Este é um assunto que já ocupou pessoas comuns, especialistas, jornalistas, psicólogos, etc. Acho que cada um deve ter a sua resposta, mas será que conseguimos achar uma resposta em conjunto?
Em 1996, James M. Flammang, autor do livro “VOLKSWAGEN, Beetles, Buses & Beyond” também se debruçou sobre o assunto e elencou vários aspectos que poderiam responder a esta pergunta. Certamente o foco dele foi para a realidade americana onde o VW Beetle disputou espaço com demais carros importados por uma fatia de mercado numa terra dominada pela poderosa indústria automobilística dos EUA.
A realidade brasileira é diferente, pois desde o início houve uma montagem local de VW Fuscas importados completamente desmontados (CKD), inclusive a carroceria, pela Brasmotor, que era complementada pela importação de unidades prontas. Logo depois veio a própria Volkswagen que iniciou montando também, para em poucos anos começar a fabricação local. Podemos dizer que desde o início tudo se passou como se o “VW Fusca fosse nosso”. Isto deu um forte sentimento de posse do carro na população — sim, o VW Fusca era um brasileiro de origem alemã.
Assim sendo é possível, que as razões que levaram tantos brasileiros a adorar o Fusca sejam diferentes daquelas elencadas por Flammang, e seria fantástico se, com esta matéria, pudéssemos descobrir as razões brasileiras da “adoração pelo VW Fusca”.
A adoração foi tão grande e imediata que o carro foi apelidado de Fusca ainda em meados dos anos 1950. Ficou tão conhecido por esse nome que a VW brasileira viria a adotá-lo como nome de modelo em 1983.
Como também temos leitores de outros países, quem sabe haja outras respostas que eles possam dar para esta pesquisa? Todas as contribuições serão bem-vindas.
Mas vamos conhecer o que o Flammang elencou como sendo os possíveis fatores da popularidade do VW Beetle nos Estados Unidos.
Por que o Fusca foi tão popular nos Estados Unidos?
Várias razões podem ser citadas para a grande popularidade do Fusca lá. É claro que muitos desses fatores também se aplicam a outros carros, sejam importados ou nacionais, pelo menos em algum grau. A questão a ser estudada é por que o Volkswagen, entre as dezenas de carros pequenos produzidos na Europa introduzidos no mercado norte-americano na década de 1950, foi um dos poucos que sobreviveram. Não só isso, mas por que foi o único a se tornar uma sensação de vendas? Quase desde o início, os Volkswagens ficaram conhecidos por possuir características tão atraentes como:
- Simplicidade — Em uma época em que os carros americanos estavam ficando mais potentes e complexos, o VW Beetle e vários de seus concorrentes transformaram a engenharia e o design simples em virtude, sem luxos, mas com bom senso. Disse Heinz Nordhoff, o diretor-superintendente da Volkswagen. em meados da década de ’50, a respeito de carros americanos950: “Quanto mais longos e elegantes eles os construírem nos EUA, melhor para nós”.
- Técnica — Aqui a Volkswagen se destacou, pelo menos na percepção das pessoas, como evidenciado pelo fato de que nenhum outro subcompacto alemão chegou perto do total de vendas da Volkswagen.
- Frugalidade — Claro, a economia de combustível era um “plus” da Volkswagen. Mas no mundo real, dezenas de carros importados pequenos tinham um consumo de combustível pelo menos tão bom quanto um VW — e muitas vezes melhor. Por que o VW Beetle conquistou esta reputação se nunca foi o nº 1 um em economia de combustível?
- Tamanho compacto — É verdade, mas muitos dos importados rivais, que não tiveram sucesso, eram aproximadamente comparáveis em dimensões.
- Singularidade — Nada jamais se pareceu, ou foi estruturado como, um VW Beetle. A Renault pode ter ficado mais próxima em design distinto e manuseio de motores traseiros com seu 4CV, mas a reputação francesa de qualidade de montagem inferior ao ideal dificultou as vendas. Psicólogos podem ter debatido se a forma de ovo de um Besouro trouxe impulsos maternos ou se teve algum tipo de tom sexual exagerado (eles tendiam a descobrir significados ocultos em muitos objetos comuns). Os proprietários simplesmente gostavam dele, e sentiam afeto por ele, houvesse ou não alguma dimensão profunda e oculta para sua adoração.
- Diversão — esse não é um termo que todos aplicavam ao típico carro pequeno dos anos 1950 e 1960, mas os VW Beetles realmente eram e ainda são divertidos de dirigir. Boa parte da diversão era o câmbio manual no túnel central, muito fácil de usar, apesar da preferência do consumidor americano pelo câmbio automático. De fato, um número surpreendente de fãs de carros esportivos se apegou a eles. A Road & Track se perguntou em 1954 porque, de todos os carros importados, o Volkswagen parecia ter “um apelo tão forte para o dono de carro esportivo — e para ex-proprietários de carros esportivos com família”.
- Facilidade de reparo — o Volkswagen construiu sua reputação em parte nesse fator, mas nem todos que trabalharam no VW Beetle concordam que eles eram tão fáceis de reparar assim. Claro, retirar um motor era feito num piscar de olhos. No entanto, quando os carros eram novos, alguns mecânicos independentes tentavam evitar trabalhar neles, especialmente na transmissão e suspensões. No outro extremo do espectro, muitos proprietários não inclinados à mecânica foram capazes de aprender uma série de métodos de reparo, desde substituir um cabo de acelerador partido até regular a folga de válvulas do motor — uma tarefa vital de manutenção periódica.
- Rede de Concessionários — A Volkswagen ficou na dianteira do pelotão nesta área. Já em 1954, a Volkswagen tinha uma rede invejável de 14 distribuidores regionais e mais de 300 revendedores, com técnicos de serviço especializados. “Nenhum Volkswagen”, disse o U.S. News & World Report em 1956, “era autorizado a ser enviado para um país estrangeiro até que um sistema completo de manutenção, reparo e peças de reposição fosse instalado naquele país”.
- Comportamento não melindroso — Carros estrangeiros na década de 1950 eram amplamente considerados não confiáveis, complicados, delicados e sujeitos a falhas bizarras. O Volkswagen ganhou rapidamente uma reputação de confiabilidade e operação previsível.
- Ausência de obsolescência programada — Mesmo antes de os anúncios divulgarem a forma imutável do VW Beetle e os detalhes técnicos familiares, as pessoas sabiam que todo Besouro parecia e se comportava da mesma forma. “Você pode imaginar um Volkswagen com rabo de peixe?” a empresa perguntou retoricamente em 1957.
- Melhoria contínua — Esta frase não entrou no mercado automobilístico como um chavão da indústria até a década de 1990, mas a VW adotou esse louvável conceito desde o início.
- Alto valor de revenda — Ao contrário da grande maioria dos carros importados, os Fuscas mantiveram seu valor surpreendentemente bem. Um VW de segunda mão demandava quantias inéditas, não tão distantes de seu preço de venda quando novo. Quem não gostaria de um carro que ainda valesse muito quando chegasse a hora de trocá-lo ou vendê-lo?
- Charme — Os críticos podem ter chamado o VW Beetle de “patinho feio”, um dos carros mais feios do mundo, mas isso não impediu que milhões de proprietários se apaixonassem por seu formato e sua função, inclusive pela ausência de grade do radiador. Charme não é fácil de definir em uma pessoa, muito menos em uma máquina, mas o VW Beetle o possui em quantidade. Até mesmo o som distinto de seu motor e escapamento, e o gemido abafado de sua caixa de câmbio, somavam-se ao charme do Fusca — não muito diferente das mesmas características do Ford Modelo T. A revista Life não estava sozinha ao apelidar o Volkswagen de “um membro da família que por acaso mora na garagem”. Mais tarde, na década de 1970, a Volkswagen of America chamou o VW Beetle de “uma das poucas coisas mecânicas que traz à tona o senso de capricho e até afeição de uma pessoa”.
- Cacife — Sedãs importados comuns eram tipicamente conduzidos por pessoas relativamente comuns. Acadêmicos e intelectuais chegaram cedo ao “rebanho” da Volkswagen. Assim como as celebridades. Que outro veículo de baixo preço, importado ou doméstico, poderia ostentar uma lista de proprietários variando do comentarista William F. Buckley Jr. ao ator Paul Newman? Volkswagens eram populares no governo Kennedy, por sua baixa ostentação.
- Camaradagem e experiência compartilhada — “Quando você compra um Volkswagen”, escreveu o Dr. Jean Rosenbaum em seu livro ‘Seu Volkswagen é um símbolo sexual?‘, “você não ganha apenas um carro; você também adquire muitos amigos entre outros proprietários de Volkswagen. O Volkswagen é um modo de vida.”
Agora é com vocês
Já conhecemos os aspectos levantados pelo Flammang, e agora é com vocês. Sua participação nesta enquete pode ser feita diretamente na área de comentários (Disqus) logo abaixo ou através de meu e-mail alexander.gromow@autoentusiastas.com.br . Quem sabe poderemos complementar e/ou comentar a lista acima com as contribuições recebidas. E assim ter uma resposta o mais completa possível quando nos perguntarem: “Por que razão o Fusca é tão adorado?”
Uma propaganda que fala tudo
Ainda no contexto dos itens levantados pelo Flammang, em especial sobre o aspecto de confiabilidade, ele colocou a propaganda abaixo, de 1970, em seu livro. Apesar da letrinha pequena eu consegui copiar e traduzir o texto. Esta é mais do que uma propaganda, é uma descrição de como os carros eram atualizados ao longo do tempo, mesmo mantendo a mesma aparência. É uma propaganda para quem se interessava mais pela parte técnica do que por fotos bonitas e intrigantes; ela ajudou a consolidar a confiança na marca Volkswagen:
Tradução do texto da propaganda:
A prática leva à perfeição.
E prática tivemos bastante.
Você acreditaria em 12 milhões de Volkswagens em todo o mundo? Ou 3½ milhões aqui nos EUA?
E de certa forma, cada VW que fazemos é um pouco melhor do que o que fizemos antes. Porque não forçamos a barra fazendo falsas melhorias a cada 12 meses.
Em vez disso, fazemos cerca de 5.000 mudanças todos os anos, sobre as quais nem falamos. Simplesmente fazemos o que precisa ser feito para que o VW funcione melhor o tempo todo.
Para não parecer diferente o tempo todo.
Então, o que temos para mostrar em 25 anos?
Apenas o carro mais desenvolvido na estrada.
Pegue qualquer Volkswagen antigo de qualquer ano antigo, ainda será hermético.
Nunca soubemos fazer de outra maneira, e ainda não sabemos. Ainda ajuda abrir uma fresta na janela para fechar uma porta, mesmo em um dos antigos.
Pegue qualquer Volkswagen novo.
Se houver um arranhão na pintura ou no cromo, alguém o colocou lá. Não fomos nós.
Você não encontrará uma confusão de fios sob o painel. Apenas aço liso e pintado. Sob o capô? Brilhante e liso.
Ao redor do motor? Brilhante e liso. Mesmo se você removesse o painel da porta, você encontraria o mesmo. Lisos e brilhantes, se você visse como os fizemos, saberia por que isso é verdade.
Um em cada oito funcionários da VW é um inspetor. E o inspetor chefe se reporta ao chefe da empresa, não ao chefe de vendas.
Apenas uma outra fabricante no mundo faz isso, seus preços começam em US$ 5.000.
Todos os aros de roda que produzimos são inspecionados, 100% deles. Cada tambor de freio. Cada tanque de gasolina.
Cada motor é acionado antes de se tornar parte do carro. E depois.
Cada peça que tem a ver com segurança é inspecionada individualmente e depois é carimbada individualmente com as iniciais do inspetor.
Também temos inspetores que inspecionam inspetores. E até que um homem faça tudo certo, não o deixamos colocar as mãos no trabalho.
Quando um VW chega ao fim da linha de montagem, um inspetor verifica o motor, o sistema elétrico, os freios e tudo o mais que faz um VW parar e andar, e se o carro entrega o que nós colocamos nele.
Fabricamos 5.000 carros por dia; inspecionamos 5.000 carros por dia.
Falando em testes, temos 2 pistas de teste que são literalmente um inferno sobre rodas. Com colinas e vales e curvas fechadas e trechos de paralelepípedos que simplesmente não são encontrados nas estradas americanas.
Mudando na maneira como mudamos e testando na maneira como testamos, o Volkswagen que vendemos hoje é uma máquina totalmente diferente.
Ao longo dos anos, praticamente dobramos a potência do VW, mas o motor deve durar ainda mais. O espaço de bagagem em novos Volkswagens é maior. O carro é mais silencioso e anda melhor. Você pode obter um VW sem pedal de embreagem hoje em dia e ainda ter o consumo de 25 milhas por galão (N.d.T.: 10.6 km/l).
Acrescentamos pequenas coisas atenciosas como uma bolsa de porta para o motorista. Como pequenos fios que descongelam eletricamente o vidro traseiro. Como uma proteção pop-up para proteger o painel de instrumentos quando você desliza o cinzeiro para fora. E, felizmente, ainda podemos vendê-lo a você por apenas $1839.
Mas quando aceitamos seus US$ 1.839, lhe damos juros sobre seu dinheiro por não perder o interesse em seu carro.
Somos as únicas pessoas do mundo automobilístico com o Medi-car, o Sistema de Diagnóstico Volkswagen.
Como parte de nossa loucura contínua, oferecemos 4 check-ups gratuitos, de cima para baixo, quando você compra um VW novo.
Basta você manter seu carro de acordo com o cronograma de manutenção da Volkswagen. Se alguma peça de fábrica apresentar defeito de material ou de fabricação, qualquer revendedor VW dos EUA ou do Canadá irá repará-la ou substituí-la, dentro da validade de 24 meses ou 24.000 milhas, o que ocorrer primeiro. E ele fará isso gratuitamente.
Resumindo, o que a Medi-car encontrar como sendo coberto pela nossa garantia é consertado gratuitamente.
Todos os revendedores VW tem este equipamento eletrônico, o Medi-car, e se você já possui um VW, você pode obter os check-ups de seu carro por apenas alguns dólares.
Sobre esse assunto, se você possui um Volkswagen mais antigo (mesmo um ’49), e precisa de uma peça, não se preocupe. Você pode dirigir-se a qualquer concessionário VW, e ele não levantará uma sobrancelha. Ele vai parabenizá-lo e consertar seu carro. Porque a maioria das peças da VW, mesmo atualizadas com o tempo, ainda se encaixam na maioria dos Volkswagens.
Deixamos que outras pessoas façam seus carros maiores e menores, mais altos e mais baixos. Nós apenas continuamos fazendo os nossos por mais tempo.
AG
NOTA: Nossos leitores são convidados a dar o seu parecer, fazer suas perguntas, sugerir material e, eventualmente, correções, etc. que poderão ser incluídos em eventual revisão deste trabalho.
Em alguns casos material pesquisado na internet, portanto via de regra de domínio público, é utilizado neste trabalho com fins históricos/didáticos em conformidade com o espírito de preservação histórica que norteia este trabalho. No entanto, caso alguém se apresente como proprietário do material, independentemente de ter sido citado nos créditos ou não, e, mesmo tendo colocado à disposição num meio público, queira que créditos específicos sejam dados ou até mesmo que tal material seja retirado, solicitamos entrar em contato pelo e-mail alexander.gromow@autoentusiastas.com.br para que sejam tomadas as providências cabíveis. Não há nenhum intuito de infringir direitos ou auferir quaisquer lucros com este trabalho que não seja a função de registro histórico e sua divulgação aos interessados.
A coluna “Falando de Fusca & Afins” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.