Os anos 1990 marcaram a volta da importação de carros no Brasil, suspensas em 1976 como reflexo de crise do petróleo de três anos antes. O presidente Fernando Collor de Mello, eleito em 1989 e empossado em 15 de março de 1990, depois de chamar publicamente os carros aqui produzidos de “carroças” — exagero na opinião de muitos —, decidiu reabrir as importações. Os carros importados foram onerados com imposto de importação (II) de 35% (alíquota máxima estabelecida pela Organização Mundial de Comércio) e com imposto sobre produtos industrializados (IPI) de 70%.
Mesmo com o elevado ônus tributário e os altos preços resultantes, o que se viu foi uma uma verdadeira enxurrada de carros inéditos aportando aqui. Foi, sem dúvida, uma época de muito enriquecimento daquele pobre e restrito mercado brasileiro. De uma hora para outra tínhamos o Brasil cheio de Audis, Alfas, BMWs, Ferraris, Mercedes-Benz, Porsches e outras joias raras que rodavam pelo mundo e que só víamos nas fotos. A internet ainda era incipiente.
Para essa lista, usei os mesmos critérios das matérias dos nacionais (leia aqui e aqui): o melhor da década, o coadjuvante, e o conceito mais interessante dos anos 1990, 2000 e 2010.
Anos 1990
Sinceramente, essa foi a década mais difícil de chegar nos finalistas, já que foram tantos carros bacanas que dirigi nesses dez anos, que escolher o mais legal me tomou tempo. Mas, no final, quem superou todos foi o Honda Civic VTi, um hatch endiabrado com seus 160 cv a 7.600 rpm extraída de um pequeno motor 1,6-L de aspiração natural! A verdadeira fera tinha o corte de giro a 8.400 rpm, fazendo inveja a muito motor de corrida.
O carrinho tinha um design meio estranho, mas contava com recursos bons como a eficaz suspensão independente nas quatro rodas e um desempenho que colocava carros de maior cilindrada para comer poeira. O segredo do motor estava no comando variável VTEC desenvolvido pela Honda na F-1. Para não dizer que era 100% perfeito, faltavam no hatch esportivo freios à altura, já que aqueles de fábrica passavam longe de serem bons. Mas era um carrinho nervoso, que gostei tanto a ponto de comprar um no começo dos anos 2000.
Um outro carro que marcou a década de 1990 para mim, talvez por ter sido um dos primeiros a chegar ao Brasil quando as importações foram liberadas, foi o potente Alfa Romeo 164. Não estávamos acostumados, até então, com um carro com tantos recursos e aquele design Pininfarina classudo que impressionava. O 164 tinha no cofre o motor V-6 3-litros transversal de 192 cv que, para impressionar ainda mais, dispunha de coletores de admissão cromados que literalmente brilhavam quando se abria o capô. Um sedã grande, espaçoso, com suspensão independente nas quatro rodas e que mesmo tendo tração dianteira, a antítese de Alfa Romeo, tinha uma dinâmica de curva exemplar, além da pompa de poucos, tirando que custava absurdos US$ 130 mil.
No conceito de ideias bacanas, alguns representantes me marcaram nos anos 1990, tanto que preferi escolher dois. Uma verdadeira paixão que tenho até hoje é o Renault Twingo, pelas soluções implantadas na indústria automobilística mundial em uma carroceria menor que a do atual Kwid. O carro de quatro lugares acomodava muito bem todos graças ao recurso do banco traseiro que corria sobre trilhos, e a grande área envidraçada se refletia em um interior claro e com maior sensação de espaço. Além disso, seu para-brisa bem inclinado aumentava a sensação de amplitude para os ocupantes, sem contar o painel digital central que democratizava as informações para todos a bordo. Um hatch pequeno e econômico com seu 1,2-L de 55 cv (parente do CHT), mas muito versátil. Para mim, até hoje não existiu outro igual no Brasil.
Mas eu não poderia deixar de falar também do Toyota Prius, que, em 1997, fui conhecer no Japão. Era o primeiro híbrido da história, e, para a época, ficava boquiaberto sabendo que aquele carro tinha dois motores, um elétrico e outro a combustão. Parecia bruxaria! Guiei o Prius na pista de testes da Toyota, com o Monte Fuji como pano de fundo, e adorava acompanhar pela telinha digital aquele diagrama do seu complexo funcionamento. Hoje a tecnologia híbrida é comum, mas, para os anos 1990 era tão revolucionária que alguns colegas a colocavam em xeque. Deu certo, e muito!
Fora da trinca de categorias que escolhi, vale a menção de algumas voltas com um Fórmula 3000 no Autódromo de Curitiba, no Paraná, em 1993. O carro tinha em seu currículo o vice-campeonato da categoria em 1991, nas mãos de Alessandro Zanardi, perdendo apenas para Christian Fittipaldi. Além do desempenho que assustava, o 3000 parecia um Fórmula 1 com limitações no número de rotações do motor. Um F-1 virava a 12 mil rpm, e um 3000 não passava de 9 mil giros. Preparado pela japonesa Mugen, o motor tinha cerca de 400 cv e era muito nervoso, o que me deixou fazer o carro morrer na saída por umas três vezes, tamanha a sensibilidade dos pedais. Inesquecível!
Na próxima semana, não perca a segunda parte dessa lista, incluindo os integrantes dos anos 2000 e 2010!
DM
A coluna “Perfume de carro” é de exclusiva responsabilidade do sue autor.