Como é fácil supor, esse dia, em 1994 era domingo. Foi o dia escolhido pela Ford para apresentar o Taurus à imprensa, em São Paulo. Era o Taurus de primeira geração, lançado nos EUA em dezembro de 1985 como ano-modelo 1986. Aqui o sedã médio tinha motor V-6 transversal de 3,8 litros, comando no bloco, 140 cv a 3.800 rpm e 29,7 m·kgf a 2.400 rpm, câmbio automático epicíclico de quatro marchas,, tração dianteira.
Para nós era grande novidade, pois não se importavam automóveis desde 1976, medida do governo Ernesto Geisel para poupar as divisas que nos eram vitais para importar 80% do petróleo que necessitávamos, cujo preço se tornara pesado para o Brasil após a crise do petróleo de 1973. As importações haviam sido retomadas há relativamente pouco tempo.
Em 15 de março de 1990 tomava posse, como 32º presidente do Brasil, Fernando Collor de Mello. Entre várias mudanças tomadas no campo econômico, automóveis voltavam a poder ser importados sem restrições e, poucos se lembram, acabava a vexaminosa frase nos cartões de crédito: Valid only in Brazil.
A apresentação do Taurus foi no Novotel Morumbi, de onde era fácil alcançar a marginal do rio Pinheiros para dirigir o novo Ford à vontade, em especial sendo domingo.
Os carros foram colocados à nossa disposição para dirigi-los às 9h00, mas permaneceram estacionados: todos os jornalistas estavam no saguão do hotel à volta de um televisor de 19″ para assistir à largada do 14º Grande Prêmio de San Marino, em Imola, no Autódromo Enzo e Dino Ferrari.
O fim de semana começara trágico. Rubens Barrichello havia se ferido gravemente sexta-feira em acidente com seu Jordan-Hart e o austríaco Roland Ratzenberger perdia a vida com seu Simtek-Ford. Presságios nada otimistas.
Era o primeiro ano de Senna na Williams, ele era o pole-position dessa que era a terceira prova da temporada, ainda não havia pontuado no Brasil e no Japão. Ao seu lado na primeira fila estava Michael Schumacher em seu Benetton-Ford.
Após a largada Senna manteve a liderança com Schumacher logo atrás, mas lá atrás o finlandês J. J. Letho (Benetton-Ford) ficou parado e o português Pedro Lamy não viu, ocorrendo forte batida. Não se feriram, mas seis espectadores tiveram ferimentos leves quando uma das rodas pulou o alambrado e os atingiu. O carro de segurança interveio.
E nós assistindo a tudo isso no saguão do hotel. A relargada, desnecessário comentar o choque que foi para nós. O lançamento do Taurus acabou ali. Tentei experimentá-lo, mas não deu. Ignorei meu dever de editor de testes e técnica da revista Autoesporte. Dirigiria o carro em outro dia.
Cheguei em casa por volta de 12h30, obviamente arrasado. O que vejo? Meu filho de nove anos no videogame “pilotando” em Imola. Ficou ali, no seu quarto, mudo, até a hora de dormir.
Sem querer, ele usou a tática que conheci no filme “Grand Prix”, de 1966, quando o personagem principal, piloto da Ferrari Jean-Pierre Sarti (Yves Montand) diz “Quando vemos um acidente aceleramos mais, muitos aliviam o acelerador nesse momento”.
BS