O que a fábrica de motos indiana Royal Enfield anda fazendo é algo único e digno de aplausos dos amantes de motocicletas: ela conseguiu atravessar gerações fabricando, com um mínimo de alterações, a mesma moto. Ela é para as motos o que a inglesa Morgan é para os esportivos.
E, por favor, sem essa de que os indianos não entendem de moto ou carro. Primeiro que hoje a Índia é o maior fabricante de motos do mundo, e, segundo, que a Jaguar Land Rover — hoje pertencente ao grupo Tata Motors, da Índia, grupo familiar liderado pelo indiano Ratan Tata — nunca esteve tão bem, nunca os Jaguar e os Land Rover, que continuam sendo produzidos no Reino Unido, foram tão bons.
Os Jaguar, depois de passarem 18 anos nas mãos da Ford, período esse em que sofreram descaracterização, voltaram a “ser ingleses” quando a fábrica passou para os indianos em 2008. A Land Rover também era da Ford, mas desde 2000 e, como a Jaguar, foi vendida para a Tata Motors, naquele mesmo ano. Hoje a Royal Enfield é uma subsidiária da indiana Eicher Motors Limited.
O caso da Royal Enfield é diferente e sui-generis. Na década de 1950 a empresa indiana Madras Motors passou a montá-la sob licença e após poucos anos, ainda naquela década, essa empresa comprou o ferramental completo para fabricá-la, e continuaram por décadas a fabricar, sem inovações, a mesma moto. Era uma 350-cm³. Com isso, sem inovar, eles puderam manter preço baixo.
Moto robusta e econômica, aguentava o tranco. Serviu para carregar família numerosa inteira, foi utilizada para levar galinhas amarradas aos tuchos pelos pés, transportar cimento, saco de trigo, cruzar o Himalaia com os fanáticos de lá, etc. Com mecânica simples, qualquer mecânico — com uma chave de fenda e alicate — a desmontava e montava de fio a pavio.
E assim a Royal Enfield sempre vendeu bem, mas praticamente não era exportada. Fora da Índia ninguém ligava para ela, pois era considerada obsoleta. E o isqueiro Zippo. lançado em 1932, é obsoleto?
Até que ela começou a virar “cult”, “cool”, entre os europeus e americanos. Estes começaram a importá-la e a demanda cresceu muito. A RE não dormiu no ponto e tratou de fazer as melhorias necessárias para atender essa nova clientela: novo motor de 500 cm³ (lá na Índia ainda também fabricam a 350), partida elétrica, freios a disco, ABS, alimentação por injeção, novas pinturas valorizando seu estilo clássico. E deu certo. Tiveram que construir nova fábrica para atender a demanda.
Daí lhes veio a boa ideia de fabricar uma café racer, e fizeram uma das motos mais bonitas já feitas, esta do teste.
Café racer foi o nome dado na década de 1950 às motos adaptadas para os rachas que os amantes da velocidade ingleses faziam entre um café e outro. Reuniam-se num café — casaco de couro, topete brilhante de brilhantina, calças jeans, capacete ou não e lá combinavam o racha. Guidão baixo, banco único, alívio de peso, escapamento direto, motor mexido. São as precursoras das atuais speed, portanto. Norton, Triumph, BSA, Vincent, BMW, Gilera, tanto fazia, contanto que fosse rápida, e isso é uma das coisas legais desse espírito, nada de clubinho chato de uma marca só. Moto é moto.
Então, há poucos anos, a RE, inteligentemente, procurou os sobreviventes dessas loucuras de mais de meio século atrás e os contratou para assessorá-la na fabricação de uma legítima café racer que mesmo com as modernizações necessárias — uma delas é o câmbio no pé esquerdo e não no direito, como eram as inglesas da época — passasse ao piloto as mesmas sensações de pilotagem daquelas lendárias motos, e que fosse tão linda quanto. Foi com alegria que esses velhos guerreiros entraram nessa nova batalha. Foram respeitosamente escutados, pois é dos indianos respeitar a experiência dos mais velhos, e o resultado foi na mosca. Fizeram. Parabéns!
O leitor ou leitora me permite que eu de novo chame a Continental GT de linda? Obrigado. Pois então, ela é linda.
Linda e gostosa. Tem tudo no lugar certo para uma tocada esportiva e se encaixa na gente como se lesse nossos pensamentos, tal qual uma mulher que a gente tira para dançar e mal a sentimos nas mãos e braços, pois ela, antes da gente, já sabia o que pretendíamos fazer e já foi para lá. Uma moto leve para tocar. Pesa 184 kg, mas é peso lá embaixo, então ela é ágil e esse peso ajuda a mantê-la estável e consistente na estrada. O motor monocilndro foi aumentado para 535 cm³ e com isso ela ganhou 2.9 cv e 0,3 m·kgf sobre a Classic 500. Entrega 29,5 cv a 5.100 rpm e 4,5 m·kgf a 4.000 rpm. Motor de baixo giro com bastante potência em baixa.
Como era esperado, não se nota muita diferença de potência entre ela a sua irmã Classic 500. A diferença está na ciclística. Não tem uma arrancada estonteante como as modernas, não é tão ágil, não tem velocidade final como as modernas speed, não é tão isso nem aquilo, mas é gostosa como ela só. Você, entrando no clima, entrando na dela, fazendo as coisas do jeito que ela recomenda, gama, e passa a precisar de seus favores.
Freia muito bem. Os freios a disco são Brembo, tanto na dianteira quanto na traseira, e com ABS não desligável; amortecedores traseiros a gás, da Paioli, molas com pré-carga reguláveis. Suspensão com 110 mm de curso na dianteira e 80 mm na traseira. Ciclística ótima. O quadro é novo, específico da Continental GT. Estimo que faça o zero a 100 km/h entre 8 e 9 segundos. Viaja tranquila em velocidade de cruzeiro de 110 a 120 km/h reais, neste caso com o motor a 4.400 rpm.
Na estrada, o vento no peito nos empurra um pouco para trás e isso faz com que não se apoie o peso no guidão, daí que ela não é cansativa. O consumo está ao redor de 30 km/l. Não tem computador de bordo, e nem precisa, mas conta com hodômetro total/parcial e nível do tanque de combustível. Não peguei estrada à noite, portanto não posso opinar se o farol é bom ou não.
O motor, arrefecido a ar, tem potência específica baixa para os padrões das motos atuais. São só 55 cv/l, quando hoje é comum que ronde 100 cv/l, mas, tudo bem, os 29,5 cv já são suficientes para que ela acelere junto com uma Honda XRE 300 e viaje melhor. O torque alto, de 4,5 m·kgf, disponibiliza potência em baixo giro e lhe dá uma pegada forte, consistente desde baixa. Não nos esquenta as pernas, nem em trânsito pesado, ao menos nada que incomode.
Porém algumas coisas precisam receber maior atenção da fabricante. A luz de neutro deveria ser mais forte, de dia é difícil notá-la. Os comandos junto aos manetes, onde vão os comandos de pisca, faróis, corta-motor, etc, são um pouco toscos e “modernosos”, e não combinam com o restante da moto. Os retrovisores idem, deveriam ser cromados. Já os pneus são bons. Na Classic 500 que testei anteriormente vinham bons Metzeler. Nesta, bons Pirelli.
Preço: R$ 23.000. Cores, vermelha, verde e preta, sendo que qualquer delas lhe cai bem.
AK
Assista ao vídeo:
FICHA TÉCNICA DA ROYAL ENFIELD CONTINENTAL GT | |
MOTOR | |
Tipo | Ignição por centelha, 4 tempos, arrefecido a ar, gasolina |
Instalação | Transversal |
N° de cilindros/posição | 1/vertical |
Diâmetro x curso (mm) | 87 x 90 |
Cilindrada (cm³) | 535 |
Taxa de compressão (:1) | 8,5 |
Potência máxima (cv/rpm) | 29,5/5.100 |
Torque máximo (m·kgf/rpm) | 4,5/4.000 |
N° de válvulas por cilindro | 2 |
N° de comandos de válvulas /localização | 1/bloco |
Formação de mistura | Injeção eletrônica Keihin no duto |
SISTEMA ELÉTRICO | |
Tensão (V) | 12 |
Bateria, capacidade (A·h) | 14 |
Ignição | Eletrônica digital |
TRANSMISSÃO | |
Embreagem | Multidisco em banho de óleo |
Câmbio/padrão de engate | 5 marchas/1-N-2-3-4-5 |
Relações das marchas (:1) | 1ª 3,063; 2ª 2,013; 3ª 1,522; 4ª 1,212; 5ª 1,000 |
Relação primária/secundária (:1) | 2,15/2,00 |
Transmissão à roda | Corrente |
FREIOS | |
Dianteiro/Ø mm/fornecedor | Disco flutuante/300, pinça de 2 pistões/Brembo |
Traseiro/Ø mm/fornecedor | Disco,/240/Brembo, pinça flutuante, 1 pistão |
Controle | ABS |
SUSPENSÃO | |
Dianteira | Telescópico, garfo de 41 mm, curso de 110 mm |
Traseira | Braço oscilante duplo, amortecedores da Paioli a gás, ajuste de pré-carga das molas, curso de 80 mm |
RODAS E PNEUS | |
Tipo de rodas | Raiadas |
Pneu dianteiro | 100/90-18, 56 H Pirelli Sport Demon |
Pneu traseiro | 130/70-18, 63 H Pirelli Sport Demon |
QUADRO | |
Tipo | Berço duplo tubular |
INSTRUMENTOS | |
Descrição | Velocímetro, conta-giros, hodômetro (2), medidor de combustível |
PESO | |
Em ordem de marcha (kg) | 184 |
DIMENSÕES EXTERNAS (mm) | |
Comprimento | 2.060 |
Largura sem espelhos | 760 |
Altura | 1.070 |
Distância entre eixos | 1.360 |
Distância mínima do solo | 140 |
Altura da sela | 800 |
CAPACIDADES (L) | |
Tanque de combustível | 13,5 |
DESEMPENHO | |
Velocidade máxima (km/h) | 145 |
CONSUMO DE COMBUSTÍVEL (FABRICANTE) | |
Cidade (km/l) | 20 |
Estrada (km/l) | 30 |
CÁLCULOS DE CÂMBIO | |
v/1000 em 5ª (km/h) | 27,2 |
Rotação a 120 km/h em 5ª (rpm) | 4.400 |
Rotação à vel. máxima em 5ª (rpm) | 5.330 |
Alcance nas marchas a 5.500 rpm (km/h) | 1ª 49; 2ª 74; 3ª 98; 4ª 123; 5ª 145 |