Critiquei as oficinas que defendem a nem sempre necessária a troca do tensor com seu rolamento junto com a da correia dentada, a chamada “venda casada”.
Uma controvérsia que surgiu desde que foi introduzida a correia dentada em substituição à corrente, começando pelo pequeno cupê alemão Glas 1300 GT em 1963 e no Brasil, pelo Chevette em 1973, seguido do Passat em 1974. O motor Ford 2,3-litros OHC “Georgia”, aplicado nos modelos Willys (Jeep, Rural e Pick-Up) “reemblemados” como Ford em 1975, também usava correia dentada.
Vantagem da correia dentada? É mais barata. Mas os fabricantes alegam ser mais silenciosa. Embora a corrente não seja ruidosa a ponto de incomodar. É mantida na maioria dos carros.
Desvantagem? Ao contrário da corrente, exige trocas frequentes com determinada quilometragem, em geral entre 50 mil e 100 mil km. Pior: se o veículo roda em ambiente contaminado com pó de minério ou outro abrasivo, o desgaste é acentuado e ela se rompe antes mesmo do prazo previsto de substituição. E, em muitos motores, correia rompida é prejuízo na certa, pois as válvulas “atropelam” os pistões, uma vez que o imprescindível e exato sincronismo entre virabrequim e comando (oi comandos) de válvulas se perde.
Fábricas que mudaram para a correia dentada já voltaram a projetar motores com a corrente, tantos foram os questionamentos, principalmente as dificuldades dos frotistas.
A controvérsia? Alguns mecânicos alegam que o rolamento pode pifar logo depois da substituição da correia e o dono do carro arcar com uma nova mão de obra que poderia ser evitada com a troca conjunta. E afirmam estar seguindo uma norma da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).
Mas, imagina-se que um rolamento de aço, não submetido a impactos nem esforços axiais (laterais) deve ter vida útil muitas vezes superior à de uma correia de borracha. Tanto que, em motores Ford Ka e Chevrolet Onix, onde são banhadas em óleo, correias e rolamentos dos tensores duram mais de 200 mil km.
E a ABNT? Ela tinha realmente publicado a norma NBR 15759 (em 2009) recomendando a troca do tensor. Observamos — na época — para esta associação, numa reunião no Sindirepa (presentes Bob Sharp. Fernando Calmon e eu, representado pelo Bob), que nenhuma fábrica (exceto a Renault) incluía este procedimento em seus manuais de reparação e de proprietário. A ABNT acatou a sugestão e publicou então a NBR 15759-2011 recomendando o procedimento indicado pela fábrica. Ou seja, troca da correia e inspeção do rolamento.
Mas, diante de críticas de alguns profissionais de reparação que defendem a troca simultânea, decidi consultar uma das mais prestigiadas e famosas fábricas de rolamentos do mundo, a Schaeffler, que os produz no Brasil sob as marcas FAG e INA. Pensei que sua equipe técnica poderia ficar “em cima do muro” pelo interesse da empresa em vender seus produtos. Mas a Schaeffler foi objetiva e de uma ética exemplar.
Afirmou que:
- O padrão de homologação de rolamentos para correias é de 300 mil km. Pode haver, segundo ela, uma variação para mais ou menos de acordo com as condições operacionais. Mas jamais abaixo de 200 mil km;
- Estatísticas de campo afirmam que 99% dos problemas de desgaste prematuro dos rolamentos de tensores das correias dentadas são provocados por erro ao ajustá-las em sua tensão de trabalho;
- Só recomenda a troca simultânea do rolamento em motores com alta quilometragem e que não se conhece o histórico. Ou seja, se o carro já rodou, digamos, 200 mil km e a correia deve ser substituída sem que se conheça sua vida útil e a do rolamento do tensor, sugere a troca de ambos.
Então:
- A ABNT recomendou em 2009 a troca do tensor simultaneamente com a da correia, mas alterou esta norma em 2011;
- estes rolamentos são projetados para durar cerca de 300 mil km;
- falha prematura dos tensores/rolamentos de correia dentada são provocados, segundo os técnicos da Schaeffler, por ajuste errado de sua tensão.
Aliás, muitos mecânicos até desconhecem que se o tensor estiver no ramo tenso da correia (como no motor Fiat Fiasa, foto de abertura)) em vez de no ramo frouxo, deve-se girar o virabrequim no sentido contrário ao de funcionamento do motor três voltas para o ajuste da tensão, quase todos automáticos hoje, ser efetuado.
Mas, como explicar de o rolamento ter pifado logo depois de a correia ter sido substituída, com prejuízo para o dono do carro?
Está explicado por quem o fabrica: o rolamento dura cerca de 300 mil km e seu desgaste prematuro é provocado pelo próprio mecânico ao ajustar incorretamente a correia.
Então, a venda casada correia/rolamento é ou não uma pi-ca-re-ta-gem?
BF
A coluna “Opinião de Boris Feldman” é de exclusiva responsabilidade do seu autor,
(Atualizada em 21/08/21 às 19h20, correção do local da reunião com a ABNT)
Mais Boris? autopapo.com.brautopapo.com.br