Dando continuidade à parceria com o amigo Hugo Bueno, vamos seguir na linha da matéria anterior sobre o Fusca Série Bravo e veremos o que aconteceu com outras versões standard, pouco conhecidas ou até desconhecidas. O material publicado aqui foi cuidadosamente garimpado pelo Hugo numa perspicaz pesquisa de muitos anos.
O estudo da história dos veículos fabricados pela Volkswagen no Brasil nem sempre passa pelas publicações de revistas especializadas, em especial quando o estudo se refere a modelos e versões que apareceram no mercado de maneira efêmera. Estes veículos, hoje em dia, podem ser considerados como sendo verdadeiras raridades e poucos exemplares ainda preservam suas características originais.
As fontes de pesquisa neste caso, em regra, são anúncios em periódicos de circulação diária e o cuidadoso estudo dos folhetos de fábrica, que costumavam trazer informações muitas vezes de uma maneira cifrada e incompleta.
Em novembro de 1972, a Volkswagen apresentou oficialmente sua linha de veículos para 1973 e nela incorporou, seguindo uma filosofia baseada em sua experiência na Europa, opções de modelos mais despojados, e consequentemente mais baratos, para as linhas VW 1500, VW TL duas e quatro portas e VW Variant. O interessante é notar que a Volkswagen não deu designações específicas para estas versões mais econômicas.
A existência de versões diferentes para um mesmo modelo não era alardeada pela fábrica de uma maneira clara, ela não chegou a indicar detalhes das versões em suas publicações. Limitou-se a indicar a existência de opções no texto de anúncios de jornal e, às vezes, na tabela de preços publicadas; em poucos catálogos apareceram curtas chamadas para a existência de modelos mais baratos. Veja dois anúncios, um de revista (acima) e outro de jornal (abaixo), destacando a indicação das opções. Para ambos anúncios o texto se repete:
“Começando pelo Fusca 1300, que é o carro de menor preço do Brasil, veja só quanta escolha:
– Dois Fuscões, com duas opções de preço;
– Duas Variant, com duas opções de preço;
– Quatro TL (dois com 2 portas e dois com 4 portas), o que significa quatro opções de preço;
– Três modelos esportivos, com três opções de preço (Karmann-Ghia TC, VW SP1 e VW SP2) ”
Abaixo está o detalhe do anúncio acima mostrando as quatro opções de preço para os TL conforme descrito no texto acima:
Para os Fuscões, Variants e TLs, as alternativas de acabamento, indicadas na tabela de preços do anúncio abaixo, eram chamadas de Opção 1 para os modelos mais baratos e consequentemente mais despojados, e Opção 2 para aqueles que possuíam um acabamento mais completo. No texto da propaganda de lançamento de 6 de dezembro de 1972, publicada no jornal O Globo, é possível perceber que nada é evidenciado sobre as diferenças físicas entre as versões, sendo apenas o preço levado em consideração.
Nos folders institucionais lançados na época, uma pista foi encontrada na segunda página do folder referente à VW 1600 Variant: “Preço – Garantimos que este folheto vai interessá-lo muito, porque ele começa com duas coisas interessantes demais: as duas opções de preço da Variant”. Nas fotos e nas demais imagens, textos e tabelas, nenhuma diferença entre um modelo e outro é citada.
No caso do folder do VW 1600 TL, assim como no da Variant, a única referência a uma segunda versão, também está na segunda página: “Vamos começar por um detalhe que vai interessá-lo muito: o preço. O TL – 2 portas tem duas opções de preço.”. Texto muito parecido com o encontrado no folder da Variant, foco no preço e nenhuma informação sobre as diferenças relacionadas às duas versões.
Essa falta de evidências sobre as diferenças e a falta de uma designação distinta entre as versões mais baratas e as mais caras, dificultou até mesmo a divulgação por parte de revistas especializadas e por outros veículos de mídia impressa. Como já vimos, se a VW não batizou esse modelo, o mercado o fez: os modelos mais baratos passaram a ser conhecidos como “Versão standard”. Na revista Quatro Rodas de dezembro de 1972, na matéria referente ao VIII Salão do Automóvel de São Paulo, foi publicada uma foto da “linha de cintura” de uma Variant na cor amarelo Safari cuja legenda diz: “A versão standard da Variant.”
Como foi dito no início desta matéria, outras mídias impressas como, por exemplo, jornais, que têm mais agilidade devido à frequência diária de publicação e não mensal, como a grande maioria das revistas especializadas, podem trazer informações de grande relevância que acabam se perdendo com o tempo, afinal de contas, quem guarda jornais? Foi o caso desta matéria publicada no jornal O Globo no final de novembro de 1972. O texto, mostra de maneira explícita, todas as características que a VW não informou em seus folders ou propagandas institucionais na época.
A matéria do jornal O Globo, publicada em 24 de novembro de 1972, tinha um título que dizia tudo: “Volks elimina frisos em linha sóbria”, destacando as particularidades das versões standard recém-lançadas pela VW. Para o caso do TL e da Variant, foram eliminados os frisos laterais e os frisos de acabamento nos vidros, que permaneceram no VW 1500 standard, apesar de a matéria informar o contrário. Mais um ponto para confundir os aficionados: não houve uma padronização em relação à utilização dos frisos!
Voltando ao TL e à Variant, o interior possuía estofamento mais simples, no mesmo padrão do VW 1300 e não os bancos com costuras em gomos tal qual o modelo “mais luxuoso”; o painel não era revestido de preto e sim pintado na mesma cor da carroceria, não possuía borrachões nos para-choques e sim uma fita adesiva preta e a característica mais marcante: as lanternas traseiras permaneciam idênticas às utilizadas até 1972, diferentes das lanternas maiores que estreavam com a linha 73. Essa característica, associada às saídas de ar estampadas na coluna “C”, que também estreavam na linha 73 definem de maneira indelével a carroceria standard!
Muitos aficionados pela marca Volkswagen talvez nem conheçam essas versões que tiveram uma vida curtíssima muito provavelmente por não terem agradado ao mercado ao qual se destinavam e, consequentemente, não terem trazido o retorno esperado pela fábrica.
A Variant e o TL standard foram incluídos na tabela de preços da revista Quatro Rodas em janeiro de 1973. O TL fez parte desta tabela até agosto de 1973, porém a Variant permaneceu somente até abril de 1973, desaparecendo da tabela a partir de maio. Apenas quatro meses no mercado! Em função disso, e considerando a cultura da época de ir se equipando aos poucos os modelos mais simples até se parecerem com modelos “de luxo”, bem como a utilização destes modelos mais baratos como táxi — no caso do TL, as versões standard tornaram-se verdadeiras raridades, e como dissemos, muitas vezes desconhecidas até dentro do mundo dos amantes de Volkswagen!
Propaganda da Variant publicada em fevereiro, com o título: “Sensacional flagrante mostrando a Variant sendo usada para outros fins”, que ressaltava a existência de duas versões de preço com a frase: “Agora, quando v. comprar a sua Variant — que vem com duas opções de preço — descubra uma nova profissão para ela e comunique-nos, enviando uma foto.”. A medida que o tempo passava, a informação sobre as duas opções de preço ia diminuindo.
Nesta propaganda, de março de 1973, com o título: “Olha a placa da Variant na praia linda de Santa Catarina”, o chamamento para a existência de duas opções foi feito com a frase: “E v. tem dois modelos de Variant – com opções de preço – para ajudá-lo a escolher mais facilmente. ”
Nestes dois exemplos, se confirma que a ênfase foi dada à diferença de preço, mas não houve qualquer dica sobre as diferenças físicas entre os modelos de cada opção de preço.
Estas propagandas foram publicadas em abril e julho de 1973. Nos textos tanto na propaganda do TL, com o título: “Na hora de trocar o certo… …troque por esta certeza maior”, como na propaganda da Variant, com o título: “Para chegar feliz ao fim de uma longa viagem, nada melhor do que um bom começo”, já não é feita nenhuma referência às duas opções de preço.
Um VW TL “Opção 1” flagrado em plena ação, neste caso como “carro de praça” no Rio de Janeiro em 1975. Pela traseira é possível identificar as lanternas pequenas associadas às saídas de ar na coluna “C”. O para-choque, em vez de “borrachão”, possui uma fita adesiva preta.
Algumas fotos das versões ora em estudo
A primeira análise será a comparação entre o VW 1600 Variant 1972 amarelo Safari, época que não havia duas versões, portanto era a versão única, com uma Variant 1973 “Opção 2” ou seja a versão completa, luxo, verde Hippie/interior preto
Comparando-se o modelo 1972 da Variant com a versão 1973 “Opção 2”, vemos que a maior parte das mudanças se concentrou na parte traseira, onde as lanternas ficaram maiores e foram feitas aberturas para a saída de ar na coluna “C”. Os vidros laterais traseiros perderam o quebra-vento que auxiliava a ventilação interna. No interior, o painel passou a ser revestido de preto ao invés do padrão imitando jacarandá. Para muitos aficionados essa mudança, especificamente, foi um retrocesso em relação ao modelo anterior, pois a aparência de madeira trazia um ar de sofisticação ao interior. Mudaram também os apoios de braço das portas, mas o padrão do revestimento foi mantido, assim como os bancos com costura em formato de gomos.
No caso da Variant “Opção 1” ano 1973, ou seja, a versão standard mais simples, as diferenças são consideráveis em relação ao modelo “Opção 2”, de luxo, um exemplar vermelho Montana com interior areia. Foram retirados os frisos dos vidros (dianteiro, laterais e traseiro) e da carroceria na altura da linha de cintura, dando uma aparência mais despojada. Na traseira é possível ver que as lanternas pequenas utilizadas até 1972 foram mantidas e foram incluídas as aberturas para a saída de ar na coluna “C”, típicas da linha 1973.
Essa característica, lanternas pequenas com as saídas de ar na coluna, é uma marca indelével do modelo standard. Os para-choques perderam os borrachões, substituídos por uma fita preta, e o interior foi bastante simplificado. Os bancos e forrações laterais possuíam o mesmo padrão utilizado no Fusca 1300, inclusive os puxadores de porta, completamente diferentes dos modelos 1972 e “Opção 2” 1973 da Variant. O painel era pintado na cor do carro e não possuía o nicho específico para acomodar o rádio.
Mesmo sendo um modelo considerado standard, havia a opção de cores diferentes para o estofamento, combinando com a cor da carroceria, que no caso do veículo das fotos o estofamento areia combina com a carroceria vermelho Montana, código L-30BR. Muitos aficionados pela linha VW, ao se depararem com uma Variant “Opção 1”, em um primeiro momento podem pensar que se trata de uma restauração malfeita, já que nada é como deveria ser, mas mal sabem eles que na verdade estão diante do que popularmente pode ser considerada uma verdadeira “mosca branca”!
No caso deste VW 1600 TL modelo 1973, cor amarelo Safari, código L-1363, tudo leva a crer que se trata de um TL “Opção 1” que foi sendo equipado ao longo de sua vida o que, como já foi dito aqui, poderia ser feito inclusive nas concessionárias VW. Duas características marcantes desta série estão presentes neste veículo: lanternas traseiras pequenas junto com as saídas de ar na coluna “C” e o painel pintado na mesma cor da carroceria. Aparentemente foram instalados externamente frisos laterais e nos vidros, além de borrachões nos para-choques, que no caso deste exemplar, o borrachão dianteiro é inteiriço, diferente do modelo original bipartido.
No caso do interior, é possível verificar que foi refeito na tentativa de seguir o padrão com costura em gomos, porém apresenta diferenças em relação ao original o que comprova que foi instalado posteriormente. Além disso, foi colocado no painel um nicho para instalação do rádio, tal como era utilizado até o modelo 1972, com a forração imitando jacarandá. O TL “Opção 1” pode ser considerado extremamente raro, pois como foi mostrado acima, em função de ser mais barato, foi muito utilizado como táxi, tornando o veículo das fotos uma verdadeira “mosca branca de olhos azuis”, como diz a sabedoria popular!
Uma das dificuldades que se encontra numa pesquisa destas é obter material fotográfico com exemplos destas raridades que tiveram um período de fabricação curto. Sendo assim fica aí a chamada a todos que toparem com estes carros que nos mandem fotos com o maior número possível de dados, ano do carro, onde a foto foi feita, algum comentário que ajude a levantar a história do carro em questão.
AG