Este veículo, concebido pela fábrica da Volkswagen em 1973, não pretendia ser um símbolo de status visualmente elaborado, mas deveria, especialmente em países do Terceiro Mundo, abordar um segmento de mercado já que era um veículo utilitário durável, confiável e econômico para realizar tarefas de transporte.
Já na foto de abertura desta matéria, foto do catálogo do AutoMuseum Volkswagen de abril de 1985, aparece um EA489 com um logotipo VW e volante direção do lado esquerdo – onde está o limpador de para-brisa único e uma carroceria de madeira
A Volkswagenwerk (Fábrica Volkswagen) queria contribuir com o desenvolvimento desses países, reconhecendo que:
– Os meios de transporte de carga — como este — eram um pré-requisito indispensável para futuros desbravamentos e progressos regionais.
– Por outro lado, as economias destes países muitas vezes ainda não suportavam o estabelecimento de uma indústria automobilística independente e completa.
A Volkswagen projetava que o EA489 iria propiciar:
– Investimento comparativamente muito baixo para a sua produção local
–Nenhum custo para um conforto desnecessário; conforto não seria o caso para esta finalidade, a contar pelas janelas laterais de filme de plástico transparente, do limpador de para-brisas único, das formas retilíneas, etc.
Com base no conceito apresentado, o conteúdo local do material na produção do EA489 poderia ser incomparavelmente alto. Desta forma, os respectivos fabricantes/montadores locais seriam capazes de produzir a cabine, o chassi, o tanque de combustível, os bancos, fazer a pintura e a montagem. A Volkswagen forneceria somente o motor, a transmissão, o eixo dianteiro e o conjunto da direção.
Como se pode ver, a tração era dianteira, o chassi era simples, em forma de escada. O motor, boxer 1600 (1.584 cm³) e 45 cv arrefecido a ar (no Brasil, no VW 1600 4-portas, depois no México, a potência do motor era de 50 cv). A suspensão dianteira era independente por triângulos superpostos e barra de torção longitudinal; suspensão traseira por eixo rígido e um feixe de molas semielípticas de cada lado. Freios, hidráulicos a tambor nas quatro rodas e as rodas eram de cinco parafusos com o cubo vazado. A carga útil era de uma tonelada.
O VW EA489 Basistransporter, fabricado em 1975-1979, era um pequeno caminhão extremamente simples. Na verdade, ele foi projetado para ser o mais barato possível para comprar e manter. Naquela época, veículos como esse eram muito populares em grande parte do mundo. Os altos preços do petróleo e a economia instável alimentaram a demanda por caminhões utilitários leves baratos e entregues pelos líderes de mercado — Toyota, Ford, General Motors e vários outros grandes fabricantes introduziram um novo conceito de ” Basic Utility Vehicles (BUV),, Veículos utilitários Básicos. E assim a Volkswagen aproveitou esta oportunidade também.
O EA489 foi avaliado para produção ma Austrália, Nova Zelândia, Papua-Nova Guiné, Filipinas, Paquistão, Indonésia, Turquia e México. Foi construído e vendido na Turquia como EA489, nas Filipinas como Trakbayan, na Indonésia como Mitra e no México, como Hormiga.
Na Alemanha
Foram produzidos poucos modelos completos, que foram enviados para avaliação de várias representações Volkswagen em países do Terceiro Mundo, sendo que uma reclamação frequente era a potência insuficiente.
A produção restante foi em CKD das partes vitais, num total de 2.600 unidades fabricadas entre 1975 e 1978. Uma unidade completa ficou preservada no AutoMuseum Volkswagen, esta mostrada abaixo:
No México
Na fábrica da Volkswagen em Puebla, no México, foram produzidas 3.600 unidades completas entre 1977 e 1979 — seu nome oficial no México era VW 200.
Lá ele recebeu o apelido de “Hormiga”, formiga em espanhol, devido a sua capacidade de trabalho e confiabilidade. A cabine era feita com chapa e recebeu nervuras estampadas para aumentar a sua resistência e que acabaram dando uma aparência melhor ao veículo. Além do mais, como vimos acima, a potência do motor foi aumentada para 50 cv. Foram feitas outras melhorias e este caminhãozinho básico fez sucesso no México, mas hoje sobraram poucas unidades em bom estado, já que eles eram “pau pra toda obra” e acabaram sendo sucateados depois de seu intenso uso.
Alguns detalhes de um Hormiga que foi restaurado em um interessante vídeo (8:42) falado em espanhol:
Mas há uma questão que me deixou intrigado: parece que não havia uma norma para tamanho, tipo (preto, branco, cromado etc.) e posição do logotipo VW no “Hormiga”, veja as fotos de vários exemplares abaixo:
Na propaganda abaixo a Volkswagen de México ressaltava o fato do Hormiga ter um acesso para o sistema de diagnóstico das concessionárias e com isto oferecia inspeções mais rápidas e mais focadas nos eventuais defeitos:
Na Finlândia
Na Finlândia, um caminhão chamado Teijo (uma variante do nome do deus mitológico do trovão Thor, em finlandês), estreitamente relacionado ao EA489, foi construído pelo Grupo Wihuri de 1975 a 1976. Foram fabricados cerca de 200, com alguns enviados à África como ajuda ao estrangeiro.
Para se ter uma visão de mais detalhes do Teijo segue um breve vídeo (0:53) de um sobrevivente:
Nas Filipinas
Neste país o EA489 também teve uma função de afirmação nacional, de mesma maneira que vimos com o jipe Sakbayan construído pela mesma empresa TKB, conforme descrevemos na matéria “Dois Volkswagens diferentes: Countrybuggy e Sakbayan”.
O EA489 na versão filipina recebeu o nome de Trakbayan (“caminhão do campo” em filipino) e num de seus folhetos foi impressa a seguinte informação com a qual a TKB assume a paternidade do projeto:
“Há mais em um Trakbayan que apenas uma grande quantidade de energia. Carrega cargas maiores. E nunca esmorece sob seu fardo. Maior distância ao solo. E quando se trata de consumo de gasolina, ele consome apenas 10 litros a cada 100 quilômetros. O Trakbayan, criado por mentes filipinas com necessidades filipinas e com condições de condução filipinas em mente.
Aperfeiçoado na Alemanha pela Volkswagen.”
Num catálogo eram oferecidas várias versões de carroceria, a saber (as traduções abaixo referem-se às ilustrações que se seguem):
1-Low side pick-up: picape de lateral baixa
2-High side pick-up: picape de lateral alta
3-High side pick-up w/roof: picape com lateral alta e teto
4-Van: furgão
5-Jeepney: uma espécie de jardineira para o transporte de pessoas.
Na Indonésia
O nome do EA489 na Indonésia foi Mitra, que quer dizer parceiro e foi uma construção diferente, pois usava uma cabine que tinha a frente de uma Kombi T2, com entradas de ar para o motor, mas as portas não eram as portas da Kombi, como se pode ver na reprodução do catálogo abaixo:
A última das primeiras tentativas de uma fabricação nacional de carros indonésios foi o Volkswagen Mitra, também conhecido como Basistransporter. A Wikipedia pode ter dito que ele só chegou ao estágio de protótipo, mas, na verdade, ele entrou em produção, foi produzido pela PT Garuda Mataram Motor em Jacarta. Mas não acabou não vendendo muito bem por dois motivos: 1) O Kijang da Toyota (foto abaixo) era mais barato e 2) se você queria uma picape VW, por que não compra um VW Transporter original, mais bem construído e mais bem equipado?
Mas o problema é que esses carros, apesar de terem sido construídos na Indonésia, não foram considerados carros indonésios por muitas pessoas. Por quê? Por terem um distintivo estrangeiro.
Na Turquia
Na Turquia este carro era chamado simplesmente de EA489 Basistransporter, e, como na Indonésia, era uma tentativa de clonar uma Kombi picape; para tanto usava a frente de uma T2, onde foi aberta uma abertura para ventilar o motor dianteiro. As portas, também neste caso, não eram as originais da Kombi T2.
Papua-Nova Guiné
Deste país temos os registros fotográficos abaixo, feitos em 1978, na cidade de Port Moresby:
Paquistão
A foto abaixo mostra que houve EA489 Basistransporters no Paquistão, se bem que a foto em questão, tirada em 1979, é bastante desmotivadora, já que este exemplar já tinha precocemente virado um galinheiro:
Aqui termina o material que pôde ser levantado sobre o EA489 Basistransporter e suas aplicações pelo Terceiro Mundo.
Este foi o primeiro veículo da Volkswagen com tração dianteira de motor arrefecido a ar. O segundo foi o Gol brasileiro (sem esquecer o primeiro protótipo do Golf que também tinha um motor a ar na frente com tração dianteira — mas que não entrou em produção nesta configuração).
AG
Esta matéria, que já estava num planejamento mais distante, foi antecipada graças à solicitação do leitor Gustavo Godoy, feito nos comentários de uma matéria anterior. Sim, há várias solicitações de matérias, que serão atendidas dentro do possível, será necessário um pouco mais de paciência por parte daqueles que “encomendaram” matérias.
Foram consultados vários sites, como: Tractor & Construction Plant Wiki, Living in Nodum, Jalopnik, The Story of National Cars of Indonesia, Revolvy – Volkswagen EA489 Basistransporter, Wikipédia, The Samba etc.
Também foram consultados livros: “Volkswagens of the World” de Simon Glenn, de 1999, impresso pela Veloce Publishing e “Durchgeboxt” de Thomas Braun, de 2015, impresso pela editora Delius Klassing Verlag GmbH.
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A coluna “Falando de Fusca & Afins” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.
Nota de Alteração emitida às 00h30m de 08/10/2019: Acrescentada uma propaganda do Hormiga recebida do Rainer de Würzburg, Alemanha.