A TSO Brasil, empresa de apoio logístico dedicada a eventos de experimentação de veículos e a administração da frota de imprensa de alguns fabricantes e importadores, dos irmãos Carlos Guilherme “Cacá” Clauset e Felipe Clauset, organizou na semana passada o superevento “Electric Experience” no Haras Tuiuti, no município homônimo no interior de São Paulo, a 113 quilômetros ao norte da capital. O nome Haras refere-se a cavalos-vapor, potência mesmo, um campo de provas da TSO Brasil com pistas asfaltadas e um circuito off-road. O maior circuito de asfalto mede 2.000 metros e foi lá o palco de uma grande experimentação pela imprensa brasileira — não meros test drives — de praticamente tudo que existe no mercado em questão de carro elétrico.
Só não participaram a Volkswagen, que está apresentando os novos elétricos ID.3 e ID..4 em evento exclusivo esta semana, e a GM, que justificou a ausência pelo atraso no programa do novo Bolt relacionado à pandemia, que por isso teve o lançamento aqui postergado para 2022.
Muitos dos carros presentes ao evento já foram relatados aqui no AE, portanto seria redundante falar mais desses veículos. O mais interessante foi a oportunidade de dirigir num mesmo dia e ambiente os carros de diversas marcas, com possibilidade de comparações direta.
Uma unanimidade é o sistema de frenagem regenerativa que todos carros possuem, transformando a energia cinética (movimento do carro) em energia elétrica. Alguns veículos possuem 1, 2, 3 até quatro níveis de intensidade, como o Mercedes-Benz EQC, um suve espetacular que ainda não fizemos a avaliação completa no AE, mas que já entrou na nossa lista de desejos para o ano novo. Já é praticamente certo que esse recurso de variação de intensidade de regeneração, de efeito idêntico a freio-motor dos motores a combustão, estará presente em todos os elétricos daqui para frente e torço para que o sistema de borboletas atrás do volante para fazer a comutação de intensidade seja a solução adotada por todos.
Os fabricantes ainda flertam com duas ou três vias para definição dos seus modelos e segmentos, começando pelo carro urbano de baixa potência e desempenho mediano com bateria suficiente para um dia de trabalho, e consequentemente baixo tempo de recarga, até os luxuosos suves de cinco a sete lugares com desempenho de carro esporte que carregam mais de 400 kg de bateria sob o assoalho, permitindo deslocamentos mais longos. Sem esquecer dos superesportivos que têm velocidade máxima limitada, caso contrário precisariam de discos de freios e pastilhas de avião, mas que na aceleração são imbatíveis. Vários modelos têm aceleração 0-100 km/h abaixo de 4 segundos, chegando a causar náusea até em avaliadores treinados devido à força G longitudinal.
O evento começou na 3ª feira 30 de novembro com o primeiro dia exclusivo para imprensa e se estendeu até este domingo. Além da possibilidade de avaliar todos os carros na pista do Haras Tuiuti, a organização preparou uma excelente agenda de palestras e discussões ao longo da semana para debater os principais aspectos e implicações da transformação elétrica que estamos presenciando. O assessor técnico e gerente de imprensa/Produto da Stellantis, Ricardo Dilser, foi muito feliz ao lembrar a todos que o momento ali sendo vivido era muito mais do que uma simples avaliação de carros elétricos, era a história do carro elétrico do Brasil sendo escrita.
Motocicletas e bicicletas elétricas estavam presentes, assim como um caminhão elétrico JAC, um furgão de entregas da Peugeot (e-Expert) e outro da Citroën (Ë-Jumpy), lançados naquela semana, e até um ônibus rodoviário com plataforma elétrica da BYD.
Muito tem sido dito sobre essa transição dos motores a combustão interna para os motores elétricos. Ainda existe os que adoram e acreditam na transformação total, e outros que veem com ceticismo essa nova onda.
Um rápido olhar na evolução da tecnologia de propulsão dos últimos cinco anos deixa claro que já chegamos a um nível bem elevado e os softwares de controle estão bem maduros para uso em larga escala, com capacidade de regenerar energia a cada levantada de pé do acelerador. Em paralelo com o aperfeiçoamento da propulsão veio a necessidade de melhor aplicar os conceitos de aerodinâmica, de modo a favorecer o consumo energético. E pasmem, mas os aprendizados obtidos nos estudos aerodinâmicos de carros elétricos estão sendo utilizados nos “velhos” carros com motores a combustão ou híbridos. Todos ganham.
Mas o problema ainda reside no armazenamento, ou melhor dizendo, na densidade energética (kW·h/m³). A melhor tecnologia de bateria existente ainda gera um componente de grande volume e massa (peso) elevados. E a melhor integração obtida até o momento é posicionando-o sob o assoalho, obrigando os engenheiros a desenhar veículos mais altos, resultando nos grandes suves que temos visto, que não são energeticamente eficientes. E na outra ponta da equação aparecem os carros urbanos com bateria menor e consequente menos alcance.
Ainda não chegamos no ponto ideal da mobilidade elétrica para substituir plenamente o motor a combustão interna, mas seguramente já passamos do ponto de não ser possível retornar (point of no return) e abandonar novamente a propulsão elétrica, a exemplo do que ocorreu no final da segunda década do século passado. Todos os fabricantes seguem investindo altas somas de dinheiro nessa pesquisa. Muitos já decretaram a data da morte do motor a combustão, e pararam todo desenvolvimento de motores térmicos. E o que ficou claro nessas avaliações da Electric Experience e nos bate-papos com outros colegas é que estamos vendo a chegada do futuro, assim como foi a chegada da televisão, do computador pessoal, do telefone celular, da internet, para citar as mais recentes.
GB
Fotos abaixo são do autor
Clique nas fotos com o botão esquerdo do mouse para ampliá-las e ler as legendas