Na semana que passou a na anterior a mudança de gênero do utilitário Kombi deu o que falar.
Até entendo a indignação de muitos, já que mudanças de velhos hábitos são de difícil aceitação. No entanto, mesmo assim hábitos podem ser mudados, basta querer.
Faz algum tempo que o AE ataca essa questão de gênero dos carros e muitos leitores parecem tê-la aceito. Uma bem antiga, a Ferrari (carro) já está sacramentada como o Ferrari) e não tem gerado reclamações. Mas ontem mesmo, no GP do Bahrein de F-1, o meu sangue fervia cada vez que o ótimo narrador da TV Band, Sérgio Maurício, falava “a Ferrari de Leclerc” ou “a Mercedes de Hamilton”, entre outros “a”.
A campeã de indignações sobre este assunto é, sem nenhuma dúvida, Kombi ter passado a ser tratado no gênero masculino aqui no AE, o Kombi. O que nos levou a isso é o fato de no seu país de origem ser chamado de Transporter — masculino, Der Transporter — e “Kombi” ser forma abreviada de Kombinationsfahrzeug, veículo de uso combinado. Não há razão para ser “a”, nem mesmo o fato de ser conhecida como perua (tipo de veículo), nome esse de origem desconhecida e por isso banido do AE faz pouco tempo.
Isso não quer dizer que todo mundo precise passar a falar “o Kombi”, a língua falada não precisa necessariamente acompanhar a escrita, embora devesse. O âncora do Jornal Hoje, da TV Globo, César Tralli, fala sistematicamente “a gente volta num instante”, quando até o telespectador iletrado entenderia se ele dissesse “voltaremos num instante”; O pior é que já vi pessoas escreverem “agente”…
Por falar em televisão,, a preguiça parece estar ganhando terreno no meios de comunicação ao se trocar nomes de cidades e programas por siglas formadas por pelas iniciais deles, como ‘beagá’ (Belo Horizonte) e ‘jotaagá’ (Jornal Hoje). E além do inadequado “Floripa’, desnecessário dizer o que é, há a horrorosa e errada abreviação de Brasília, DF como BSB, que em nada corresponde ao nome da capital federal, já que é simplesmente o código do Aeroporto Internacional de Brasília. Vi recentemente a senadora e presidente do Partido dos Trabalhadores. Gleisi Hoffmann, escrever BSB no Twitter referindo-se aos acontecimentos em Brasília no domingo 8 de janeiro.
Um bom exemplo de atribuir indevidamente gênero feminino é nos carros de corrida de turismo chamados de carretera. É uma categoria argentina chamada Turismo Carretera ou Turismo Estrada em português — carros americanos das décadas 1930 e 1940 extensamente preparados, receita que chegou aos estados sulinos, especialmente o Rio Grande do Sul. Esses caros ficaram mais conhecidos pela maciça presença na primeira Mil Milhas Brasileiras, em novembro de 1956, disputada em Interlagos, vencida justamente por um carretera Ford pilotado pela dupla gaúcha Catharino Andreatta e Breno Fornari.
Essa troca de gênero possivelmente resulte da crença de que palavras terminadas é ‘a’ são femininas, em ‘o’, masculinas. Há muitos anos li matéria na revista americana Time sobre criminalidade no Brasil em que certo marginal, o White Hand teve seu apelido traduzido e colocado entre parênteses, Mão Branco.
Talvez o fatídico ‘a’ tenha levado muitos a escrever e falar a Romi-Isetta…
BS
(Atualizada em 7/03/23, às 15h35, o eventos em Brasília ocorreram em 8 de janeiro e não 8 de março)
A coluna “O editor-chefe fala” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.
Nota: Esta coluna é publicada normalmente todo domingo.