo tem de ser refeito constantemente. No caso da gasolina com 22% de álcool é 13,2:1; se álcool puro, 9:1.
Condensador (ou capacitor)
E, claro, não podia deixar de falar do condensador – ou mais adequadamente, o capacitor. O que é que ele fazia, mesmo? Absorvia corrente elétrica no momento em que o platinado abria, de modo a interrompê-la completamente, sem deixar haver faiscamento, e, assim, assegurar a perfeita indução na bobina para a produção de corrente de alta tensão destinada às velas. Se não cumprisse sua função plenamente a tensão de saída na bobina era insuficiente ou nula. Hoje essa função cabe a diodos.
Mudando de assunto: Podem alegar que eu tenho dificuldades com as Ciências Exatas, eu aceito. Mas exatamente como é que a Prefeitura de São Paulo pode dizer que o tempo médio de viagem de ônibus, do ponto inicial ao final, diminuiu de 66 minutos em 2013 para 63 no ano passado no horário de pico da tarde se, ao mesmo tempo, ela mesma divulga que a velocidade média dos ônibus no mesmo horário passou de 16 km/h em 2013 para 15 km/h em 2014 – mesmo com a implantação de mais 77,8 km de corredor de ônibus de um ano para o outro? Que os corredores de ônibus não adiantaram, ou até pioraram a situação, parece-me claro, mas alguém pode me explicar como uma velocidade média mais baixa resulta em menos tempo total? Só se encurtaram o percurso, o que falsearia as estatísticas, ou se a velocidade fora dos corredores aumentou (então para que servem?). Se não, acho que perdi essa aula de Matemática na escola…
NG