Não deixa de ser curioso que as três fábricas de carros de luxo da Alemanha confirmaram em questão de meses a decisão de participar oficialmente da Fórmula E, a categoria de carros elétricos. Em 7 de julho a Audi abriu a porteira, quatro dias depois foi a BMW e ontem foi a vez da Mercedes; todas elas estarão se enfrentando na temporada 6 — a ser disputada nos anos 2019/2020 — de um campeonato ainda jovem, mas adulto o suficiente para atrair a atenção de grandes fabricantes. Quem conseguiu essa proeza é o madrilenho Alejandro Agag, ex-menino prodígio da política europeia e responsável por tirar o Queens Park Rangers das divisões inferiores do futebol inglês e consolidar sua presença na Premier League.
Esse empresário que dia 18 de setembro completa 48 anos já foi chefe de gabinete político do presidente espanhol José Maria Aznar, quando tinha 25 anos. Três anos após essa experiência, Agag se candidatou pela segunda vez a um cargo na Parlamento Europeu e em 1999 tornou-se seu membro mais jovem. Assim não é surpresa que das 10 equipes inscritas no campeonato da F-E sete estão diretamente ligadas a fabricantes tradicionais ou em ascensão no mercado internacional.
Desde sua primeira temporada a F-E segue um modelo alternativo que vai muito além de simplesmente usar carros elétricos. O calendário, por exemplo, transcende o modelo tradicional: a primeira etapa geralmente ocorre em outubro e a última em julho/agosto. Durante as corridas cada piloto precisa trocar de carro durante as corridas, consequência da limitação de carga das baterias, mas em breve isso será desnecessário. Dessa lista extensa destaca-se ainda a não utilização de circuitos tradicionais: a maioria absoluta das provas é disputada em traçados de ruas de grandes cidades; quando a categoria se apresentou em Monte Carlo o fez numa versão mais curta do traçado empregado no GP de Mônaco. Exceções são as etapas disputadas em aeroportos, com o de Berlim, usado este ano.
Em sua quarta temporada, a F-E já fez a primeira vítima no universo do automobilismo tradicional, o sofisticado DTM. Ao anunciar sua estreia na categoria na temporada 6 (2019/2020) a Mercedes informou que deixa o Deutsche Tourenwagen Masters (Copa Alemã de Carros de Turismo em tradução livre), decisão que enfraquecerá o torneio ainda mais. Alta tecnologia e materiais sofisticados formaram uma combinação que, pouco a pouco, decreta o fim de um ciclo de muito sucesso da série que foi por muito tempo a mais importante do automobilismo mundial para carros de turismo. Este ano a BMW está com um programa reduzido e suspendeu o desenvolvimento dos seus carros: seu melhor representante no campeonato, o belga Maxime Martin, soma 78 pontos, contra 113 do líder Matthias Ekström (Audi).
Coincidência ou não, a BMW se prepara para estrear na categoria na temporada 5 (2018/2019), associada à equipe Andretti Autosport; seus carros vão usar um trem de força inédito, projetado pelos alemães de Munique. Na mesma edição a Audi estreará oficialmente, após ter incorporado a ABT-Schaeffler, onde corre o brasileiro Lucas Di Grassi. Nessa luta devem ser incluídas ações como a Jaguar — que contratou a expertise da equipe Williams para montar sua equipe — e outras empresas voltadas à mobilidade elétrica, caso das equipes Next EV (do brasileiro Nelsinho Piquet), fabricante do esportivo que bateu o recorde Nürburgring para carros elétricos, a Faraday Future (start up focada em veículos elétricos inteligentes) e Venturi, construtora de carros elétricos baseada em Mônaco.
O início da F-E foi mais modesto: a proposta de usar carros não poluentes atraiu de imediato a atenção da Renault (que se associou à equipe Dams para formar o e-Dams), e do grupo indiano Mahindra, que já comercializou utilitários no Brasil e tem uma marca voltada ao setor elétrico, a Reva. Na segunda temporada a Citroën posicionou a grife DS à junto à operação inicialmente bancada pela Virgin, outra empresa que explora tecnologias avançada para fixar sua imagem corporativa. o grupo China Media Capital, voltado para investimentos, fusões e aquisições, garantiu a presença chinesa ao comprar a equipe do japonês Aguri Suzuki e rebatizá-la de Cheetah.
Com circuitos montados no centro das principais cidades do mundo, a F-E pouco a pouco ganha importância mercadológica nos segmentos de entretenimento, mobilidade e tecnologia. Ponto para Alexandre Agag, madrilenho que circula com desenvoltura entre os grandes líderes europeus. Um jornal de economia da Espanha já classificou que o chip do seu celular é algo que não tem preço, tamanha sua rede de contatos com poder de decisão sobre investimentos, políticas e estratégias.
WG