Impossível não analisar o recente GP do Bahrein (foto acima) sem enxergar que o futuro da F-1 já não é tão desconhecido assim, cortesia de Charles Leclerc, Lando Norris e Alex Albon, para citar apenas uma categoria de profissionais. Sem esquecer que estamos apenas na segunda etapa de uma série de 21 corridas, nota-se que a McLaren mostra potencial para renascer das cinzas após anos marcados por resultados decepcionantes e alguns nomes consagrados deixam claro que estão usando o cheque especial no que diz respeito ao que venderam e ao que andam entregando.
Historicamente a F-1 inicia novos ciclos, ora com o domínio de uma equipe, determinada tecnologia ou com o surgimento de pilotos de ponta, como aconteceu nos anos 1980. Naquela época havia uma safra de novos valores que garantiu por bom tempo a diversidade de equipes disputando a vitória; a clássica foto de Ayrton Senna com o macacão da Lotus, Alain Prost com o da McLaren e Nélson Piquet e Nigel Mansell com as cores da Williams, sentados no muro dos boxes do autódromo de Estoril, ilustra bem esse capítulo da história. Gradativamente eles foram substituídos por Fernando Alonso, Michael Schumacher, Mika Häkkinen e, mais recentemente, por Lewis Hamilton e Sebastian Vettel, mas jamais viu-se uma constelação tão grande e variada quanto naqueles dias.
É verdade que vários pilotos tentaram, mas não deixaram marcas tão fortes quanto Mansell, Piquet, Prost e Senna. Nem mesmo campeões como Kimi Räikkönen e Jenson Button consolidaram seus títulos com a grife de seres fora de série: foram, isto sim, eficientes à sua maneira. Button sequer é mencionado como um dos “top ten” apesar das seis vitórias em 17 etapas de 2009 e 15 nas 247 largadas que contabilizou em sua carreira; nomes como Juan Pablo Montoya vencedor de sete GPs entre as temporadas de 2001 a 2005 deixaram muito mais saudades.
Comunidade que concentra a maior parte do negócio Fórmula 1, a Grã-Bretanha tende a favorecer seus filhos, e não são poucos, os casos de promessas que tiveram grandes chances e nunca vingaram. Se você pensou nos escoceses David Coulthard e Paul Di Resta, nos ingleses Derek Warwick, Mark Blundell e Martin Brundle, até mesmo no irlandês Eddie Irvine, estamos sintonizados. Não se pode colocá-los em qualquer lista de “braços-duros” (como os pilotos mais lentos são chamados no jargão do esporte), mas jamais corresponderam ao que a imprensa britânica alardeou ao mundo.
Dito isso, podemos olhar a três nomes desta temporada com algum parâmetro para prever onde poderão chegar. O primeiro deles é Charles Leclerc, terceiro monegasco a brilhar na F-1; os outros dois foram Louis Chiron e André Teslut. Leclerc vive sua segunda temporada em uma equipe de ponta, onde chegou amparado tanto politicamente quanto pelo potencial demonstrado em seus anos de formação.
Alçado a escudeiro de ninguém menos que o tetracampeão Sebastian Vettel, Leclerc não se intimidou e em sua segunda apresentação pela Scuderia superou o companheiro de equipe em plena pista e à vista do público que acompanhou a prova pela TV. Foi uma ultrapassagem para deixar claro que veio para ficar. A já longa e desgastante fase de erros e resultados instáveis do alemão ajuda a consolidar o recém-chegado como aposta segura. No fim de semana Leclerc obteve sua primeira pole position e liderou a prova até que um problema na unidade de potência do seu Ferrari o fez perder posições para o vencedor Lewis Hamilton e o segundo colocado Valtteri Bottas, que segue líder do campeonato. O resultado completo do GP do Bahrein você encontra aqui.
Passemos a Lando Norris, outro jovem que vinha em uma carreira de títulos consecutivos até ser batido pelo compatriota George Russell na temporada passada de F-2. Tanto Norris quanto Russell também exibem capital político: o primeiro é bancado por Zak Brown, homem de marketing e diretor do grupo McLaren, e o segundo por Toto Wolff, o bam-bam-bam da Mercedes na F-1. Filho de um dos homens mais ricos da Inglaterra, Norris ameaça virar o algoz de Carlos Sainz Júnior e para isso conta com as bênçãos de Brown, da sorte que o acompanha e da timidez de resultados que caracteriza a carreira ainda incubada do espanhol.
George Russell, por seu lado, vem de dois títulos importantes, na GP3 (2017) e na F-2 (2018). No ano passado Lando Norris era o favorito disparado ao título, mas Russell presenteou o compatriota como uma ducha de água ainda mais fria que os banhos gelados que Jim Clark relatou como rotina dos seus tempos de estudante. A Inglaterra é famosa por ter uma das gastronomias mais indecentes do mundo e não será surpresa se a vingança será saboreada igualmente fria se Toto Wolff deixar claro que escolheu um novo Pascoal Wehrlein, jovem alemão que conquistou a DTM e decepcionou na F-1.
Por enquanto, Norris leva vantagem sobre Russell: enquanto o primeiro vê planetas alinhados em torno do seu McLaren, o segundo amarga uma temporada de estreia em uma equipe Williams que vive a pior fase de sua história. Ter sido escolhido para testar pneus no Bahrein pela equipe Mercedes pode ser uma injeção de ânimo importante para um jovem em formação e ameaçador para um Valteri Bottas próximo do ápice de sua ascensão.
Já formado, o australiano Daniel Ricciardo amenizou no GP do Bahrein a decepção com a qual brindou seus fãs na estreia pela equipe Renault, duas semanas atrás, na sua terra natal. O que coloca o sorridente Ricciardo na berlinda é o fato que seu companheiro de equipe e parâmetro de comparação é um piloto que já disputou 160 GPs e ainda não conseguiu um único lugar ao pódio, Nico Hulkenberg. Como Ricciardo tem no currículo 152 largadas e sete vitórias, ter andado atrás do alemão nas duas primeiras corridas do ano, sugere que seu cartão de crédito já não permite gastos irracionais.
Outros nomes que caminham turbinados para a lista dos que jamais chegaram onde esperavam são Romain Grosjean, Kevin Magnussen e Sérgio Pérez. Todos arrojados em graus próximos, eles são candidatos a ter seus postos cobiçados por valores a caminho, em especial o franco-suíço e o dinamarquês; o mexicano ainda se garante graças a bom apoio de patrocinadores e à economia ainda estável do México.
Por outro lado, quem dá mostras de superação é o anglo-tailandês Alexander Albon: ele brilhou nos testes de inverno e acabou marcando seus primeiros pontos na F-1 em sua segunda largada pela Toro Rosso, onde o outro piloto é Daniil Kvyat. A sorte ajudou Albon — quem apostaria numa desistência estilo jogral dos dois pilotos da Renault, em Sakhir? —, mas existe vencedor azarado? Seu cacife anda tão alto que ele treinar nos dois dias de testes hoje e amanhã, em Sakhir (veja abaixo), usando seu carro atual, Daniil Kvyat testará os novos pneus.
Passando a borracha em Sakhir
Hoje e amanhã as dez equipes inscritas no Campeonato Mundial de F-1 fazem testes no traçado usado no fim de semana e entre os pilotos escalados aparece uma boa mistura de monstros sagrados, nomes consolidados e novatos com potencial de fazer parte do grid no futuro próximo. Na primeira categoria está o espanhol Fernando Alonso, que vai pilotar um McLaren equipado com pneus de aro 18”, alternativa que a Pirelli espera utilizar em 2020 ou 2021. No último caso estão o brasileiro Pietro Fittipaldi e o alemão Mick Schumacher; Fittipaldi é o piloto de testes e primeiro reserva da equipe Haas enquanto Schumacher vê seu potencial valorizar como se fosse uma cripto-moeda: ele vai andar com carros da Ferrari e da Alfa Romeo (ex-Sauber).
Outros nomes pouco familiarizados com a F-1 que estarão em ação são Dan Ticktum (Red Bull), Callum Illott (Alfa Romeo) e Jack Aitken (Renault). Veja abaixo a lista completa dos pilotos que estarão em ação hoje e amanhã:
Mercedes: Lewis Hamilton (terça-feira), George Russell (quarta-feira)
Ferrari: Mick Schumacher (terça-feira), Sebastian Vettel (quarta-feira)
Red Bull: Max Verstappen (terça-feira), Dan Ticktum (quarta-feira)
Renault: Daniel Ricciardo (terça-feira), Jack Aitken (quarta-feira)
Haas: Romain Grosjean (terça-feira), Pietro Fittipaldi (quarta-feira)
McLaren: Carlos Sainz (terça-feira), Lando Norris (terça-feira à tarde e quarta-feira)
Racing Point: Lance Stroll (terça-feira), Sergio Perez (quarta-feira)
Alfa Romeo: Callum Ilott (terça-feira), Mick Schumacher (quarta-feira)
Toro Rosso: Alexander Albon (terça-feira and quarta-feira)
Williams: George Russell (terça-feira AM), Robert Kubica (terça-feira PM), Nicholas Latifi (quarta-feira)
Teste Pirelli com McLaren: Fernando Alonso (Terça-feira e quarta-feira à tarde), e Carlos Sainz (quarta-feira de manhã)
Teste Pirelli com Toro Rosso: Daniil Kvyat (terça-feira e quarta-feira)
WG