As fábricas de automóveis não gastam dinheiro à toa, principalmente com dispendiosos protótipos funcionais, sem que haja uma boa razão para tal.
Um veículo protótipo funcional movimenta grande parte da engenharia do produto, o departamento de estilo e também a engenharia de manufatura, para ser idealizado. Muitas horas de trabalho são investidas para que o protótipo seja definitivamente bem sucedido para a finalidade imperativa.
E a Ford materializou no ano de 1962 um carro esporte, com o objetivo de ganhar mercado neste segmento onde a companhia não tinha nenhum representante. Quem sabe o Ford Thunderbird chegasse próximo porem, era muito grandão e não inspirava os atributos para tal. Na realidade, no mercado americano, somente a Chevrolet com o seu Corvette, se mantinha ativa neste segmento.
E foi com um grande incentivo de Lee Iacocca, presidente da divisão Ford nos Estados Unidos, que foi projetado e desenvolvido um protótipo totalmente funcional de um novo carro esporte. Desenhado por Joe Oros, teve seu nome em homenagem ao eficiente avião de caça P-51 Mustang, utilizado na Segunda Guerra Mundial.
O Ford Mustang nasceu com um desenho superaerodinâmico, em carroceria de alumínio e chassis tubular. Com 3,91 m de comprimento, 2,28 m de distância entre eixos e com apenas 700 kg, tinha suspensão independente nas quatro rodas e adotava um motor V-4 1,5-L com potência bruta SAE de 90 hp, herdado do alemão Ford Taunus 12-M, instalado na posição traseira. O transeixo alojava um câmbio manual de quatro marchas. A direção era por pinhão e cremalheira e os freios eram a disco na frente e a tambor atrás. Os faróis grandes e escamoteáveis davam um ar supermoderno ao veículo. Tinha somente dois lugares com bancos tipo concha e volante com regulagem de altura.
Sua apresentação ao público em 1962, no GP dos Estados Unidos de Fórmula 1, em Watkins Glen, no estado de Nova York, não foi o sucesso esperado, embora tenha despertado muita curiosidade. O protótipo foi mostrado também aos jovens na Universidade de Miami e em algumas revendas autorizadas Ford, com o mesmo mediano resultado.
O retorno pouco favorável do público no campo e seus excessivos custos de viabilização acabaram por colocar uma pedra em cima do projeto do primeiro Mustang, e que teria motorização traseira. O seu protótipo funcional se encontra no Museu Henry Ford em Detroit e de vez em quando sai para tomar sol em exposição externa.
Mas a Ford não dormia em serviço, fazendo simultaneamente, vários estudos de estilo e outros projetos funcionais para o seu carro esporte. Como exemplo, também em 1962 foi desenhado o Avventura, um fastback que ficou somente no papel. Tinha como característica marcante o passageiro traseiro sentado invertido, de costas.
E logo no inicio de 1963 foi apresentado um novo projeto para o Mustang que, diferentemente do primeiro, tinha um motor V-8 4,7-L (289 pol³) com carburador quádruplo com 271 hp de potência bruta SAE instalado convencionalmente na dianteira, eixo rígido na traseira e linhas mais tradicionais, embora também modernas. Com teto baixo e capô longo, já trazia a grade decorada com o cavalo selvagem que se tornaria o seu símbolo maior.
Como curiosidade, um modelo 4-portas também foi considerado, embora logo rejeitado por Lee Iacocca.
E então foi construído um protótipo funcional que para ser exposto em algumas revendas da Ford de maneira a entender a opinião do público consumidor. E lá estava ele no Salão do Automóvel de Nova York, em abril de 1964, recebendo elogios por parte do público e da mídia especializada, superando em muito o primeiro modelo.
E quase simultaneamente, a Ford envia à sua rede de revendas o Mustang em sua versão definitiva, modelo 1964 ½ com faróis circulares sem as gradinhas trapezoidais. O sucesso foi tão grande que já no primeiro dia recebeu mais de 20.000 pedidos.
Com seu estilo diferenciado, projeto e desenho de três profissionais da Ford americana, Joe Oros, David Ash e Gale Halderman, o Mustang iniciava a sua saga de sucesso. Lançado em duas configurações, cupê e conversível, ambos com quatro lugares, tinha bancos dianteiros individuais, um grande console central e volante esportivo com três raios. Seu comprimento de 4,5o m e distância entre eixos de 2.7 m mantinha proporcionalidade marcante em suas linhas. Logo em seguida veio o fastback, complementando a linha.
Com quatro opções de motores, dois de seis cilindros em linha e dois de oito cilindros em “V”, abrangia todos os gostos. O mais fraquinho era um seis-cilindros com 2.8-L e 101 hp, herdado do Ford Falcon, e o mais forte o citado V-8. Na realidade com este, nascia o pony car da Ford, com características de robustez e potência que seguiram com a marca ao longo dos anos.
Para se ter uma ideia, no Tour de France de 1964/65, com 10 dias de duração e mais 12 horas em circuitos de corridas, as duas primeiras colocações pertenceram ao Mustang, acabando com a hegemonia de quatro anos da Jaguar.
Com freios a disco nas rodas dianteiras, direção hidráulica, ar-condicionado, eixo traseiro rígido com diferencial autobloquante, acabamento primoroso e um comportamento dinâmico invejável, seu sucesso aumentava a cada dia e também os investimentos em publicidade, vinculados em outdoors, revistas, rádio e televisão.
E no final de 1964, modelo 1965, foi apresentado o Mustang Fastback, que em minha opinião foi à versão mais marcante de sua história. Me dá vontade de colocá-lo em minha sala como enfeite.
Como curiosidade, a Cia. Santo Amaro de Automóveis, tradicional concessionária Ford em São Paulo, importava e vendia o Mustang com preço em torno de 35 milhões de cruzeiros, equivalente a aproximadamente um milhão de reais de hoje
E no embalo, veio o modelo bravo, o GT 350 preparado por Carroll Shelby. Com freios e suspensões revisados e o motor V-8 289 com mais de 300 hp (potência líquida), o Mustang virou um carro de corrida.
Com mais de 50 anos de existência, o Mustang realmente foi, é e provavelmente continuará sendo o mais bem-sucedido carro da Ford em termos de imagem adquirida. Passou por alguns maus momentos na década de 1980, que abalaram muito a sua imagem, porém logo veio a recuperação e hoje continua sendo um ícone automobilístico, desejado mundialmente pelos autoentusiastas.
Como sempre encerro a matéria com uma homenagem. Desta vez, duas:
A primeira, ao brilhante executivo Lee Iacocca, que alavancou o projeto do Mustang, investindo com toda a propriedade em seu sucesso.
A segunda vai para o avião de caça P-51 Mustang que dividiu o seu nome com o ícone maior.
CM