Esse é o título da matéria que li no início dos anos 1960 numa revista Quattroruote, “A maldita neblina” na língua de Dante. Põe maldita nisso, é a pior condição de tempo para se dirigir, pior do que a mais torrencial das chuvas, até mesmo do que neve e gelo. A explicação é simples e intuitiva: 98% da condução, na questão dos sentidos, depende da visão. Os demais — audição, tato e olfato — têm papel pequeno, tanto que surdos podem dirigir; o paladar não conta.
Neblina e nevoeiro são o mesmo fenômeno meteorológico — gotículas d’água em suspensão no ar — e se diferenciam apenas pela visibilidade. Neblina é quando o alcance visual é superior a 1 quilômetro, nevoeiro quando menos.
Antes de prosseguir, um conselho, ou uma advertência: JAMAIS PARE O CARRO EM MEIO AO NEVOEIRO!
Dirigir nessas condições requer cuidados especiais e bom senso. A citada pequena participação da audição é maior ao dirigir na neblina. Todo e qualquer barulho precisa ser levado em conta, especialmente o dos veículos pesados à retaguarda ou próximos. Por isso convém deixar o equipamento de áudio desligado e abrir ligeiramente a janelas dianteiras — dois ou três dedos — uma vez que os carros são cada vez mais silenciosos a bordo.
A pior neblina é a diurna. Faróis e luzes não têm tanta dispersão como à noite e os demais veículos ficam bem menos visíveis. Pior ainda quando motoristas sem noção dirigem com luzes e faróis desligados “por não ser noite” (nesse ponto a atual obrigatoriedade de farol baixo de dia nas rodovias joga a favor).
Outra causa de supressão de visibilidade é fumaça, um problema sério no Brasil devido às pessoas terem uma grande e inexplicável atração para fazer “foguinho”. Como se queima de tudo aqui, é impressionante. Foi a fumaça de uma queimada que contribuiu para um monstruoso engavetamento na rodovia SP-70 Carvalho Pinto no dia 30 último envolvendo 34 veículos leves e dois caminhões, que resultou em duas mortes e mais de 20 feridos; era dia, por volta de 7h40.
Quando se depara com uma zona tomada pela fumaça o melhor é não entrar nela de pronto. Parar no acostamento e analisar a situação é o melhor a fazer. Em geral essa fumaça não é constante e não dura muito, mas bloqueia totalmente a visibilidade.
Na neblina, estando a visibilidade prejudicada por ela, vidros precisam estar na condição ideal de transparência externa e interna. Embora não se trate de chuva, as gotículas vão se acumulando no vidro do para-brisa sem que se perceba, daí ser necessário acionar o limpador com certa frequência, e para isso o acionamento uma-varrida é bastante útil. Em muitos carros o comando para uma-varrida — um toque na alavanca do limpador para baixo ou para cima, depende do carro — é indicado como mist, nevoeiro em inglês.
Quanto ao lado de dentro, ar úmido favorece o embaçamento, sendo aconselhável, pela eficácia inerente de desumidificar o ar, ligar o ar-condicionado de tempos em tempos caso não esteja sendo usado.
Na questão visibilidade, acho que nem preciso falar dos sacos de lixo. Mesmo que aplicados somente nas janelas dianteiras, a alternância janela com película/para-brisa sem deixa as pupilas indecisas, a visão não fica a ideal. Nessas condições difíceis deve-se contar sempre com melhor visão possível.
À noite a neblina é mais fácil de enfrentar, mas os faróis precisam estar perfeitamente ajustados, inclusive os de neblina, se houver. Isso porque as gotículas no ar refletem a luz dos faróis, e quanto maior for o reflexo, pior.
É nessa situação que os faróis de neblina mostram seu valor, seu foco é bem aberto, espalhado, combinado com uma linha de corte baixa. Eles permitem ver com bastante precisão as linha branca de borda da faixa de rolamento, proporcionando posicionamento ideal nela, combinado com menor reflexo das gotículas. Se preferir, desligue o farol baixo para reduzir o reflexo.
Lembro-me de quando trabalhava na Fiat e andava de 147, que não tinha farol de neblina, e ao encontrar nevoeiro parar o carro, abrir o capô e baixaro facho do farol baixo pelo regulador instantâneo existente para o caso de veículo totalmente carregado. Era perfeito. Esse singelo mecanismo tem nos Fiat até hoje.
Desnecessário recomendar por ser intuitivo, lembrar de ligar a luz traseira de neblina se o carro a tiver. Aliás, há tempo deveria ser equipamento obrigatório em todos os carros; é lamentável tal erro por parte do Contran.
Velocidade
Quem pratica o off-road sabe que a inimiga do carro e da segurança é a velocidade. Pois na neblina é igual, esqueça qualquer pressa que eventualmente tenha. A regra é usar velocidade que permita parar se qualquer obstáculo à frente for detectado.
Esse cálculo é difícil, mas imagine-se no trânsito da cidade. Tem-se ideia da distância para o carro da frente que permita parar caso ele pare de repente, certo? A regra de contar mentalmente dois segundos (mil-e-um, mil-e-dois) é eficaz para isso, portanto mantenha dois segundos de “distância” do ponto da estrada que se enxerga dentro da neblina. Saiba que a 30 km/h anda-se 8,3 metros por segundo — por aí vê-se que na neblina há que se rodar d-e-v-a-g-a-r. Como em geral a neblina deixa a pista úmida, contar 3 segundos em vez 2 é uma boa providência, aumenta a distância de eventual obstáculo.
Querer trafegar em velocidade maior é um verdadeiro voo cego, é a chave para o acidente.
“Ai camionisti fa meno paura”
O grande perigo ao dirigir na neblina são os caminhões. A frase acima estava num boxe da matéria de Quattroruote citada. “Aos caminhoneiros dá menos medo”, e a razão é em simples. Como sua posição de dirigir é bem elevada em comparação com a de um automóvel, a linha de visão deles forma um ângulo considerável com a do facho dos faróis, o que virtualmente impede o reflexo das gotículas e lhes permite andar mais rápido do que os carros — é aí onde mora o perigo. Caminhões costumam andar mais rápido que os carros.
Note que nos automóveis os faróis de neblina são montados o mais baixo possível, justamente para prover esse ângulo entre linha de visão e facho desses faróis.
Esse é um problema de difícil solução. Uma seria proibir o tráfego de caminhões quando há neblina, mas é inexequível, fora que é comum ela ocorrer em determinados pontos da rodovia apenas.
Uma solução seria forte e massiva campanha junto aos caminhoneiros a respeito dessa questão. Outra, o Contran obrigar em prazo bem curto a indústria a adotar a luz traseira de neblina. Também, quem não a tiver no seu carro, mandar instalar uma tipo acessório; e quem preferir manter o carro sem essa importante luz, que tenha noção do perigo que é dirigir sob neblina e se abstenha de trafegar nessas condições.
BS