Então o automóvel, obediente ao conselho recebido, procurou o técnico sugerido por Jaime Lerner, que o recebeu, também surpreso, face ao total isolamento em que hoje vive, limitando-se a escrever quinzenalmente para este AUTOentusiastas, onde procura transmitir o que aprendeu seguindo o aconselhamento da poetisa goiana Cora Coralina, que disse: “Feliz aquele que transfere o que sabe e aprendeu o que ensina”
Apesar da surpresa, esta foi eliminada ao saber quem lhe indicara e por que o fizera.
É claro que recebeu o visitante inesperado com carinho e até consideração, não fora ele, o Celso Franco, o último seguidor vivo do Mestre inglês Collin Buchanan que, como vimos no artigo de quinze dias atrás, enaltece o automóvel.
Começou explicando que cabe ao especialista explorar até à exaustão o principio básico da engenharia de tráfego que é: “Aproveitar ao máximo as condições viárias existentes, principalmente otimizando o deslocamento do fluxo de tráfego através de uma sinalização semafórica comandada por computadores, seguindo à risca o perfil do tráfego existente medido continuamente nas interseções.”
Dos sistemas que conheço, recomendaria o Split-Cycle Offset Optimisation Technique (SCOOT) produzido pela Plessey, inglesa, que trabalha com um atraso máximo de cinco segundos sobre o perfil de tráfego existente.
Você, automóvel, tem a infelicidade de trafegar no Brasil, onde esta otimização do controle semafórico ainda não foi introduzida devido ao desconhecimento de quem administra o trânsito ou, se o tem, não encontra eco dos governantes para obter a verba necessária á sua instalação.
Somente a via W3, em Brasília, tem um sistema autocomandado, implantado por mim em 1972, gerenciado por equipamento da Ericsson, da Suécia, a quem eu prestava consultoria na época.
Piorando as coisas para o seu papel na mobilidade urbana, permitem o enorme desperdício de espaço viário, com mais de 90% dos carros transportando apenas o seu motorista. Isto é inaceitável nas horas de pico, quer matutino, quer vespertino, levando ao baixíssimo rendimento da malha viária urbana das grandes capitais brasileiras, facilmente notado pelos congestionamentos.
Mesmo se otimizassem o controle semafórico, o seu efeito benéfico seria limitado pela capacidade viária.
Para solucionar este obstáculo intransponível será preciso que os governantes tenham a visão de estadistas, a fim de cumprirem a única solução possível, ainda empregando a engenharia de tráfego:
Quando a oferta é inferior à procura ou à demanda, raciona-se a oferta.
Para resolver, obedecendo aos princípios basilares da engenharia de tráfego no que concerne ao aspecto social, do qual o trânsito é o terceiro problema mundial segundo a ONU, desenvolvi e patenteei o sistema URV, iniciais de Utilização Racionada da Via.
E aqui, meu caro cliente, termina o meu aconselhamento. Deste ponto em diante cabe aos seus fabricantes, através da Anfavea, cujas fábricas matrizes acreditaram no Brasil, exigirem dos governos as soluções, algumas aqui enumeradas.
Para lhe desonerar a consciência, você pode se convencer de que não é o culpado pelos rendimentos baixos da mobilidade urbana, mas vítima, como somos todos nós que convivemos ao menos quatro horas diárias no trânsito, enfatizado pela conclusão do urbanista grego Constantinos Doxiadis (1913-1975), que enquanto viveu foi o melhor do mundo: “A crise da civilização urbana é uma crise de falta de imaginação e de coragem” — evidentemente de quem cabe a responsabilidade de resolver os problemas existentes.
Nós, eu e você, somos muito pequeninos diante dos interesses em jogo, fora o direito do “jus esperneandi.”
CF