Eu era jovem, tinha apenas 23 anos, quando resolvi ser piloto de competição nas horas vagas. Eu já trabalhava na Volkswagen do Brasil como promotor de Assistência Técnica organizando campanhas de serviço no campo. Naquela época, 1970, para ser um piloto oficial de competição (POC) tinha-se que fazer ou um curso de pilotagem, ou então participar de 10 provas, sendo que na primeira você se inscrevia como estreante e as nove restantes você era considerado novato.
Depois de adquirida esta experiência você recebia a sua desejada carteirinha de piloto oficial de competição (POC), tendo que obedecer às normas e regulamentos ditados pela Federação de Automobilismo de São Paulo e Confederação Brasileira de Automobilismo.
Depois de ter participado de algumas provas, diga-se de passagem com excelentes resultados, me vi numa situação pelo menos super, hiperssurpresa, para não dizer vergonhosa e indesculpável. Foi na III Uma Hora da Calouros, em 6/09/1970. A foto de abertura mostra 30 carros na grade de largada, um espetáculo!
Meu número de corrida era 27, pois o 7 sempre me sorriu, sozinho ou acompanhado: sou de 27 de julho de 1947…
Larguei na pole position e seguia na nona volta de 10 na liderança da prova com meu VW 1600 Divisão 3. O carro em segundo, do Edson Yoshikuma, estava atrás de mim dois ou três segundos.
Eu descia o retão em Interlagos e a sede e o calor no interior do carro estava insuportável. Lembrei-me que no porta-luvas havia um caixa com chicletes e aí quase perco a corrida e provoco infartos na equipe, principalmente no meu amigo e patrocinador, o ex-piloto Mário César de Camargo Filho, o “Marinho”, conhecido também no meio como “Caipira” por ter crescido em Rancharia (SP), apesar de natural de Ribeirão Claro, PR.
Voltando ao “cockpit” do meu Fusca 1600 Divisão 3, fiz o impensável e absurdo: segurei o volante com as pernas (fazia isso nas ruas, tinha prática), abri o porta-luvas, peguei a caixinha de chicletes e comecei a abri-la. No retão, eu seguida numa situação confortável, liderando e a menos de uma volta da vitória, alguns segundos à frente do segundo colocado e tudo sob controle, inclusive a sede que logo iria acabar.
Eis que, sem perceber, ao segurar o volante com as pernas o pé direito deixou de acionar o acelerador até o fundo. Sem eu perceber, o carro diminuiu a velocidade e vi pelo retrovisor o Yoshikuma se aproximar rapidamente. O susto de perder a posição me valeu uma taquicardia e uma reação imediata: o retão estava acabando e a entrada do miolo estava próxima, assim sendo eu teria a vantagem de estar à frente nas curvas, podendo garantir a minha vitória.
A reta de chegada, a bandeirada quadriculada e à frente do segundo colocado era tudo o que eu queria. Recebia os aplausos da galera, da equipe — menos de alguns membros dela.
Fui recebido no boxe em um ambiente relativamente frio, todos haviam se assustado com a repentina aproximação do meu perseguidor e depois no miolo a distância havia se normalizado. Por quê? Equipe, amigos, patrocinador, todos queriam saber o que havia acontecido.
Muito envergonhado, contei-lhes a verdade, a sede tinha me vencido e um chiclete por pouco me tirou a vitória.
Aprendi e foi muito bom, minha equipe providenciou para a próxima prova uma garrafinha estrategicamente posicionada para que eu pudesse tomar água sem prejuízo do desempenho e o risco de infartos na equipe.
Uma lição para sempre, ainda bem que tudo terminou num final feliz.
Festival de Marcas
No mês seguinte, no dia 26, corri no Festival Marcas, em duas categorias, 10 voltas para carros 1300 Divisão 1 e outras 10 para carros 1600 Divisão 3. Venci ambas, com o 1300 de minha mãe e depois com o meu 1600. Duas num dia foi demais!
Abaixo, fac-símile da revista Placar com matéria na qual fui entrevistado pelo repórter Paulo Mattiussi. Bons tempos!
Até domingo que vem às 10 horas (hoje fora do horário por problemas técnicos)
RB