O uso das reticências na escrita serve para “marcar interrupção do raciocínio, supressão de informações, insinuação, etc.,”, dizem os dicionários. Seu uso no título desta mateira da minha coluna dominical é para insinuar que se temos a Embraer, por que não temos uma Embrauto?
Aliás, a reticência, ou pontos de reticência, por serem três — … — costumam virar quatro ou até mais, como estou habituado a ver ao moderar comentários e que invariavelmente reduzo para três. Isso devido ao nosso princípio basilar de todos terem o direito de ler textos corretos tanto ortográfica quando do gramaticalmente.
O “Embrauto” deve-se,, em minha opinião, a ser inconcebível um país de 8,5 milhões de quilômetros quadrados com 220 milhões de habitantes, com cerca de 70 milhões economicamente ativos, não ter uma fabricante de veículos automotores, genuinamente brasileira, com grande volume de produção. Claro, temos a Agrale, de Caxias do Sul, RS, tivemos a Gurgel e a Troller, e outras fabricantes menores como a JPX em Pouso Alegre, MG, mas falo de uma grande fabricante capaz produzir 100 mil unidades/ano.
Sabemos pelas colunas do Alexander Gromow aqui no AE que quando Adolf Hitler, em 1933, como chanceler decidiu motorizar o povo alemão, mesmo o país já tendo uma pujante indústria automobilística nacional (Mercedes-Benz, Auto Union, Opel, esta comprada pela General Motors em 1927) e estrangeira (Ford), ele partiu para uma fábrica com capacidade para produzir 1,5 milhão de Carros do Povo por ano, obviamente um projeto megalômano que seria a maior fábrica da Europa.
A nossa Embrauto não precisaria enveredar por esse caminho, começaria pequena como a Embraer começou para crescer com o tempo e vir a concorrer com as excelentes fabricantes aqui instaladas Uma delas, a General Motors, que no próximo dia 25 de janeiro completará 100 anos da chegada ao Brasil.
Por que vejo uma fabricante de grande volume 100% brasileira? São vários motivos. Começa pelo sentimento de orgulho, mas vai bem além. Temos engenharia automobilística para isso há um bom tempo, três gerações pelo menos; engenheiros que conhecem nossas necessidades melhor do que ninguém; temos um parque de fornecedores invejável, os mesmos que estão operando espalhados pelo mundo; temos a expertise e dominamos a tecnologia necessárias para projetar, desenvolver e fabricar automóveis.
Um designer brasileiro, Luiz Alberto Veiga, criou um desenho da dianteira do Fox de segunda geração, em 2014, que até hoje é a base dos VW alemães e que é até sutilmente copiado por outras marcas.
Mais do que tudo, temos o exemplo da Embraer. Estatal fundada em 1968, 25 anos depois foi privatizada e hoje disputa mercado com fabricantes do porte de uma Boeing e de uma Airbus, seja na aviação executiva, comercial e militar.. A fabricante americana até tentou, há poucos anos, absorver a Embraer. É uma marca brasileira mundialmente admirada e respeitada que nos enche de orgulho. É a prova eloquente de que temos capacidade industrial e que não se restringe a este setor.
Importante lembrar que sendo uma fabricante genuinamente brasileira e não subsidiária de uma fabricante estrangeira, a Embrauto não precisaria remeter lucros para a matriz.
Por ser brasileiro e ter orgulho da Embraer é que condeno a falta de visão do presidente Silva ao autorizar a compra, em 2004, de um Airbus A319 CJ para ser o avião presidencial, em substituição ao Boeing 707. Poderia ter escolhido um Embraer, que antes de mais nada custaria 33% menos. O único inconveniente do Embraer é o menor alcance, o que obrigaria a uma, talvez duas paradas para reabastecimento de Brasília a Paris, por exemplo, o que é longe de ser um sacrifício.
Só que o efeito promocional para o Brasil de seu presidente desembarcar de um avião brasileiro, é imensurável do ponto de vista de serviço para o país. Poucos presidentes podem fazer isso. E agora, depois da pane recente no México, o presidente Silva cogita comprar um avião novo!
BS
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