A convite da Associação Brasileira de Engenharia Automotiva (AEA), participei recentemente, em São Paulo, do Seminário de Segurança e Conectividade que teve como tema “Os Impactos do Rota 2030 na Segurança Veicular e os Desafios da Conectividade”. Analisando os materiais apresentados pelos fabricantes e fornecedores presentes ao evento, tive a certeza de que os temas relativos a conectividade, veículos híbridos, elétricos e autônomos são realidades cada dia mais perto dos consumidores do mundo todo, embora ainda nem tanto no Brasil.
O “Futuro das Tecnologias” foi muito bem abordado pelos representantes da Bright, destacando que os jovens de 20-40 anos de idade, consumidores potenciais de veículos automotores, já nasceram após a popularização da internet. Estes motoristas lideram uma mudança comportamental em que cada dia dão mais valor às experiências vividas dentro de um carro em detrimento ao antigo prazer ao dirigir ou “fun to drive”, justamente o foco do AUTOentusiastas.
Diferentemente do que se via há 10~20 anos, quando era a indústria que liderava a implementação de novas tecnologias, hoje em dia a sociedade é que as impõe para serem adotadas pelos fabricantes. Portanto, toda indústria terá que buscar maior criatividade, inovação e flexibilidade para conseguir atender as demandas de mercado e conquistar e fidelizar seus clientes, uma missão árdua.
Metade dos veículos vendidos no Brasil em 2018 saíram das fábricas com algum tipo de conectividade. Esta, apesar das incontáveis vantagens para o consumidor, traz também uma dor de cabeça para os fabricantes e fornecedores, que é o risco de ataque cibernético. Não estamos falando das guerras intergaláticas do filme “Jornada nas Estrelas”, mas de algo bem mais simples, porém igualmente preocupante.
A partir do momento em que o carro está conectado com o mundo exterior através de um celular ou de uma conexão de internet, ele é suscetível de ser invadido por um hacker. Pode aparecer tanto uma simples bolinha de pingue-pongue na tela da central multimídia, como aconteceu com vários computadores em 1988, quanto algum ataque mais danoso que poderia causar lesões nos usuários e pedestres, além de danos ao meio ambiente.
Os engenheiros dos fabricantes e fornecedores da área de tecnologia estão trabalhando para mitigar os riscos de ataque cibernético em seus produtos, como destacou o engenheiro Marcus Farbiarz, gerente de P&D da SIDI de Campinas, SP, empresa especializada em projetos de segurança cibernética.
Carros elétricos
Os carros elétricos estão chegando e se avolumando no mercado. Todos as semanas tem algum fabricante anunciando um novo modelo. A General Motors, pelo engenheiro Plínio Cabral Jr., diretor da Engenharia Elétrica da fabricante, apresentou dados e fatos que mostram a confiança da empresa no caminho da eletrificação de seu portfólio nos próximos anos. Até 2023 a GM deverá lançar 20 novos modelos de carros eletrificados, porém ainda não se sabe quantos desses modelos irão rodar no nosso solo.
Da mesma maneira que o parque de estações de carga na América do Sul deverá crescer nos próximos cinco anos, saindo de cerca de mil estações em 2018 para mais de 7 mil em 2023, as preocupações com segurança nesse tipo de veículo devem aumentar, e a necessidade de conscientizar os usuários e toda comunidade automobilística dos riscos envolvidos com essa tecnologia é primordial.
O Chevrolet Bolt totalmente elétrico utiliza um pacote de baterias de íons de lítio de 60 kW·h com uma tensão nominal de 360 volts corrente alternada. Em caso de incidente o veículo tem proteções para abrir os contatores da bateria e isolar a alta tensão em vários cenários, incluindo eventuais situações de sobrecarga em colisões e inundação.
Porém, se o veículo for danificado por inundações, fato muito comum no Brasil, este deve ser inspecionado por um técnico o mais rápido possível, além de ser recomendável que o cliente não dirija um veículo inundado.
Automação
Existem cinco níveis de automação na condução de veículos, sendo que o níveis 4/5 são os mais disruptivos.
O tema de automação veicular será muito mais debatido daqui para frente. Teremos aqueles que amarão os níveis mais altos de automação e os que odiarão. Observando o nível de automação dos carros de acordo com a tabela mostrada na figura acima, nota-se que os níveis 0 e 1 são basicamente alerta e assistência ao motorista, e certamente quanto maior for sua aplicação na frota circulante, menores serão os acidentes causados por pequenas distrações dos motoristas ou transeuntes.
O sistema de frenagem autônoma de emergência (AEB, a sigla em inglês) apresentado pelo engenheiro Leimar Mafort, da Bosch, é a segunda tecnologia mais desejada dentre as tecnologias listadas no Sistema Avançado de Assistência ao Motorista (Adas, sua sigla em inglês). Trata-se de um sistema que consegue detectar alguns objetos, fazer classificações básicas, alertar o condutor sobre condições perigosas na via e, em alguns casos, desacelerar ou mesmo parar o veículo.
O AEB em síntese reproduz por sensores e atuadores o que o cérebro comandaria ao corpo humano. Pelos dados apresentados pelo engenheiro Mafort, a aplicação do AEB teria a capacidade de reduzir em até 30% os acidentes de colisão traseira, 10% acidentes com pedestres em nível global. Já no Brasil estima-se que a utilização do AEB em toda a frota circulante poderia reduzir acidentes com pedestres em até 26%.
A frenagem autônoma de emergência está considerada no Rota 2030 (programa que define regras para a fabricação dos automóveis produzidos e comercializados no Brasil nos próximos 15 anos), além de ser futuramente um dos requisitos de pontuação estelar do Latin NCAP. O AEB estará presente num maior número de veículos no Brasil no futuro próximo. Fica a torcida para que a regulamentação brasileira do AEB siga a resolução final da Unece (Comissão Econômica das Nações Unidas para a Europa), facilitando assim a implementação por aqui e evitando custos adicionais de engenharia e desenvolvimento que invariavelmente são transferidos ao preço final dos carros. Ou seja, não podemos criar mais uma jabuticaba por aqui.
Maio Amarelo
O movimento “Maio Amarelo” foi lembrado na apresentação do engenheiro Rodrigo Ribeiro, da General Motors, com a abordagem de Proteção ao Pedestre e os desafios da engenharia para atender os requisitos de projeto do veículo.
Dados históricos mostram que a indústria automobilística estuda soluções que minimizem o impacto a pedestres desde os primórdios, porém após um período de estagnação durante a Segunda Guerra Mundial os estudos retomaram focados em proteção aos ocupantes. As pesquisas e desenvolvimentos a proteção de pedestres só ganharam força após os anos 1970.
O desenvolvimento de soluções de proteção ao pedestre visa minimizar as lesões e ferimentos em cabeça e perna, baseado nos dados estatísticos mostrados na figura abaixo, sendo que ferimento na cabeça é o tipo de lesão de maior fatalidade nos atropelamentos.
Ao final do dia do seminário o que se quer é que a conectividade, a eletrificação e a automação dos veículos — qualquer que seja o nível — ajude a aumentar a segurança e reduzir os acidentes, fornecendo ao motorista avisos em caso de condições perigosas ou possíveis colisões, e/ou correção ativa da velocidade do veículo ou correção da direção para evitar tais condições ou colisões.
GB