Há anos, sem exagero, o assunto seta é discutido nos comentários entre os leitores e eu. Vejo constantemente dizerem que muitos motoristas não dão seta ao mudar de faixa, como se fosse algo lamentável, sempre com o argumento de ser potencial causa de acidentes.
Tenho procurado explicar que a seta não á autorização incondicional para essa manobra tão comum, mas informação de intenção de efetuá-la. Não estou inventando nada, apenas seguindo um preceito do Código de Trânsito Brasileiro em seu art. 29, inciso XI, que diz:
“Todo condutor, ao efetuar a ultrapassagem, deverá:
a) indicar com antecedência a manobra pretendida (meu grifo), acionando a luz indicadora de direção do veículo ou por meio de gesto convencional de braço;
……
c) retomar, após a efetivação da manobra, à faixa de trânsito de origem, acionando a luz indicadora de direção do veículo (meu grifo) ou fazendo gesto convencional de braço, adotando os cuidados necessários para não pôr em perigo ou obstruir o trânsito dos veículos que ultrapassou;”
A regra faz sentido, mas peca no conceito, uma vez que se a diferença de velocidade entre os veículo for grande é desnecessário informar ao motorista do veículo ultrapassado essa mudança de faixa, que é obrigatória e que lamentavelmente muito descumprem. Eu cumpro sempre, não por obediência ao Código, mas por ser didático, ensinar que se deve voltar para a faixa de origem depois da ultrapassagem. Especialmente se o veículo que ultrapassei tiver “comprado” a faixa da esquerda, outro grande mal do nosso trânsito.
Muito bem, falou-se de ultrapassagens, mas, e a questão das faixas, foco das discussões?
Ela está no mesmo art. 29, inciso XIII, § 1º: “As normas de ultrapassagem previstas nas alíneas (…) e a e c do inciso XI aplicam-se à transposição de faixas (meu grifo), que pode ser realizada tanto pela faixa da esquerda como pela da direita.
Isso deixa claro que nas mudança de faixa o uso da seta é obrigatório, deixar de fazê-lo é infração grave, 5 pontos na CNH e multa de R$ 195,23.
Obrigatório, mas será mesmo necessário? Não é. Esse “automatismo” de dar seta gera distorções.
Por exemplo, canso de ver motoristas “costurando” da maneira aloprada entre várias faixas — três, quatro — dando seta continuamente para um lado e para outro como se isso liberasse o comportamento condenável. Nem vou falar de acidentes, mas de uma atitude desordeira no trânsito.
A coisa complica quando até a autoridade de trânsito, no caso a Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo (CET-SP), erra fragorosamente quando exibe nos painéis eletrônicos a mensagem “Dê seta ao mudar de faixa”, deixando implícito que basta ligar o dispositivo e passar para outra faixa. A CET-SP pelo menos devia instruir “Dê seta antes de mudar de faixa”.
O “conselho” da CET-SP não só é errado como leva a bizarrices como um inventor que bolou uma conexão mecânica entre o volante e a alavanca de seta de tal maneira que, ao esterçar para mudar de faixa, a seta ligue junto. Houve quem aplaudisse a “invenção”…
A seta tem grande utilidade sim, como ferramenta para indicar intenção dessa manobra, de maneira a estimular a cortesia de facilitar o veículo que está sinalizando a troca de faixa, embora haja verdadeiros espíritos de porco que aceleram ao verem a seta ligada calcados no pensamento torpe “na minha frente ninguém entra”, como se perder quatro ou cinco metros na vida fizesse alguma diferença. Nesse caso é esperar que outro carro na coluna de tráfego conceda a mudança de faixa, e isso ocorre com frequência.
Informar o tráfego à volta é muito importante para a harmonia e a segurança do trânsito quando for realmente necessário dar essa informação. Caso de em zonas povoadas permitir que pedestres saibam para onde o carro está indo, como ao dobrar uma esquina. Mas não havendo transeuntes, e consultado o retrovisor não há veículo próximo, não há necessidade de ligar a seta. Chamo isso de uso consciente da seta, que tem a vantagem de manter o motorista atento ao que se passa à volta, um dos pilares para o dirigir seguro e, obviamente, evitar acidentes.
Na estrada, por exemplo, pretende-se efetuar uma ultrapassagem e o espelho informa que não há veículo perto: qual a necessidade de dar seta? Ou então vai-se parar num posto: há quem ligue a seta 500 metros antes da saída, combinado com reduzir bastante e desnecessariamente a velocidade na faixa da direita ou até na faixa exclusiva para desaceleração.
E o pior dos mundos no uso desnecessário da seta, que é com o carro parado na cidade. Como aquela luz piscando sem necessidade, especialmente à noite, incomoda. Isso é muito comum nas faixas exclusivas e obrigatórias para dobrar à esquerda com controle semafórico. Enquanto aguarda o verde há quem deixe a seta ligada, desnecessariamente, pois só é possível dobrar para aquele lado. Ou num cruzamento semaforizado deixar a seta ligada enquanto espera o verde para indicar a mudança de via pretendida quando o sinal abrir. Mas nesse caso, e curiosamente, tenho notado que esse mau hábito está diminuindo.
Há também o hábito alemão — hábito porque lá é proibido mas é muito usado — de ficar atrás de um carro com a seta esquerda ligada para pedir passagem: é prático porque o piscar é percebido pela visão periférica do motorista do carro à frente, seja no espelho interno ou externo esquerdo, mas como toda luz repetitiva, incomoda. O melhor é deixar a seta ligada por alguns segundos, desligar, ligar de novo, sucessivamente, assim chama mais a atenção.
Uso da seta, só consciente. É bom para todos.
BS