A missão do jornalista é mais do que informar. Na sua caneta está também a missão de formar. “Formei-me” em automóvel lendo o que jornalistas escreviam, foi como fui assimilando conhecimento ao longo de anos. Posso dizer que três deles influenciaram minha vida e hoje tenho o prazer — mais do que força de expressão — de repassar a quem me lê todo esse conhecimento de décadas (caminho para 79 anos).
Esses três jornalistas “influenciadores” são o americano Floyd Clymer, da revista Mecánica Popular (edição em espanhol da Popular Mechanics), o francês Claude Vogel, da L’Automobile, e o belga Paul Frère, que escrevia para várias publicações, entre elas a americana Road & Track. O que escreviam era descarregado na minha mente com se fosse transmitido por Bluetooth.
Os três conheciam a matéria automóvel em profundidade e sabiam como passar seu conhecimento. Adolescente, me deliciava cada vez tinha nas mãos os exemplares dessas publicações todos os meses. Para isso foram muito importantes a compreensão e o estímulo dos meus pais.
Mas houve um brasileiro além dos três estrangeiros citados, que só vim a conhecer depois que me mudei para São Paulo em 1978: José Luiz Vieira. Eu lia o que ele escrevia quando, com apenas 20 anos, passou a colaborar para uma revista carioca chamada Revista de Automóveis, mas nunca prestei a atenção no nome dele. Só quando o conheci, conversando com ele, é que fiz a ligação. Foi aqui, em São Paulo, que se estabeleceu uma grande amizade que a morte separou em 19 de maio do ano passado quando ele estava com 88 anos.
Hoje vou passar um pouco de conhecimento.
Supercarregador e turbocarregador
Entre os termos que sempre me incomodaram por considerá-lo impróprio do ponto de vista de verbalização, estão o compressor e seu sucedâneo turbocompressor. Cada vez que pensava na palavra vinha-me a ideia de uma bomba pneumática socando ar para armazená-lo num reservatório cilíndrico (desenho abaixo). Até que uns dias atrás — menos de um mês — veio me a conhecida e popular expressão “pera aí”: o compressor e o turbocompressor não trabalham para armazenar ar coisa nenhuma, seu papel é outro. É carregar o motor com o elemento indispensável para seu funcionamento, o ar, devidamente misturado com o combustível.
Normalmente os motores aspiram ar quando, nos cilindros, os pistões movimentam-se de seu ponto mais alto (ponto morto superior) em direção ao ponto mais baixo (ponto morto inferior), criando uma depressão cujo espaço deixado pelo seu deslocamento é prontamente preenchido pelo ar atmosférico. Isso porque o ar tem massa e uma pressão de 1,01325 bar no nível do mar Há outras unidades de pressão, mas estamos acostumados falar em bar, como na “pressão do turbo”.
Só que a pressão atmosférica em si é insuficiente para preencher todo o cilindro, sempre há uma perda nesse processo, de modo que, para dar um número, um cilindro de volume calculado 300 cm³ só aspira 85% desse volume em ar. Essa relação tem o nome de eficiência volumétrica.
É intuitivo que quanto mais ar adentrar aos cilindros, mais combustível poderá ser introduzido, e o resultado será uma combustão mais intensa, produzindo mais torque e potência. É função do supercarregador e seu “filhote” turbocarregador prover mais ar para os cilindros. “Comprimir ar” é uma história completamente diferente.
Por isso passamos a usar no AE supercarregador em vez de compressor e turbocarregador (foto de abertura, turbocarregador na esquerda) no lugar turbocompressor, lembrando que ambos têm a mesma função, diferindo apenas na maneira como a roda que carrega de ar o motor é acionada, sendo, respectivamente, pelo próprio motor e por uma turbina tocada pelos gases de escapamento.
Com os novos nomes, todos, AE e leitores, ficam alinhados com os termos em inglês supercharger e turbocharger, Países de língua espanhola como o México estão na mesma linha, supercargador e turbocargador.
Os franceses continuam com compresseur e turbocompresseur, mas os alemães, curiosamente, misturam compressor e turbocarregador com os nomes kompressor e turbolader.
Mas continuaremos a utilizar também a forma ‘turbo’ isolada (“motor turbo”). Afinal, todos já sabem o que é.
Até a semana que vem.
(Atualizada em 27/06/21 às 16h35, correção do título)
BS