A coluna do Fernando Calmon desta semana versou sobre a questão importante que é o padrão de mão de direção e o carro ser adequado para tanto. Para nós é impensável dirigir no banco da direita e todos deveriam ter essa experiência pelo menos uma vez.
Só fui tê-la em 1985 quando trabalhava na VW. Estava no meu escritório na Ala Zero, térreo, quando escuto uma buzinada, olho para fora e ela vinha de um Santana bege, sem o motorista no lugar que se espera ver: era meu chefe Ronaldo Berg com um Santana de volante na direita, carro de estoque não licenciado mas com placa de fabricante, chamando-me para darmos uma volta.
A primeira estranheza foi entrar pela porta direita para dirigir. Depois, ver um passageiro à minha esquerda. Muda completamente a perspectiva, é como estar vendo tudo num espelho. A questão dos membros superiores e inferiores não muda, é tudo igual exceto na operação da alavanca de câmbio ser feita com a mão esquerda. Mesmo eu sendo canhoto, o que sem dúvida facilita o novo condicionamento, afastar a alavanca de mim para o lado esquerdo para achar o canal de 1ª-2ª foi mesmo estranho. Analogamente, trazê-la para perto de mim para engatar a 5ª. Sem dúvida essa transição inexiste quando o câmbio é automático.
Mas tem mais. Consultar o tráfego na faixa adjacente e olhar para a direita causa certa espécie, bem como ao escutar uma buzina atrás e instintivamente olhar para o espelho interno virando a cabeça para a direita, quando precisa ser para a esquerda. Fora esses aspectos, entretanto, é bem fácil, ou melhor, meio-fácil, porque a mão aqui é na direita. Ultrapassar numa via de mão dupla, por exemplo é complicado pela visão insuficiente do tráfego contrário.
Nesse ponto a coisa fica no “novo normal” ao se dirigir num país de mão esquerda. Foi o que aconteceu quando eu e o fotógrafo Sílvio Porto, ambos da Quatro Rodas, fomos à Inglaterra para um programa da Land Rover que incluiu ir à fábrica em Solihull., bem próxima a Birmingham, distante 200 quilômetros de Londres . Agora estava tudo no lugar, novamente dou o exemplo do espelho: é como tudo fica diante dos olhos.
Mas há dois problemas. Um, passar ao lado de um ciclista que pedala no extremo esquerdo da rua, quanto “tirar” o carro para fazer a manobra com segurança, pois não temos a mesma percepção de distância lateral que exercitamos aqui. Precisei tomar extremo cuidado para passar com segurança sem invadir a faixa contrária.
O outro problema, ou problemão, foi estar justamente no país das roundabouts, ou rotatórias, e me concentrar no fato de que o tráfego nelas gira em sentido horário.
Mas todo esse condicionamento é rápido. Dirigi Defender e Range Rover e ao fim do primeiro dia já tinha a minha mente pronta para o dirigir “espelhado”. Nem parecia um neófito dirigindo um carro de volante na direita.
Em Nice
Na manhã do quarto dia, cedo, eu e o Silvio pegamos um voo para Nice, no sul da França, para o lançamento do Peugeot 405 T16 2-litros de tração integral. Do aeroporto fomos direto para o local do lançamento ali perto. Chegamos minutos antes da longa e ótima apresentação técnica para, em seguida, pegarmos um dos carros para o test drive pela belas estradas da região.
Recebemos a chave e nos dirigimos para o nosso 405 T16 no estacionamento. Ao entrar no carro abri a porta direita! O Sílvio `Porto ainda brincou, “o que é isso, Bob, ficou doido?”. Deu-me uma confusão mental momentânea, para mim continuávamos na Inglaterra…
Essa experiência me mostrou por que os ingleses acham que nós dirigimos no lado errado!
Off-side, near-side
Há poucos anos eu estava vendo os carros do Boris Feldman na casa dele em Brumadinho, na Grande Belo Horizonte, e ao admirar o belo Jaguar E-Type drophead (conversível) dele, com rodas raiadas e de fixação central por porca-borboleta, vi nelas a informação de sentido de aperto/desaperto com setas indicativas. Na primeira porca que vi, no lado esquerdo estava escrito near-side e a respectiva seta para aperto, sentido horário. Fui para o lado direito e estava escrito na porca-borboleta off-side, aperto em sentido anti-horário.
Lógica dos britânicos: near-side (próximo à calçada no sistema de mão de direção deles) e off-side (afastado da calçada). Foi então que deduzi o porquê de, no futebol, impedimento se chamava off-side, conforme conheci nos tempos de criança: um jogador estar além do jogador do time adversário…
Outro assunto
Para não usar o intertítulo de “propriedade” da querida colunista Nora Gonzalez, o “Mudando de assunto”, esta semana vi na av. 23 de Maio uma faixa educativa da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET-SP) ficada no gradil de viaduto que dizia: “Motorista, use sempre a seta antes de mudar de faixa”.
Veio-me a doce sensação de dever cumprido tantas as vezes que critiquei a instrução educativa — errada — nos painéis eletrônicos do mesmo órgão de trânsito: “Dê seta ao mudar de faixa”.
BS