A partir deste mês de agosto entra em vigor uma resolução da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) que estabelece novos padrões para a nossa gasolina no tocante a ponto de evaporação, octanagem e densidade, dentro de três meses. Ela será ainda melhor, mas nem tanto quanto anunciam.
Densidade mínima: o que é isso?
Densidade é a relação peso-volume. Em português mais claro, um litro de água pesa 1 kg porque a densidade da água é 1. Se for outro líquido, por exemplo, o mercúrio, o mesmo 1 litro pesa 13 kg. Com a gasolina, quanto menor a densidade, menos energia para o mesmo volume. Menos energia na gasolina, menos transformação de energia química em energia mecânica, portanto pior para o bolso do consumidor porque o motor vai precisar de mais volume de gasolina (corretamente mais volume de mistura ar-gasolina) para produzir a mesma potência: o consumo aumentará. E o problema é que a densidade da gasolina varia muito em função do petróleo que a produziu, de 650 até 750 gramas por litro. Depende também da formulação da própria gasolina, que é uma mistura de diversos hidrocarbonetos, da temperatura, etc. O álcool anidro, o que é misturado com a gasolina vendida no Brasil, por lei (!), é mais denso (pesado) que a gasolina: 791,5 g/litro.
Qual é a densidade obrigatória a partir deste mês de agosto? A gasolina C (misturada com álcool a 25% ou 27%) deve ter uma densidade mínima de 715 g/litro (ou 715 kg/m³).
Nova octanagem
Nesse processo a ANP mudou — já não era sem tempo — a maneira de exprimir a octanagem da gasolina. Até agora a octanagem (característica da gasolina que indica sua resistência à detonação, a inflamação descontrolada na câmara de combustão) era expressa de maneira diferente dos resto do mundo (igual só nos EUA): em vez de octanagem ou número de octanos era um reles índice antidetonante (IAD) que pouco dizia. Esse índice nada mais é a média aritmética dos números de octanos MON e RON, enquanto no resto do mundo, nos nossos vizinhos inclusive, é octanos RON simplesmente (MON e RON são apenas métodos para estabelecer o número de octanos da gasolina). A “nova’ gasolina comum e a comum aditivada será de 92 RON e a partir de janeiro de 2022, 93 RON. Quanto às gasolinas premium, elas serão de no mínimo 98 RON.
A qualidade era inferior?
A Petrobrás diz que a gasolina dela não era: há tempos a densidade é até superior a 715 g/l agora exigida. E também que a octanagem (93 RON) declarada é maior que mínima obrigatória 92 RON. Entretanto, como não havia exigência de densidade mínima, distribuidoras e postos podiam adulterá-la à vontade com solventes ou naftas, por exemplo, que são mais “leves” (densidade inferior). Podia-se também importar gasolina mais barata, com densidade inferior a 700 g/litro. E de octanagem também inferior, cerca de 90 RON . Por isso a possibilidade de tamanha diferença de desempenho e consumo ao se abastecer em dois postos.
É adulterável? Sim, só ficou mais difícil…
Como não havia exigência de densidade mínima, cada refinaria, distribuidora, importadora ou formuladora a fornecia com densidades variáveis, muitas vezes inferiores a 715 g/litro agora exigidos pela ANP. E também com octanagem mais baixa que RON 92. Por isso, o motorista abastecia num posto fiscalizado e aprovado e não entendia porque seu carro perdia desempenho e o consumo aumentava .
O que a imprensa está anunciando é que a nova gasolina impede sua adulteração, pois o posto terá, a pedido do freguês, que comprovar a densidade mínima utilizando um densímetro (bastão graduado de 700 a 750 g/l) que se mergulha numa proveta e que deve indicar, no mínimo, 715 g/litro.
Então, com a nova exigência, seria impossível continuar vendendo gasolina “leve”, de baixa densidade. Mas ainda é possível, sim, adulterá-la: basta aumentar o volume de álcool anidro normalmente (é obrigatório por lei federal) adicionada a ela para elevar a densidade final da mistura, pois o álcool tem densidade bem maior.
Então, se o freguês desconfia da densidade, o posto tem obrigatoriamente que testá-la com o densímetro. Aprovado nesta etapa? A desconfiança tem que prosseguir e exigir também a proporção de álcool na gasolina, que não pode superar os 27% (25% nas premium). Aí aparece a malandragem, pois revela que, para “chegar” à densidade mínima, o posto aumentou o volume do álcool!
Não é tão nova assim!
Posto que aumentar o preço da gasolina alegando as novas exigências da ANP poderá estar mentindo, principalmente se for da Petrobrás, que afirma ter sua gasolina enquadrada há meses nos novos padrões. E diz que, por isso, não mudará seu preço. Além disso, nem todos os postos a terão imediatamente, pois a ANP deu prazo de 60 dias para as distribuidoras e 90 dias para os postos esgotarem os estoques da “velha” gasolina. Então, até novembro, o motorista ainda encontra ambas nos postos.
Melhor para os novos que para os velhos
A exigência de octanagem mínima 92 RON (93 RON3 a partir de janeiro de 2021) será vantajosa para quem abastece com gasolina. Pois a central eletrônica terá que interferir menos no ponto de ignição (atrasá-lo) para evitar a combustão descontrolada (detonação ou “batida de pino”). Reduz assim a perda de desempenho e aumento de consumo.
E os carros mais antigos? Os carburados também serão beneficiados com a maior densidade, mas pouco ou mesmo nada com a octanagem, pois têm baixa taxa de compressão e os motores não requerem gasolina com mais de 90 RON.
BF.
A coluna “Opinião de Boris Feldman” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.
(Atualizada em 01/08/20 às 16h40, correção do ano de entrada da gasolina 93 RON)