Como autoentusiasta mas também como assalariada, já tive todo tipo de carro. E ainda tive (e tenho) a chance de testar carros que nem sei se um dia terei. Por isso piloto com bastante conforto e com muitíssimo prazer desde o mais basicão até a mais sofisticada nave espacial. E sempre me fascinou a facilidade com a qual nos adaptamos a tudo. É claro que depois de ficar um tempo com um carro legal, mais completo, dirigir um pé-de-boi pode demorar um pouco, mas a gente também se acostuma. Ou como diz o meu primo Mário, “É o que tem para hoje”.
Claro que tudo depende das circunstâncias e da necessidade. Uma coisa é o que se quer comprar e outra, nem sempre coincidente, é o que se pode comprar. E mesmo se dinheiro não fosse empecilho ou limitação, tem a questão da segurança pessoal (vale a pena andar com um carro tão caro?) e da manutenção (posso comprar, OK, mas conseguirei manter, pagar o seguro, as revisões obrigatórias e as peças?).
Ainda assim, algumas engenhocas acabam se tornando cada vez mais úteis. Culpa do trânsito mal organizado, de algumas leis no mínimo tolas e em muitos casos, apenas da falta de cumprimento das normas de trânsito.
Minha mais recente paixão é a luz de objeto no ponto cego. Vivo um caso de amor intenso com esse acessório que durante muito tempo não tive nos meus carros, mas agora sofro quando dirijo um que não conta com isso. É um pontinho que se acende nos espelhos laterais cada vez que um objeto se coloca no ponto cego do carro – sim, porque pelo menos por alguns segundos a maioria dos carros, e principalmente dos espelhos planos comuns, apresentam pontos cegos, infelizmente. Já dirigi carros nos quais a qualidade dos espelhos fazia com que não houvesse um cantinho sequer que não pudesse ser visto pelo motorista, mas o fato é que a maioria dos que saem de fábrica, de linha mesmo, não tem essa facilidade. O pontinho em si não avisa se o objeto em questão é uma bicicleta ou um treminhão, mas só o fato de saber que tem algo que não estou vendo… é como aquele cartão de crédito, não tem preço.
Nos últimos tempos por duas vezes evitei colisões, uma com carro e outra com moto graças à bendita luzinha. E sou uma motorista deveras cuidadosa e obcecada por saber tudo o que está à minha volta. Eu sempre sei quais e quantos carros, motos ou ônibus estão próximos e onde. Como vocês sabem, dirijo a maior parte do tempo em São Paulo, tanto na capital como no interior, onde grassam motos conduzidas de forma absolutamente irresponsável. Tem motoqueiro e motociclista responsável? Sim, claro, mas cada vez menos.
Ultimamente nem os pilotos de possantes duas-rodas de bem mais de 500 centímetros cúbicos, de que tanto gosto, merecem minha admiração. Sempre vi grupos de motociclistas pelas rodovias Castello Branco e Bandeirantes nos finais de semana, mas de uns tempos para cá até eles vêm conduzindo de forma absurda. Não me refiro à velocidade, pois sempre fiquei mais tranquila com um motociclista bem preparado em alta velocidade do que com alguém despreparado ou com uma moto em más condições a 70 km/h. Mas é cada vez mais comum ver esses grupos costurando nas estradas em alta velocidade, tirando fina entre carros e entre eles mesmos e, suprema imbecilidade, sem a menor necessidade, quando há faixas inteiras totalmente livres.
Não sei se os motociclistas que eu admirava estão emprestando seus bólidos a outros despreparados ou se caíram os preços de Ducati, BMW e Triumph. Ou, como diz um amigo meu totalmente incorreto politicamente: “mardito crediário”, sim, assim com “r”mesmo. Sarcasmo puro, pois não tem carnê fácil de pagar com os atuais indicadores econômicos, tá?
Assim, dá-lhe luzinhas o tempo todo. E, claro, sem esquecer das faixas de rolamento que há na metrópole paulistana, com largura que mal dá para uma moto 125 com top case, quanto mais para um carro ainda que de tamanha médio. E com a proliferação das faixas de ônibus em ruas e avenidas que mal comportam trânsito misto, quanto mais segregado, dá-lhe moto na contramão.
As luzes de indicação de obstáculo no ponto cego também se mostraram úteis quando as motos, para desviar das lombadas, passam no vão entre a lombada e o meio-fio. Geralmente o espaço apenas é suficiente para a bitola do pneu, mas eles insistem em passar. E é aí que o motorista de carro tem que redobrar sua atenção, pois qualquer esterçada na direção, por menor que seja, é choque na certa. Quanto mais com aqueles que gostam de atravessar lombadas com o carro de lado. É acidente em questão de segundos.
Outro geringonça com a qual me acostumei rapidamente é o sensor de estacionamento. O lado ruim do sensor de estacionamento numa metrópole com motos costurando entre os carros, faixas de largura risível, é que ele toca o tempo inteiro. Nas marginais acabo desligando o botão pois é impossível aguentar os apitos constantes, de tão perto que as motos passam.
No primeiro carro que tive com esse acessório, ao comprar não fazia a menor questão dele, mas como vinha com outros itens que me interessavam, o aceitei. E hoje estou tão acostumada que no primeiro mês de uso, quando fui dirigir o carro do meu marido que não tinha o sensor, quase o estatelei na parede da garagem, pois ficava esperando o apito. Como sou craque em estacionar, não aconteceu nada, mas o fato é que eu continuava dando ré sem lembrar que não haveria lembrete sonoro. Um tal de Pavlov estudou isso no final dos anos 1800 e começo dos 1900 com cachorros e o chamou de reflexo condicionado. Au, au!
Mudando de assunto: sou uma caminhante inveterada. Adoro andar e o faço com muita frequência, feliz da vida — tenho até minha jornada a Santiago de Compostela, com certificado e tudo, para provar o quanto gosto disso. Mas também adoro as tiras do Calvin e Haroldo e não resisto zoar com os xiitas anticarro. Por isso, meu mudando de assunto desta semana é uma tira de HQ. Lá vai:
NG
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