Na semana que abre a temporada da Stock Car brasileira, matéria publicada pelo jornal Folha de S.Paulo nesta segunda-feira (29/2) descreve comunicação entre comissários técnicos da Confederação Brasileira de Automobilismo, a CBA, sobre fatos ocorridos em uma prova da categoria disputada há cerca de um ano. Se o teor da conversa é passível de ser classificado como uma “molecagem”, como disse um dos envolvidos, erros grosseiros e informações desencontradas deixam claro a falta de seriedade com que a entidade trata dos assuntos que justificam sua existência.
Em texto assinado por Paula Cesarino Costa aparece a informação de que o diário paulistano teve acesso às mensagens trocadas via aplicativo WhatsApp no dia 7 de abril de 2015, por “um grupo de comissários e auxiliares que atua no circuito”. Mais correto seria ter categoria em vez de circuito, posto que o segundo termo é o usado para descrever um autódromo ou traçado definido para uma competição. Mero detalhe.
A conversa faz menção a Cacá Bueno (foto de abertura), que dois dias antes a essa data, não poupara a CBA e seu pessoal por erros cometidos no final da primeira das duas baterias que formaram a rodada disputada no circuito de rua de Ribeirão Preto. O erro principal, na opinião do piloto, foi não ter recebido a bandeirada de chegada ao completar a prova e que levou ele e seu rival Marcos Gomes a continuarem disputando, desnecessariamente, a primeira posição. Cacá foi julgado e condenado em primeira e segunda instância.
Uma série de fatores ajudou a incendiar essa fogueira. Um deles é o piloto: Cacá Bueno é, indiscutivelmente, um piloto aguerrido, capaz, e, disparado, o mais articulado de sua classe profissional. Graças às suas habilidades e conquistas dentro das pistas tem muito prestígio com o público, patrocinadores e boa parte da imprensa. Pelo fato de ser filho de quem é também recebe atenção diferenciada da emissora que transmite as provas que formam o campeonato. Por tudo isso está sempre em destaque na mídia, especializada ou não.
Na noite do sábado anterior à prova de Ribeirão Preto presenciei uma longa discussão entre Bueno e alguns comissários desportivos e técnicos, conversa que primou por um debate até certo ponto inócuo, independente da validade do teor discutido. Por isso mesmo não me recordo do assunto tratado na tertúlia “light” que acompanhei de perto; afinal, dependia do seu término para gravar uma entrevista com o piloto. Lembro, no entanto, que os dirigentes teceram comentários sobre a determinação de Cacá Bueno em querer resolver aquela questão.
Vale destacar que fora dos boxes o automobilismo brasileiro carece do mesmo padrão de profissionalismo e seriedade praticado pelas principais equipes e pilotos, a começar pelos dirigentes e pelo corpo técnico-desportivo que trabalha para homologar, supervisionar e julgar o que ocorre a cada fim de semana nas pistas. Os profissionais do esporte nesse setor são raros. Isso gera interpretações variadas sobre um mesmo tema com uma frequência maior do que seria aceitável. Dizer que isso gera dissabores e desavenças é destacar o clima de animosidade que existe no esporte de forma mais, ou menos, velada.
Já ouvi de pelo menos um dirigente da alta cúpula da CBA comentários do tipo “vamos colocar um x no capacete dele”, como forma de punir a conduta de um piloto que criava problemas com relativa frequência. Muitos de nós já tivemos professores que agiram da mesma forma conosco ou com com colegas de classe, nenhuma novidade. Mas quando esse mesmo professor exacerbava sua política disciplinadora, as cores desse quadro tornavam-se mais pesadas e menos apreciadas.
No episódio desta semana tanto a autora da reportagem quanto a própria CBA mencionam os pilotos Cacá Bueno, Thiago Camilo e Átila Nunes (sic) como pilotos que poderiam ter sido prejudicados a julgar pelas declarações creditadas ao comissário técnico Clóvis Matsumoto e ao auxiliar Paulo Ygor Dias. Matsumoto, consta da reportagem, classificou a conversa como “uma molecagem” e Dias completou dizendo que o fato ocorreu em “tom de brincadeira”.
Se um comunicado da entidade informa que estes colaboradores estão suspensos durante a investigação que será feita pelo Supremo Tribunal de Justiça Desportiva — algo que seria esperado e deveria ocorrer em esferas políticas mais importantes à sociedade brasileira —, não há qualquer esclarecimento sobre quem seria Átila Nunes. Seria o sorocabano Átila Abreu ou o paulistano Diego Nunes?
Mais, o presidente do Conselho Técnico Desportivo Nacional, Nestor Valduga, admitiu que as decisões dos comissários esportivos têm alguma deficiência “porque são subjetivas”, aquelas tomadas pelos comissários técnicos “é quase uma ciência exata”. Da mesma forma que elogiou o trabalho de Matsumoto ao defini-lo como engenheiro capacitado”, sobre Dias disse que “por ser auxiliar técnico, não tem nenhum poder de indicar irregularidades técnicas”. Seria ele um colaborador dedicado a servir café?…
Por fim, não deixa de ser curioso o jornal Folha de S. Paulo reservar toda a capa de um caderno para falar sobre o tema e sistematicamente ignorar o automobilismo nacional. Uma cobertura mais regular e consistente certamente traria maiores benefícios ao esporte e à sociedade que aprecia uma atividade que já promoveu muito o Brasil no Exterior e gerou muitos empregos dentro do País.
WG