Um dos assuntos que eu reservei para a minha coluna “Falando de Fusca” é a reprodução de alguns causos de meu segundo livro, o “EU AMO FUSCA II – Uma coletânea de causos de felizes proprietários de Fusca“, que é a compilação de 67 causos relatados por proprietários e proprietárias de Fusca e Kombi. Conto como o livro surgiu, como foi lançado e assim o livro toma corpo e mostra que tem uma personalidade própria. Acredito que muitos leitores irão se identificar com os causos deste livro, outros se emocionarão, e espero que todos gostem da compilação que fiz.
Em março de 2003, na antiga (e saudosa) concessionária Volkswagen Sabrico, na avenida Antártica, bairro Água Branca, na cidade de São Paulo, houve uma coletiva de imprensa organizada pelo amigo Koichiro Matsuo, dono da agência de comunicação Texto Final, para apresentar o meu primeiro livro “EU AMO FUSCA – A história brasileira do carro mais popular do mundo”. Na ocasião constatei, por algumas perguntas disparadas por alguns dos jornalistas, em especial pelo amigo Wagner Gonzalez (agora colega colunista no AE), que havia espaço para o registro da convivência entre o Fusca e seus usuários.
Esta constatação foi reforçada na noite de autógrafos do livro, realizada na Livraria Cultura do Shopping Villa Lobos, em São Paulo. Aliás, esta noite de autógrafos foi memorável, muitos e muitos amigos prestigiaram o evento e a fila chegou a levar uma hora, mas como muitos se conheciam o tempo passou em altos papos.
Foi assim que surgiu o “EU AMO FUSCA II”, uma compilação de contribuições garimpadas das mais variadas formas, detalhadas na minha introdução ao livro, que vou anexar ao próximo causo a ser publicado nesta coluna.
Neste segundo livro destaco a participação de meu amigo de longa data, Bob Sharp, que, além de ter contribuído com um interessante causo (“Feijoada em Quitandinha”), já na fila para ser apresentado aqui, escreveu o prefácio do livro, reproduzido mais abaixo após o primeiro causo desta série (“O Padrinho”), do também amigo Ronaldo Berg.
Este segundo livro também teve a sua coletiva de imprensa, igualmente organizada pelo Koichiro Matsuo, mas realizada no “Volkswagen Haus”, uma linda e sofisticada área de exposição de veículos e de eventos que era mantida pela Volkswagen do Brasil. Ficava no térreo do carismático prédio que havia sido sede da Dacon, concessionária VW e importadora oficial Porsche no bairro dos Jardins em São Paulo, na esquina das avenidas Brigadeiro Faria Lima e Nove de Julho. O Bob não só esteve lá, como ajudou a organizar as cadeiras para os participantes:
Novamente a presença de personalidades da imprensa automobilística, como se pode ver na foto abaixo, valorizou o evento. A tarefa de fazer a legenda desta foto ainda não foi concluída: agradeço a ajuda de indicar os nomes dos participantes por serem identificados. Os nomes já encontrados (com a ajuda do Bob , da Raquel Alves, do Gabriel Marazzi e do Fabiano Mazzeo) são os seguintes: 1- Paulo Ribas, da Gráfica e Editora Ripress; 2- Bob Sharp; 3- Fernando Calmon; 4- (por nomear); 5- (por nomear); 6- Eduardo Picingher; 7- (por nomear); 8- Edison Ragassi; 9- Luciano Dellarole; 10- Rosiane Moro; 11- César Sassi; 12- Raquel Alves; 13- Mário Pati, então editor de Veículos da Folha de S. Paulo; 14- Gabriel Marazzi; 15- (por nomear) e 16- Koichiro Matsuo:
O lançamento do segundo livro também foi na Livraria Cultura do Shopping Villa Lobos, no dia 30 de março de 2004, e teve como destaque a participação ativa de vários dos autores que contribuíram com causos e que também autografaram o livro, numa bonita festa. Para dar uma impressão do clima desta agradável noitada, aí vão algumas fotos, nas quais procurei dar destaque à presença de autores:
Durante o lançamento eu fui gratamente surpreendido pelo amigo Marcus Valério Lins Barroso, que me deu um lindo presente, um quadro que ele compôs, com uma dedicatória no verso:
Esta é a dedicatória que o Marcus Valério escreveu:
Querido Alexander Gromow,
As paixões removem montanhas e transformam sonhos em realidade. Neste dia tão importante para você, o lançamento de seu livro “Eu Amo Fusca”, volume II, vale lembrar de outro projeto de um grande sonhador: Sr. Ferdinand Porsche, que a partir de um ideal, desacreditado por quase todos, que teve como berço, uma fábrica construída em 1938 e quase destruída totalmente em 1945, gerou como filhos um PATINHO FEIO, chamado VOLKSWAGEN SEDAN, que se transformou ao longo de seus 68 anos de vida em um cisne da Indústria Automobilística; O CARRO DO SÉCULO, o carro mais amado do mundo – O FUSCA. Portanto, muito cuidado com seus sonhos, pois eles geralmente viram realidade.
Parabéns por seu novo livro
Marcus Valério Lins Barroso
São Paulo, 30/03/2004
Juntos, os dois livros dão, de um lado, a história do carro desde os seus primórdios na Alemanha até a sua despedida definitiva no Brasil e, de outro, “a resposta do usuário”, aqui tomando emprestado o jargão de controle de qualidade da ISO 9000, detalhando este intrincado e complexo relacionamento entre homem e máquina através do relato de causos. Máquina? Sei que você, leitor, e vários outros, não concordarão com esta qualificação para o Fusca, já que há um elo ainda não claramente definido que nos une aos nossos Fusquinhas. Sim, pois como costumo dizer, o Fusca é um membro da família que dorme na garagem, mas compartilha um bom espaço em nossos corações.
Primeiro causo
Agora, o primeiro causo do meu segundo livro a ser apresentado aqui na “Falando de Fusca”. Aconteceu na Paróquia Imaculado Coração de Maria, mais conhecida como Capela da PUC – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, que fica na rua Monte Alegre, 948, Perdizes, em São Paulo. A fachada desta capela é apresentada na foto inicial desta matéria; observem o espaçamento entre as colunas centrais da entrada, pois ele faz parte importante deste causo. O autor, Ronaldo Berg, é amigo meu de longa data, ainda do tempo em que ele trabalhava na Volkswagen e lá ele foi um dos artífices do esquema que permitiu que meu Fusca fosse restaurado na antiga Ala 0, onde funcionava a oficina de assistência técnica e de reparações para os veículos da frota.
Quando eu estava garimpando material para o livro eu soube deste causo, que foi vencedor de um concurso da Volkswagen, realizado em 1984, “Grande Concurso FUSCA 25 anos”, e convidei o Ronaldo para participar do meu livro, convite aceito imediatamente. Registrei esse relato em 1985.
“O Padrinho
Por Ronaldo Berg
Num belo dia de verão, Luiz Colet Lacerda conheceu uma linda garota loura, de grandes olhos castanhos e que não tinha mais do que um metro e cinqüenta e cinco centímetros de altura.
Depois de uma paquera irresistível, ela aceitou o convite do Luiz e foram tomar um lanche no bar ao lado do colégio em que estudavam.
Isto aconteceu em 1963. Naquela época ele jamais poderia imaginar que hoje estaria casado com a linda lourinha chamada Cecília.
Foram seis anos de um tumultuado namoro, pois havia entre ambos muitos pontos conflitantes. Ele gostava de preto, ela de branco. Ele queria ver um filme, ela outro. Mas nem tudo era discussão. Em um ponto ambos se acertavam muito bem: amavam o carrinho deles, um Fusca.
Do ano 1965, bem conservado, o Fusca era o aliado de todos os programas. Nunca faltou ao serviço, sempre fiel, um criado às ordens deles. Na verdade Cecília tinha até um pouco de ciúme dele, de tanto que o Luiz cuidava do carrinho.
Mas Luiz sabia que algum dia ele os recompensaria por todo aquele trato.
E não é que aquele dia chegou?
Dia 10 de janeiro de 1969. Dia do casamento deles. Local: Pontifícia Universidade Católica em São Paulo, no bairro de Perdizes. Horário: sete horas da noite. Convidados: aproximadamente 250 pessoas.
Mas, onde está o noivo? Todos perguntavam. Sim, isso mesmo. A noiva à porta da igreja e o noivo ainda não havia chegado.
Houve um tremendo temporal. Aqueles típicos de verão. O trânsito estava um caos. Árvores caídas e o pior: sem energia elétrica. Ruas e casas às escuras. Finalmente, o noivo chegou.
— Mas acabar a luz numa hora dessas? Não é possível, como vamos nos casar? — dizia Cecília, prestes a chorar.
Aí surgiu a grande ideia. O Fusquinha deles iria ajudá-los.
Como num toque de mágica o carro foi colocado na porta da igreja e a iluminação gerada por seus faróis foi suficiente para que o padre anunciasse a união deles.
O nervosismo acabou assim que os faróis do Fusca iluminaram o altar. Tudo deu certo. Saíram da cerimônia felizes da vida, como registrado em foto junto com o Fusca na porta da igreja, e felizes da vida vivem até hoje. Cecília, a esposa de Luiz, Simone que está com treze anos, Luiz, com onze e as gêmeas Liliane e Cristiane, com cinco anos e um outro Fusca, também querido como aquele que foi o PADRINHO DE HONRA do feliz casal.”
Prefácio: Volks populi, Volks dei
Em paródia ao conhecido ditado, em latim, “vox populi, vox dei”, foneticamente parecido com o trocadilho acima, o Fusca é o carro do povo, carro de Deus. Pode até ser pretensão ligar Deus a automóvel, mas o fato é que estamos vivendo um período de motorização tão intenso que até a divindade vem sendo incorporada aos assuntos automobilísticos. Não faz muito tempo, religiosos perguntavam, nos Estados Unidos, “Que carro Jesus dirige? ” Era parte de uma campanha contra os veículos utilitários esporte, tidos como grandes gastadores de combustível.
De outra feita, o experiente e internacional jornalista canadense especializado em veículos, Jim Kenzie, ao escrever no jornal “The Toronto Star” sobre um novo modelo americano que, ao contrário dos anteriores, tinha tração traseira (como a do Fusca), não hesitou em dizer que “A tração é nas rodas que Deus quis que fossem as motrizes”. Nosso inesquecível tricampeão Ayrton Senna teve momentos em sua fulgurante carreira em que afirmava ver Deus no habitáculo do seu McLaren-Honda.
Mas, carro do Criador à parte, o fato é que o Fusca nasceu com o nome, em alemão, de carro do povo, e sua trajetória de 58 anos de produção e comercialização apenas confirmaria que era mesmo para as massas que ele havia sido concebido pelo Professor Ferdinand Porsche. Só no Brasil, foi produzido durante trinta anos e constituiu desde o início objeto de desejo para milhões.
Quando Alexander Gromow lançou o livro “Eu Amo Fusca” em 31 de março de 2003 — não poderia ter escolhido época melhor, a que coincide com o mês do cinquentenário de fundação da Volkswagen do Brasil —, rendeu uma homenagem mais do que justa a esse pequeno grande carro que fez parte da vida de duas gerações de brasileiros e marcou indelevelmente sua presença no coração de todos, até de quem nunca teve um.
E que homenagem! Desde a gênese no país de origem, passando pela sua chegada em terras brasileiras, o livro chega à descrição minuciosa de sua “morte” em 1986, da “ressurreição” em 1993 por sugestão do presidente Itamar Franco e da “subida definitiva aos céus” em 1996 — chega a haver um quê de espiritual nisso tudo. O lado “humano” do Fusca foi muito bem explorado na série de quatro filmes da Walt Disney Productions iniciada em 1969, em que o carro era o “Herbie”, um personagem simpático que tinha sentimentos humanos e externava as mais diversas reações.
A ligação homem-máquina existe desde que o mundo é mundo, embora obviamente tenha começado pelo cavalo. Quando apareceu o automóvel em nossas vidas, a relação haveria de se transformar, mas continuaria imutável e tão intensa quanto. Toda marca automóvel tem sua história, sua paixão, sua vida e o que representou para seus donos e donas, num universo que vai de poucas dezenas em alguns casos a milhões em vários outros. No caso do Fusca, o que o carrinho significou para três milhões e duzentos mil brasileiros merecia ser contado, e certamente foi pensando nisso que Alexander Gromow partiu para o “Eu Amo Fusca II”.
Curiosamente, já na noite de autógrafos de “Eu Amo Fusca” — uma das mais concorridas já vistas, diga-se —, Alexander percebeu que havia espaço para o relato de experiências de vida com o Fusca. Foi ali mesmo que ele decidiu que esse seria o foco do seu segundo livro sobre o popular carro.
Movido pela nova idéia e motivado pela sua imensa paixão pelo Fusca, o autor pesquisou, colheu informações, garimpou testemunhos e do seu enorme trabalho surgiu esta obra, uma coletânea de causos que ajudarão a compreender ainda melhor este carro fantástico e, por que não, proporcionar momentos de distração e sobretudo enlevo para o leitor.
São todos fatos da vida real, vividos por pessoas de ambos os sexos e todas as idades e que bem demonstram o que o Fusca foi capaz de gerar em termos de afetividade. Um verdadeiro animalzinho de estimação. Parte da família, pode-se arriscar dizer. Um leal companheiro, amigo para todas as horas, testemunha de inícios de namoro, de casamentos e, sem querer ser chulo, de leito nupcial. Até sala de parto o Fusca foi, como na passagem “É menina”.
Cada causo supera o anterior e, desta maneira, o leitor vai tomando consciência do tamanho da presença do Fusca no dia-a-dia de cada proprietário ou proprietária, suas alegrias, paixões, surpresas, angústias, tristezas com perdas, como quando era furtado. É um trabalho de valor inestimável, que seguramente ajudará a manter vivo nas nossas mentes e das gerações futuras esse carro único, que se manteve em produção praticamente durante praticamente seis décadas sem mudanças importantes do primeiro ao último.
Bob Sharp
AG