O Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo (Detran-SP), criou uma condição física inexistente no Código de Trânsito Brasileiro (CTB), a semiembriaguez.
Numa de suas costumeiras notas à imprensa sobre sua fiscalização da “lei seca”, chamada de Operação Direção Segura Integrada (foto de abertura), o órgão diz: “Vale lembrar que tanto dirigir sob efeito de álcool — quando o teste do etilômetro aponta o índice de até 0,33 mg de álcool por litro de ar expelido — quanto recusar-se a soprar o bafômetro (sic) são consideradas infrações gravíssimas, segundo os artigos 165 e 165-A do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), respectivamente.”
E continua: “Já os casos de embriaguez ao volante, (meu grifo) quando os motoristas apresentam índice a partir de 0,34 miligramas de álcool por litro de ar expelido no teste do etilômetro, são considerados crimes de trânsito. Os motoristas flagrados nessa situação são conduzidos ao distrito policial.”
Pronto, nasceu a semiembriaguez, que seria dirigir “sob efeito de álcool”, uma vez que a pessoa está apenas semiembriagada.
Não há dúvida de que para o Detran-SP motorista com alcoolemia até 0,33 miligrama de álcool por litro de ar expelido não está em estado de embriaguez — no que o órgão esta absolutamente certo.
Por que o Detran-SP está certo? Simples. Se a “lei seca” (lei 12.705 de 19/06/2008) foi criada com o objetivo de evitar que motoristas alcoolizados (bêbados, embriagados) peguem o volante, tal estado, nas palavras do órgão, só se configura acima de determinada alcoolemia, no caso 0,34 mg da álcool/litro de ar alveolar.
Por uma questão de pueril lógica, somente acima dessa alcoolemia é que o motorista está incapacitado de dirigir veículo automotor com segurança.
Parece que o autor da “lei seca”, deputado Hugo Leal (PSB-RJ), mais deputados, senadores e o então presidente Luiz Inácio L. da Silva desconheciam o artigo 165 do CTB, em vigor desde 22/01/1998, que já considerava embriaguez qualquer alcoolemia igual ou superior a 0,30 mg/L. (ou sua equivalente 6 decigramas por litro de sangue). Era tudo bêbado, não havia distinção entre “sob efeito de álcool” e “embriagado”.
Ou seja, o sistema criou uma lei total e absurdamente desnecessária, que só serviu para prejudicar dezenas de milhares de cidadãos com suspensão do direito de dirigir e multas pesadas. Seria mais que suficiente para atingir o objetivo (tirar bêbados do volante) fazer cumprir os ditames do CTB original a respeito de álcool e direção, o que poderia ter sido feito exatamente nos mesmos moldes da “Operação Lei Seca” que estamos habituados a ver. Efetivo policial para isso já havia. Em vez de “Operação Lei Seca” teríamos “Operação Bêbados Fora”, por exemplo.
O fato mais grave, porém, é que entre a promulgação do CTB (23/09/1997) e a criação da “lei seca” passaram-se 10 anos, 8 meses e 28 dias. Um omissão inadmissível e irresponsável do poder executivo da União, primeiro com Fernando Henrique Cardoso, depois com Luiz Inácio L. da Silva.
Quantas mortes e ferimentos graves, sem e com sequelas, teriam sido evitados com bem menos bêbados — bêbados de verdade, não de mentirinha, “semiembriagados” — dirigindo durante todo esse tempo?
BS
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