Nossa história começa em Manaus, onde, já no início da década de 1990, um jovem manauara traçava seus planos que incluíam possuir a representação de uma companhia automobilística. Depois de pesquisar e participar de algumas concorrências, nosso protagonista acaba vindo para Jundiaí, SP Paulo onde constrói a sua revenda de caminhões e ônibus Volkswagen e começa a enfrentar as dificuldades num ramo que, na época, estava bastante difícil. Com determinação, trabalho e competência Marcus Valério Lins Barroso fez a sua empresa galgar à condição de referência entre as concessionárias congêneres.
Voltando no tempo, o Marcos lembrou que seu amor pelo Fusca vem de muitos anos, quando sua mãe o levava para a escola em um Fusca ’75 vermelho. Ele sempre quis ter um Fusca, mas que fosse especial, uma peça de coleção. Tanto que em 1986 ele se interessou por um Série Prata — que comemorou a primeira despedida do Fusca no Brasil, mas ele ainda não tinha nem idade para isto. Em 1996 ele cogitou comprar um Fusca “Itamar” Série Ouro, mas a falta de um lugar adequado para guardar o que passaria a ser um objeto raro de coleção fez com que ele desistisse.
O seu trabalho como concessionário Volkswagen abriu um apetite ainda maior por informações e dados sobre o seu antigo amor — o Fusca. Atento a tudo que ocorria no Mundo Volkswagen, no início de 2003, acendeu-se um alerta vermelho: a produção do Vocho, o Fusca mexicano, estava prevista para terminar em julho.
Ele imediatamente decidiu que desta vez, era a última oportunidade para fazer isto, e ele não deixaria de lutar para ter um Fusca diferenciado. Sim, só que agora um especialíssimo Última Série Mundial. Mesmo antes de saber se estes Fuscas viriam para o Brasil, muito menos quantos eles seriam, ele procurou a Volkswagen e se inscreveu como primeiro da lista de pretendentes, fato que, merecidamente, lhe rendeu algumas regalias.
Ele colocou um pedido firme no dia 28 de julho de 2003, dois dias antes da produção do derradeiro Fusca em Puebla.
Após um período de apreensão, as dúvidas foram dissipadas: viriam somente 15 carros para o Brasil, e um já era dele. Destes 15 carros, dez ficaram em São Paulo, dois no Paraná e os estados do Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Rio de Janeiro receberam um carro cada.
Uma grande sensação de alegria que logo deu lugar aos preparativos para receber o novo membro da família. Marcus, que é um importante colecionador de canetas-tinteiro raras, já tem uma grande experiência e sabe muito bem como tratar objetos especiais, e seu Fusca seria tratado como tal.
Primeiramente ele projetou e mandou construir um templo para preservar o seu sonho. Escolheu um nome significativo: Käfer Haus, ou seja, Casa do Fusca em alemão. O exterior da Käfer Haus é cuidadosamente decorado com pinturas muito bem executadas.
No portão da Käfer Haus, a ilustração de um antigo anúncio Volkswagen de uma série que foi publicada na revista americana LIFE. À esquerda na foto a reprodução da famosa propaganda “Think Small”, e à direita a reprodução de uma versão mais antiga do logotipo VW das concessionária. Ladeando a porta, dois mastros com as bandeiras da Alemanha e do México respectivamente. Acima da porta o nome Käfer Haus com o logotipo VW da época.
Fotos de detalhes da cuidadosa decoração da Käfer Haus, aliás feita com muito bom gosto:
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Não faltam as bandeiras da Alemanha e do México ao lado do portão, e, no interior, significativos pôsteres com dados sobre a trajetória do Fusca, propagandas e uma grande bandeira alemã na parede oposta à entrada.
Entrega demorada
Mas a entrega do carro estava demorando, os meandros dos documentos de importação foram alongando o prazo de recebimento do Vocho. Finalmente chegou o grande dia: em 16 de abril de 2004: um caminhão- cegonha com uma carga muito especial encostou na Destra Veículos, concessionária Volkswagen de Jundiaí.
O coração do Marcus Valério devia estar batendo a mil por hora. O Vocho cor azul Aquarius chassi número 3VWS1A1B44M904431, que acabara de chegar, é o 2.267º dos 3.000 que compuseram esta série especial. A emoção foi potencializada pelo fato de ele ser idêntico ao último Fusca fabricado no mundo e que está exposto na fábrica de Wolfsburg, na Alemanha.
O carro do Marcus Valério rodou o mínimo necessário para ser acomodado num caminhão-plataforma para percorrer os poucos quilômetros que o separavam do templo construído para a sua preservação. Chegando lá o velocímetro marcava 25 quilômetros rodados, número que, segundo o Marcus, devia continuar assim para sempre.
Seguindo a filosofia dele quanto ao seu Fusca, ele deixou de ser um carro para ser um importante objeto de preservação e culto. Com o passar do tempo, este carro, mantido zero-quilômetro passará a ser cada vez mais valioso.
A presença deste veículo histórico impressiona. Ainda protegido parcialmente por uma película especial usada para o transporte, o carro resplandece em seu templo. A pesquisa de detalhes foi muito interessante. A começar pela área envidraçada maior do que a de seu primo brasileiro, o Fusca “Itamar”, uma evolução de carroceira ocorrida em 1964 na Alemanha que lamentavelmente não tivemos aqui, ao contrário do México.
Também pudera, a carroçaria do Vocho equivale a de um Fusca alemão ano 1968, enquanto a do nosso parou na carroceria do modelo alemão até 1963. Os para-choques cromados dão um visual mais característico ao carro.
O velocímetro circular, com marcador de combustível incorporado, isto sim é o que combina com o Fusca, não o quadrado que equipou o modelo brasileiro e que se choca com as linhas arredondadas do carro.
Um interessante sistema de alarme com acesso por uma fechadura que fica na lateral esquerda dianteira do carro protege os Vochos, fato que é ressaltado por um adesivo no vidro lateral traseiro esquerdo. Um interruptor perto do fecho do capô dianteiro faz parte do esquema de alarme. Detalhes nas fotos abaixo.
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A saída do escapamento do Vocho fica na saia traseira e esta tem um abaulamento para alojar o catalisador. Já no Fusca “Itamar” a solução adotada foi instalar o silenciador embaixo do para-lama traseiro esquerdo, onde está a saída do escapamento.
Uma significativa diferença é o motor dotado de injeção eletrônica multiponto:
O Vocho já não tinha mais as saídas de ar que no Fusca ficam atrás dos vidros laterais traseiros.
As aberturas de entrada de ar na tampa do motor ocupam uma área maior no Vocho e não existe o emblema-logotipo VW sobre a carcaça da luz de placa como no Fusca “Itamar” (que foi uma coisa bem local mesmo).
A luz de placa também é diferente, pois possui um desenho em sua parte superior. É curioso observar que não foi instalado o cinzeiro para o passageiro de trás. As luzes de seta dianteiras migraram dos para-lamas para o para-choque, já visto em foto anterior.
Foram incorporadas características históricas de modelos anteriores de todas as épocas para valorizar esta série especial, como é o caso da versão moderna do brasão de Wolfsburg no capô dianteiro. Os pneus com faixas brancas largas remetem aos carros mais antigos.
Outro detalhe que fazia parte do pacote de saudosismo do Última Edición era os aros do farol cromados:
Lanterna traseiras tipo “Fafá”, com um friso cromado. Adicionalmente foi acrescentado um equipamento de som especial, com aparelho de CD, que nunca chegou a equipar Fuscas de série, e uma plaquinha comemorativa à última edição colada no canto esquerdo inferior da tampa do porta-luvas, que a meu ver deveria ser colocada também nas laterais dianteiras do carro.
Por falar na plaqueta comemorativa do Última Edición, o Marcus Valério me presenteou com uma delas que eu guardo com muito carinho. Ao menos eu tenho uma parte importante deste significativo carro comemorativo.
Como um brinde especial, os carros desta série têm o seu habitáculo integralmente revestido com material fonoabsorvente.
Fotos de alguns detalhes para complementar a matéria:
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O trabalho realizado para a preservação deste raro veículo ainda não tinha terminado, o Marcus iria tomar medidas complementares para que este carro permanecesse em condições de novo por muitos e muitos anos, permitindo que as gerações futuras pudessem ver um “testemunho vivo” de uma época gloriosa que foi o longo tempo em que o Fusca foi produzido no mundo.
Ele falou sobre o futuro: “O meu plano é ajudar a cultivar a imagem deste fenômeno chamado Volkswagen Sedan para que se possa passar para os mais jovens, aqueles que não tiveram o prazer ou o privilégio de acompanhá-lo de perto, vivendo, usando, dirigindo ou sendo passageiros de um Fusca, este sentimento para que não seja esquecido esse sentimento do que já passou. Pois nós precisamos saber de onde viemos para descobrir onde queremos chegar. E a história do Fusca é muito importante por isto”.
Mas… o tempo passou e muitos planos tiveram que ser mudados por contingências que foram ocorrendo. O Última Edición já não pertence mais ao Marcus Valério que, mesmo assim continua a ser um fã incondicional da marca Volkswagen e um defensor do Fusca.
O fato é que esta matéria levanta detalhes de um carro muito especial que marcou o fim da produção do VW Beetle no mundo, com isto a sua história está preservada aqui para os leitores e leitoras da nossa coluna “Falando de Fusca & Afins”.
Agradeço ao Marcus Valério por ter permitido esta memorável visita realizada no sábado, dia 22 de maio de 2004.
AG
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