Como meus caros leitores sabem, recebo muitas sugestões de assuntos para estas (não tão) mal traçadas linhas. Na medida do possível, tento atender a todos. No entanto, encontro uma enorme dificuldade na falta de transparência dos órgãos que deveriam, justamente, dar publicidade às informações.
Aqui não me refiro apenas a sites oficiais. Aliás, são os primeiros que deveriam estar atualizados, ter dados claros, acessíveis. Mas no mundo real, nada disso acontece. Aí eu entro em contato com a área de imprensa. Telefono, mando e-mail e até envio pombo-correio se necessário para tentar as informações que deveriam estar visíveis para todos e não apenas à mídia. Infelizmente na maior parte das vezes recebo respostas parciais, truncadas e, invariavelmente, fora do prazo solicitado.
É claro que nada disso seria necessário se houvesse clareza e abrangência de dados nos sites desses órgãos, autarquias, secretarias, ministérios e toda sorte de empresa de prestação de serviços públicos — muitos deles monopólio, diga-se de passagem. Como disse, acredito que informações devam estar disponíveis a todos. Até me empolguei quando foi promulgada a Lei de Acesso à Informação, mas como algo que é comum no Brasil, essa é uma lei que “não pegou”.
Recentemente, o querido colega daqui do AE Gerson Borini me solicitou uma pauta/investigação. Ele me mandou a sugestão justamente porque é bem o meu perfil — e concordo com ele. Gerson me contou que tem notado o aumento substancial de radares nas rodovias de São Paulo. Além de vários radares fixos que foram instalados, viu também carros do Departamento de Estradas de Rodagem (DER) com radares estáticos, aqueles armados na beira da pista. Antigamente eram carros brancos de alguma empresa terceirizada, hoje são carros do próprio DER. Coisas não tão frequentes antes da pandemia.
É pública e notória a queda na arrecadação de tributos de todo tipo nos governos municipais, estaduais e federal, assim como é sabido que houve uma queda no trânsito de veículos nas rodovias e, consequentemente, na emissão de multas, pois fomos instados a ficar em casa. Nem vou mencionar aqui a redução nos volumes de carros nas estradas, pois em nenhuma em todo o país deve ter havido o mesmo volume de veículos e muito menos aumento desde março.
Daí a fazer uma inferência entre isto e outras formas de arrecadação seria irresponsabilidade minha, mas que dá para desconfiar, isso dá. É um direito inalienável meu, mas é claro que nunca levanto acusação alguma sem provas e não é agora que farei isso. Da mesma forma posso supor que com boa parte da imprensa ocupada com a covid-19 há menos espaço para apurar outros assuntos. Quem não lembra daquela frase agora famosa de “passar a boiada”?.
Radares tem sido uma fonte segura de arrecadação. E também uma fonte fácil, pois basta colocar algum deles e pronto. Alguém cometerá uma infração e será multado. Não defendo, é claro, nenhum tipo de violação da lei, mas ainda não tive uma resposta sobre por que tanta ênfase em multar excesso de velocidade e não más condições veiculares, fiscalizar se pelo menos a pessoa atrás de um volante tem habilitação para tanto e outros tantos problemas até mesmo mais mortais do que velocidade – posto que a maioria das multas são emitidas para pequenos excessos. Nunca criticaria uma multa por trafegar a 200 km/h na via Anchieta, por exemplo. Há velocidades máximas diferentes adequadas a cada via – deveria haver a cada motorista também, mas esse é assunto para outro dia.
Como minha paixão é informação e é para isso que cá estou, vamos aos fatos. Parciais, é verdade, pois dados como volumes médios de carros por rodovia estão computados no site do DER de São Paulo somente até 2018. Ou seja, dois anos inteiros sem informação online. Aliás, quase todas as estatísticas relativas a esse órgão param na mesma data, mas em outros casos, como o que informa sobre quais vias são pavimentadas, quais de terra, etc., os dados estão lançados só até 2013. Detalhe: o DER-SP é uma autarquia vinculada à Secretaria de Logística e Transportes que tem a função de administrar o sistema rodoviário, integrando as rodovias municipais e federais.
Sinceramente, não entendo a dificuldade em atualizar informações que há em várias áreas no Brasil. Os dados são coletados eletronicamente (como as multas, por exemplo), mas não são planilhados — pelo menos não acessíveis ao público em geral. Isso em 2020, quando temos há décadas internet, envio de dados online e outras tantas facilidades.
Segundo me informou diretamente o DER, há atualmente em operação 187 radares fixos, 90 do tipo estático, 16 com tecnologia OCR (Optical Character Recognition, de leitura de placas), 36 lombadas eletrônicas em praças de pedágio, 78 do tipo portátil operados pela Polícia Militar Rodoviária Estadual e 250 não metrológicos (que fazem somente a leitura da placa, sem fiscalizar a velocidade) (foto 2). Isso para um total de 14.429,610 quilômetros de rodovias e acessos administrados pelo DER no Estado de São Paulo (dados de dezembro de 2019). Fora isso, há 7.786,391 quilômetros de rodovias e acessos no Estado sob concessão privada. O site da Agência de Transportes do Estado de São Paulo (Artesp) diz que há 9.800 quilômetros de rodovias sob concessão de 20 empresas privadas no Estado de São Paulo. Estranho é que o dado é também de 2019. Parece que faltou combinar com os russos…
Não há no site do DER um histórico com a evolução do número de radares nem mesmo com o registro de quantos havia 1, 2, 5 ou 10 anos atrás. Pesquisando na imprensa, encontrei um anúncio de licitação feita pelo DER em 2004 para 30 radares do tipo estático. Dizia textualmente: “aos 56 radares fixos instalados pelas concessionárias do sistema rodoviário foram acrescentados outros 49 estáticos contratados pelo DER. Também estão operando 70 radares portáveis usados nas viaturas da Polícia Rodoviária Estadual. E a vigilância sobre a velocidade nas rodovias vai aumentar ainda mais com a chegada dos novos equipamentos em licitação.” Deduzo, então, que nos últimos 16 anos houve um aumento de 38,5% no número de radares fixos (de 49 + 56 + 30 licitados, caso tenham mesmo sido adquiridos, para 187) e no de portáteis de 368 % (de 70 para 78 + 250), mas não tenho como garantir minhas deduções. Até mesmo porque há mudanças nas nomenclaturas dos tipos de radar e às vezes uns são somados a outros. Muito menos saber se houve aumento ou decréscimo desde o início da pandemia até agora. Para complicar ainda mais, tem radares instalados mas que, quando questionado diretamente, o DER diz que não estão funcionando. Ou seja, estatísticas e informações vão para as calendas, pois eles estão lá, mas não operam e não se sabe desde quando nem até quando estarão nessa condição.
No site do DER até pode-se fazer uma pesquisa de quantos radares há em cada rodovia – bem entendido, aqueles que não sejam do tipo portáteis, pois esses, como o próprio nome diz, podem ir de um lugar para o outro. No site da Artesp não há informações sobre radares e quando consultada, a agência responde que o DER informa isso em seu site. No entanto, ao buscar, por exemplo, a localização de radares na rodovia Doutor Celso Charuri (SPA-91/270 ou SPI-91/270 dependendo da fonte consultada, embora nenhuma delas conste da lista do DER) não aparece o nome da via nem nenhum dos números, embora seja concessão da CCR Viaoeste. Deduziria que não há radares nela se não visse há anos um enorme, fixo, com placas de avisos e tudo, no sentido Rodovia Senador José Ermírio de Moraes (Castelinho). A pista é dupla, com canteiro central, acostamento, foi inaugurada em 2003 e está em excelente estado de conservação. A velocidade máxima é de 110 km/h, mas nesse trecho ela é de 60 km/h. Fica pouco antes de se entrar na Castelinho, mas há uma pista exclusiva para quem ingressa nela – ou seja, a velocidade tão baixa não faz o menor sentido.
Entre janeiro e julho deste ano foram registrados 2.349.071 autos de infração nas rodovias estaduais paulistas, segundo me informou o DER. No entanto, em decorrência da pandemia pela covid-19, o Contran determinou a suspensão das emissões de Notificações de Penalidade realizadas pelo DER a partir de 19/05/2020. E a Resolução Nº 782/2020, também do Contran, extinguiu os prazos para a realização dos pedidos de Defesa de Autuação, Recursos de Multas, Penalidade de Advertência por Escrito (PAE) e Indicação de Condutor a partir do dia 01/07/2020. Ou seja, a fiscalização nas rodovias estaduais continua acontecendo normalmente e os usuários flagrados desrespeitando as leis receberão a Notificação de Autuação emitida pelo DER. Na teoria, pois a longuíssima greve dos Correios impediu tudo isto. No entanto, para quem desconfia que possa ter sido multado, a notificação pode ser consultada pelo site do DER ou pelo aplicativo DER Online com o número do Renavam. No entanto, vi na imprensa muitas reclamações de usuários que perderam os prazos para recorrer pois os aplicativos e sites não tinham as informações atualizados. E não apenas do DER. Vi o mesmo problema em todos os órgãos que emitem multas.
Vale a pena lembrar que a obrigatoriedade da publicação nos locais de operação é válida somente para os radares fixos e para as barreiras eletrônicas, mas não sendo para os equipamentos estáticos ou portáteis. Estes, aliás, podem operar em qualquer ponto da rodovia desde a publicação da resolução nº 396 de 13 de dezembro de 2011, que determinou que apenas para os radares fixos e as lombadas eletrônicas é obrigatório um estudo técnico prévio. Para a fiscalização de velocidade com medidor dos tipos fixo, estático ou portátil deve ser observada, entre a placa R-19 (a padrão para este tipo de informação) e o medidor, uma distância estabelecida em documentos do órgão e lembrando que não é mais obrigatória a informação de “fiscalização eletrônica”. Exemplificando: nas rodovias com velocidades regulamentadas iguais ou acima de 80 km/h deve existir a sinalização R-19, entre um e dois quilômetros antes do ponto onde se localiza o equipamento eletrônico. E nas rodovias abaixo de 80 km/h, a distância da sinalização é entre 300 metros e um quilômetro.
Uma possível novidade é que desde o final de setembro, um projeto de lei aprovado na Assembleia Legislativa obriga o governo de São Paulo a colocar na internet a localização de todos os radares que estejam funcionando nas rodovias estaduais. Além das coordenadas, a administração precisará informar também os horários de funcionamento dos aparelhos e os limites de velocidade para que os motoristas possam consultar antes de pegar a estrada. Falta a sanção do governador do Estado, mas, se for sancionado, a administração pública terá 90 dias para implementar as medidas. Pelo projeto, as rodovias sob concessão privada deverão enviar os dados para o site da Artesp. Os radares das estradas que não têm concessão deverão constar do site do DER e qualquer novo instrumento que for instalado terá que ser identificado nos mapas eletrônicos da Artesp ou do DER com 20 dias de antecedência. Vamos acompanhar e, quem sabe, eu consiga dar uma resposta clara para meu amigo Gerson.
Mudando de assunto: recebi este meme e não resisti a divulgá-lo. Feministas e outras tribos de “istas” podem começar a lançar pedras contra mim. Não me importo.
NG
A coluna “Visão feminina” é de exclusiva responsabilidade de sua autora.