Mercedes, Ferrari e Red Bull devem dominar. Renault, Toro Rosso e Haas podem brilhar, McLaren tenta renascer
O status quo das 10 equipes inscritas no Campeonato Mundial de F-1 que começa domingo, em Melbourne, pode ser analisado em três grupos de concorrentes a julgar pelo que se viu nos testes de Barcelona e pelo que se sabe da situação interna de cada um. A alemã Mercedes, a italiana Ferrari e a austro-inglesa Red Bull deverão alinhar seus carros nas primeiras posições do grid do GP da Austrália. Considerado o formato de definição para a largada, Renault, Toro Rosso e Haas têm tudo para disputar as quatro posições restantes do Q3, sessão que define as cinco primeiras filas de largada. Para McLaren, Williams, Force India e Sauber a estratégia comum será o já batido jargão usado por quem larga lá atrás, em outras palavras “fazer uma corrida de recuperação”.
Os pontos fortes da Mercedes são identificados no piloto Lewis Hamilton, no motor considerado o mais potente e confiável da categoria e na irrepreensível organização tedesca capaz de prever e se preparar para qualquer situação. Talvez a demonstração mais efetiva doa capacidade deste grupo é um fato extrapista: a Mercedes consegue ter lucro financeiro com seu programa de F-1 em proporções que nenhum analista de mercado poria defeito, reflexo direto dos resultados na pista e na sofisticação do seu planejamento técnico e econômico.
Organização, isto é sabido, nunca foi o forte da Ferrari, o nome mais forte da F-1 e o que tem o maior apelo junto às massas. O intangível do nome sempre associado a um vermelho vibrante e ao famoso “cavallino rampante” que adorna o brasão de fundo amarelo Modena, porém, não é suficiente para garantir vitórias, muito menos títulos: Felipe Massa e Rubens Barrichello são vítimas recentes de estratégias equivocadas e até mesmo erros crassos num passado recente. Em meio às negociações do grupo FCA com investidores chineses e à crescente transformação da marca de construtor de nicho a fabricante de milhares de carros por ano, a pressão sobre os comandados de Maurizio Arrivabene e Mattia Binotto será maior do que nunca, sem deixar de lado a renegociação do contrato privilegiado que a Scuderia tem com a F-1 e lhe garante o maior quinhão de prêmios e bônus da categoria .
Transformação é outra característica aplicável à Red Bull: o time liderado por Adrian Newey e Christian Horner aumenta gradativamente sua associação com a Aston Martin. Esse processo inclui a construção de um superesportivo para disputar o mercado de alto luxo com marcas como a própria Ferrari, Lamborghini e McLaren. Mais, com a mudança de motores prevista para entrar em vigor em 2021, a organização bancada pelo magnata dos energéticos Dietrich Mateschitz caminha para se transformar numa provedora de motores em conjunto com a própria Aston Martin. Essa aliança pode resultar em uma fusão pura e simples entre as duas marcas, motivo mais do que suficiente para justificar a necessidade de se impor frente a nomes fortes como Mercedes e Ferrari.
A Renault já mostrou várias vezes sua capacidade em desenvolver tendências que dominaram a categoria; entre outras invenções recorde-se da tecnologia turbo e das válvulas de acionamento pneumático. Embora tenha vencido dois campeonatos mundiais de construtores, em 2005 e 2006, com Fernando Alonso, a fama de seus motores turbo e atmosféricos nas décadas de 1970 a 2000 se destacam através de mais de 160 vitórias. A casa francesa inicia sua segunda temporada de retorno ao cenário de construtores e já mostra progressos e, tal qual Toro Rosso e Haas, um ou outro lugar no pódio, não necessariamente no degrau mais alto, é o que se pode esperar para 2018.
A americana Haas surpreendeu nos treinos de Barcelona e deixou alguma inquietude na cabeça de quem ainda considera o empreendimento de Gene Haas como uma aventura ainda por maturar. O arrojo dos seus pilotos, porém, é um obstáculo maior a ser superado do que a consolidação do potencial sugerido em Barcelona. A conferir se Romain Grosjean deixará de reclamar do carro e se Kevin Magnussen finalmente entenderá que para terminar em primeiro é importante primeiro terminar.
É difícil não enxergar a Toro Rosso como um misto de laboratório e, para usar um termo de moda, “academia” da irmã mais velha Red Bull. Em uma decisão tão arriscada para seu futuro quanto lógica para os interesses da categoria, o time baseado em Faenza cedeu às pressões e acabou por trocar os motores Renault de seus carros pelos Honda envolvidos em três anos de desastrosos resultados com a McLaren. O resultado dessa troca foi espetacularmente melhor do que todos esperavam e poderá ser coroado com resultados regulares entre os dez primeiros. Realizador dessa proeza deverá ser o francês Pierre Gasly, que apesar de novato é um piloto rápido e conhecedor dos métodos de trabalho dos japoneses.
Depois de duas temporadas onde se classificou em quarto lugar entre os construtores, a Force India parece viver um período de inferno astral: seu líder maior, o empresário Vijay Mallia, não pode sair da Inglaterra sob risco de ser deportado para a Índia e só se mantém livre graças ao pagamento de milionárias fianças. A equipe de F-1 está entre as últimas joias de uma coroa que já teve uma das maiores empresas aéreas indianas, a Kingfischer, e hoje representa um capital com potencial para sanar boa parte de seus débitos. O que se nota, porém, é que o orçamento cada vez mais restrito poderá pôr a perder essa “commodity” para desespero do franco-catalão Estebán Ocón, estrela em ascensão.
A suíça Sauber tenta decolar novamente com a ajuda de um grande fabricante: depois de Mercedes e BMW agora é a vez da Alfa Romeo investir em patrocínio e tecnologia nos carros fabricados em Hinwill. No entanto, ainda não fizeram efeito a vantagem de utilizar os motores Ferrari de última geração nem a expertise do francês Frédéric Vasseur, ex-Renault: nada disso conseguiu reverter o quadro das duas últimas temporadas, ambas marcadas pela presença constante entre os carros mais lentos.
Um misto de preocupações financeiras e reorganização interna decorrente do estado de saúde de Frank Williams transformou uma equipe que já dominou a categoria em mera coadjuvante. Pilotos inexperientes, um carro que já mostrou desempenho limitado e a cultura de usar ferramentas que sacrificam a funcionalidade e valorizam a economia são os empecilhos que ditarão as chances dos seus jovens e inexperientes pilotos titulares.
Se a Williams decaiu, o que dizer da McLaren, que em 1988 venceu 15 das 16 provas da temporada? Quando contavam-se nos dedos da mão esquerda com unha encravada os que ousavam questionar que o fracasso da McLaren de 2015/16/17 era culpa exclusiva do motor Honda, eis que o time de Woking não correspondeu ao que se esperava de seu projeto com motor Renault. Pior, o fato de só marcar tempos minimamente representativos com os pneus mais macios disponíveis nos testes de pré-temporada e seu novo carro ter deixado dúvidas sobre sua confiabilidade e desempenho deixam o time comandado por Zak Brown como a grande interrogação deste início de temporada.
Amanhã a terceira análise de uma série de quatro sobre a temporada de F-1: os carros de 2018.
WG