É muito doloroso para mim, com mais de meio século de convivência com o controle do trânsito, tomar conhecimento da mortandade elevada dos condutores de moto, principalmente os entregadores, a ponto de merecerem a sua identificação em algumas faixas de parada para atender à ordem do semáforo.
Tudo se origina no mau conhecimento dos princípios da engenharia de tráfego que constitui a parte dinâmica do urbanismo. Não foi por acaso que a Philips, empresa internacionalmente respeitada, publicou numa revista técnica de sua responsabilidade matéria intitulada “Engenharia de Tráfego, a ciência esquecida”. E ela tem como princípio básico o aproveitamento ao máximo do sistema viário existente. Ela é a solução dinâmica para um problema dinâmico, respeitando o meio ambiente. Pior do que o seu abandono é o enfoque das medidas restritivas, que exigem uma fiscalização de difícil eficácia.
Aqui, no nosso Pindorama, ainda consideram que o motorista deve ser educado, ao invés de ser um “primata condicionado”, como definem os que conhecem bem o assunto. Não me canso de repetir — é a “carapuça” que se encaixa na maioria das cabeças com poder de atuar — a frase de G.K. Chesterton, escritor inglês, ao dizer que “Não me preocupam os que não enxergam a solução e sim os que não a encontram porque não enxergam o problema”.
Afinal, o que a engenharia de tráfego pode fazer para disciplinar o “motoqueiro” apressado a fim de fazer mais entregas para faturar mais, no difícil momento de pandemia que estamos vivendo?
Apesar de já haver escrito que não mais sugeriria soluções, gratuitamente, por “estar pregando no deserto”, a ponto de estar pensando em publicar um livro com uma selecionada coleção de artigos por mim publicados em vários meios de comunicação, com o título “Crônicas inúteis”, o meu sentimento de amor ao próximo me fez escrever esta artigo eminentemente construtivo. Afinal, tenho mais de meio século de “janela”.
O início de tudo, para quem dirige, é o trânsito urbano, onde o motorista deve ser condicionado pela sinalização correta no que concerne à velocidade. O absurdo sistema atual, em que se considera sinalização sincronizada a abertura de vários semáforos ao mesmo tempo na sequência de vários cruzamentos, nas vias de trânsito rápido de 60 km/h é a maior responsável pelos acidentes com motos. Sistema que é um incentivo ao abuso da velocidade, verdadeira disputa entre os integrantes do tráfego presente a fim de pegarem o maior número de cruzamentos livres e, convenhamos, as motos sempre levarão vantagem, nesta verdadeira “corrida por espírito de emulação” pelos motoboys de entrega, infração GRAVÍSSIMA prevista no CTB, no seu Artigo 173. A eficácia da mobilidade urbana tem como principio basilar o deslocamento em conjunto de veículos surfando na “onda verde”. O individualismo é seu inimigo mortal, até porque os isolados, fora dos “pelotões,” encontrarão sempre o próximo sinal fechado.
Para os motoboys tudo é válido para andar mais depressa e, por isto correm um risco maior, até porque existem motoristas que odeiam o motociclista que “serpenteia” entre eles.
A solução capaz de reduzir os acidentes urbanos com motocicletas é e adoção do sistema de “onda verde”, com a abertura dos semáforos em sequência, obedecendo à velocidade máxima das vias de trânsito rápido, geralmente 60 km/h.
Presenciei, na Alemanha em 1977, onde nasceu o sistema, uma perfeita demonstração numa via de aceso à Colônia, quando ainda havia, por estarmos numa estrada vicinal, três indicações a informar o limite de velocidade a ser obedecido, de 30, 40 e 50 km/h, afim se poder “surfar na onda verde”, num tráfego comandado por computadores, com medição de seu volume em tempo real.
Até quando os nossos técnicos, cuja competência em alguns casos é discutível, levarão os meios de comunicação a ter o desprazer de noticiar, em números estatísticos, as vítimas do atraso injustificável da gerência da bem-denominada, na Europa, “A ciência do controle do trânsito”?
CF
Celso Franco escreve para o AE, quinzenalmente aos sábados, matérias sobre trânsito.