Desde a antológica disputa entre Nélson Piquet e Ayrton Senna na corrida de 1986 e o triunfo de Esteban Ocon em 2021, o GP da Hungria é conhecido por oferecer momentos inusitados e um particularmente triste para a imprensa brasileira. Sob uma ótica mais leve, no ano passado Lando Norris criou uma situação embaraçosa ao derrubar o troféu (foto de abertura) do vencedor, Max Verstappen, que quebrou-se por ter sido construído em porcelana. O piloto holandês defende a liderança do campeonato neste fim de semana, quando será disputada a 13ª. etapa da temporada 2024.
Circuito inaugurado em 1986, a pista localizada 24 km a noroeste da bela capital Budapeste, o circuito que marcou a expansão da F-1 foi projetado pelos arquitetos Ferenc Gulácsi e Istvan Papp e construído no município de Magyorod, na época uma pequena vila e atualmente uma urbanização que remete aos condomínios construídos à beira de grandes cidades, mas ainda pródigos em paisagens campestres. Essa prova marcou o início expansão da F-1 rumo ao Oriente e aconteceu cinco anos depois da dissolução da União Soviética, união de países do leste europeu e Ásia comandada por Moscou.
Além da inesquecível ultrapassagem de Piquet sobre Senna no final da reta dos boxes, o primeiro GP da Hungria ficou marcado para a imprensa brasileira por um motivo triste. Janos Lengyel, húngaro que emigrou para o País em 1940, aos 19 anos de idade, firmou-se como um dos grandes correspondentes brasileiros no Exterior e cobriu durante anos as temporadas de F-1. Pessoa generosa e afável, Lengyel transformou-se em um importante fonte de informação para os colegas locais, o que lhe impôs um ritmo de trabalho extenuante para quem já estava com 67 anos, a maioria deles fumando intensamente. Na semana da corrida sofreu dois ataques cardíacos, o segundo forte o suficiente para interná-lo na UTI de um hospital local. Na segunda-feira após a corrida, alguns jornalistas brasileiros foram visitá-lo, inclusive este colunista. Bem provável que eu tenha sido o último profissional de imprensa a falar pessoalmente com Janos: alguns dias depois ele foi trasladado para Genebra, onde vivia com a esposa Nina, e faleceu em seguida.
Pista estreita e travada que se estende por 3.973 metros sobre as colinas de Magyorod, Hungaroring tem raros pontos de ultrapassagem: o final da reta e a curva 2, poucos metros à frente são praticamente os únicos. Sobre o asfalto não faltam episódios marcantes. Após sagrar-se campeão mundial em 1986 pela Williams, no ano seguinte Damon Hill passou a correr com um Arrows-Yamaha, equipamento que se mostrou pouco ou nada confiável. Na Hungria, porém, Hill liderou 62 das 77 voltas da prova e só perdeu a posição quando o motor do seu carro p perdeu rendimento a uma volta do final. Jaques Villeneuve venceu a prova e deu um passo importante para conquistar o título.
Rubens Barrichello disputava posição com Michael Schumacher na corrida de 2010 e o alemão não facilitava a vida do brasileiro, que seguia com seu Williams-Cosworth no vácuo do Mercedes do alemão. Após uma convivência um tanto esquisita que os dois tiveram na Ferrari, Rubinho resolveu peitar a agressividade de Schumacher e por muito pouco os dois não bateram feio. A manobra rendeu uma punição pós-corrida para o heptacampeão mundial, que nessa altura dos acontecimentos já vivia seu ocaso na categoria.
Anos mais tarde, em 2017, a disputa entre dois rivais igualmente históricos, Max Verstappen e Daniel Ricciardo, terminou com o holandês simplesmente usando o carro do australiano como apoio para completar a curva 2. Um ano mais tarde os dois voltaram a se estranhar no circuito de Baku, no Azerbaijão, e desse então Daniel parece ter perdido o brilho dos vencedores.
A grama de Hungaroring também traz um episódio digno de comédias do gênero pastelão. O japonês Taki Inoue fazia sua 14ª. volta no GP de 1985 quando o motor Hart do seu Footwork quebrou no terceiro setor da pista. Ao perceber um princípio de incêndio e notando que os bombeiros de plantão reagiam com muita calma, Inoue foi até o guard-rail agarrar um extintor de incêndio e ao voltar foi atropelado por um Tatra 613, sedã grande de motor traseiro V-8 arrefecido a ar e tração traseira fabricado na antiga Tchecoslováquia. O piloto do carro de apoio ainda tentou frear, mas como estava sobre a grama do acostamento, o atropelamento foi inevitável.
WG
A coluna “Conversa de pista” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.