A motocicleta inglesa Triumph Bonneville fez muito sucesso nos anos 60 e 70. Vão aqui algumas fotos de famosos artistas de cinema donos de Triumph. Artistas com imagem de “cool guy”; cara tranquilo, na dele. Não conheço moto ou carro que teve melhores garotos-propaganda. Em contrapartida, acho que a Bonneville os ajudou a promover suas imagens de bacanudos. Veja alguns deles:
Mesmo assim, nos anos 70 ela deixou de ser fabricada e só veio a renascer em 2000, quando os novos donos da marca a reeditaram. Muito semelhante à antiga, mas toda nova, um novo projeto partindo do zero, e moderna. Voltou a ser sucesso. Não tinha como não ser, pois além de linda é uma delícia de pilotar. Moto inglesa, tradicionalmente, é que nem carro esporte inglês: boa de curva e motor elástico.
Em novembro de 2012, quando a marca entrou oficialmente no Brasil, tive a oportunidade de experimentar vários modelos na pista da Fazenda Capuava, interior de São Paulo. Na ocasião conheci o Stuart Wood, o engenheiro-chefe da Triumph. Muito simpático, com ele bati bons papos em que deu para sentir o quanto entende e quão entusiasta ele é.
Antes de eu montar na Bonneville T100 para umas voltas na pista, ele me disse: “Essa é a sua cara. Você vai gostar”, e lá fui eu. Bastou deitá-la na primeira curva para senti-la como se fosse minha há anos, pois enquanto a danada parecia saber o que eu queria, eu simplesmente sabia como ela iria se comportar. Um amor à primeira montada.
Ao voltar aos boxes, lá estava o Stuart olhando para a minha cara, e em vista dela me perguntou: “Não é legal que alguém construa uma máquina exatamente do jeito que você desejava?”. Eu não precisava dizer nada e só pude agradecê-lo por voltar a ter o mesmo prazer que tinha quando era adolescente e saía com uma boa moto, um prazer pleno.
As outras Triumph eram inegavelmente boas, algumas mais rápidas, mais isso e mais aquilo, mas algo aqui ou ali fazia com que não se encaixassem com perfeição ao conjunto que mais me atrai numa moto.
O conceito que faço de uma moto é que ela não precisa ser a melhor em nada, mas tem que ser boa em tudo, como é o cavalo da raça Árabe no meio equino. Tem que ser versátil, e a T100 o era. O elástico e suave motor de 865 cm³ entregava 68 cv a 7.500 rpm e 6,9 m·kgf a 5.800 rpm. O motor bicilindro era arrefecido a ar e a principal função do radiador de óleo era ajudar arrefecer o cabeçote.
Moto leve, centro de gravidade baixo, excelente ciclística. Uma delícia de moto, seja na cidade ou na estrada. E leve o bastante para pegar trechos de terra sem drama. Para conforto em viagens mais longas só lhe faltava uma bolha para-brisa, opcional de fábrica que não traziam. E lá fora havia um para o verão e outro para o inverno, sendo este último maior.
Mas em 2011 a Triumph começou a tratar das mudanças que seriam necessárias para satisfazer as exigências mais restritivas de emissões Euro 4. Para atingi-las, a Bonneville precisaria ter arrefecimento a líquido, o que demandaria um motor cujo projeto partisse do zero.
Tendo em vista atender também uma clientela que demandava um motor ainda mais potente, resolveram então produzir duas Bonneville, uma mais leve e mais ágil que a T100, e daí surgiu a Street Twin, com 900 cm³ e 55 cv, e outra mais pesada e potente, mais direcionada às estradas, e veio esta T120, que apelidei de Muscleville — uma Bonneville anabolizada, com 1.200 cm³ e 80 cv.
São 80 cv a 6.550 rpm e parrudos 10,7 m·kgf a 3.100 rpm. É um baita de um motor. Para o leitor ter uma ideia do que ele é, de tanta potência em baixa que tem, sua 1ª marcha é longa o bastante para passar um pouco dos 80 km/h, e olhe que essa moto tem mais outras cinco marchas para você ir empilhando. Você atravessa o quarteirão só na 1ª, tal qual se faz com um Corvette Stingray com V-8 big block.
Não sei em quanto ela faz o 0 a 100 km/h, mas sei que ela é daquelas em que você vai e sua alma fica (a revista Cycle World fala em 0-96,5 km/h em 3,8 s e 0-160 km/h em 11 s). Como todas as motos superpotentes atuais, tem controle de tração; no caso, em duas configurações: seco e chuva.
Para conseguir ter controle de tração exato e atingir as tais metas da Euro 4, foi necessário ter acionamento eletrônico do acelerador. Nele vi um defeito: a mola é muito fraca, o que deixa sua manopla leve demais, sendo que ali é preciso certa resistência para que se possa apoiar nela sem que se altere a aceleração. Na estrada, por falta desse apoio, cansa um pouco. Na cidade, também por falta dessa maior resistência, tem-se que ficar atento para evitar mudanças indesejadas de aceleração ao passar por imperfeições do piso, o que faz o punho ficar mais tenso que o desejável. As manoplas têm aquecimento, e só quem já teve câimbras de frio nas mãos é que sabe o quanto isso é valioso.
E por falar em aquecimento, não podemos esquecer que moto não é bem que nem carro. Num Camaro, por exemplo, não é você que sustenta nas pernas o motor, então tanto faz se ele é um V-6 ou um V-8. Já em moto, se você quer mais potência, terá que carregá-la nas pernas. Potência maior, motor maior, peso maior, o que traz menos agilidade e mais calor a ser dissipado.
A T120 já não é uma moto “leve e fresca”, no bom sentido, como era a T100 e também é a Street Twin, motos que são “maneiras” e praticamente não nos esquentam as pernas mesmo quando no anda e para em trânsito ruim. Com a T120, num dia quente, antes de parar num sinal vermelho, já pensamos: “Vou parar, a ventoinha do radiador vai ligar e lá virá aquele bafo quente nas minhas pernas…”. Isso não é exclusividade dela. Todas motos superpotentes são assim.
Ontem mesmo escrevi para o Stuart dizendo-lhe de minha ideia maluca de colocar o radiador sob o selim, atrás do motor, em vez de na frente, e jogando o ar quente para a caixa da roda traseira. Vamos ver o que ele responde. Que também a moto ficaria ainda mais bonita, ficaria.
A T120 pesa 224 kg, e mesmo tendo um centro de gravidade baixo ela não é uma moto de se jogar de cá pra lá. Com o passar do tempo, após uma semana com ela na cidade e na estrada, pegando-lhe o jeito, ela “foi ficando mais leve”; mas mesmo assim ainda fica longe das duas outras citadas e ainda mais longe do que era a original dos anos 60. A altura do selim é de baixos 785 mm. Não é preciso ser alto para se escorar no chão com ambos os calcanhares.
Bom, agora que alertei o leitor para o preço a pagar pela maior potência (ah! Preço: R$ 46.000), vamos às recompensas. A arrancada, já falei, é estupenda, daquelas de escurecer a vista.
Na estrada, a 120 km/h reais e em 6ª marcha o giro ronda as 3.100 rpm, mas não é essa a velocidade a se manter por muito tempo. Não por causa da moto, que tem potência e estabilidade para muito mais, mas por causa do vento no peito. Fiquei confortável a 115 km/h medidos no velocímetro. A essa velocidade se vai longe sem cansaço. E em pista dupla é colocar a 6ª e esquecer, pois sua retomada mesmo a baixo giro é tremenda. Infelizmente ainda não trazem as opcionais bolhas para-brisa. Deveriam trazê-las, pois ajudam bastante em viagens mais longas.
Em giro baixo escuta-se e quase se contam as explosões do motor, mas delas não vem vibração, pois o motor tem duas árvores balanceadoras contrarrotativas, uma à frente e outra atrás do virabrequim, que agora é a 270°, sendo que o da T100 era a 360°. Essa mudança também objetiva diminuir vibrações. Vê-se que o motor foi concebido para otimizar seu funcionamento nas rotações médias, as mais usadas numa moto com esse conjunto, com esse propósito.
Freios são ótimos, dois a disco na dianteira e um a disco na traseira, com ABS. A ciclística é de primeira grandeza. Deitá-las nas curvas é algo suave e preciso, e muito disso se deve à colaboração da Pirelli, que ajudou a desenvolver pneus específicos para a T120. Esse é o motivo de me dar náuseas ver motos com pneus com medidas diferentes das originais, coisas de “customizadores” ignorantes. Estragam as motos para deixá-las “lindonas”. Isso é de tão bom gosto como incrementar com lantejoulas um vestido clássico do Valentino, além de fazer a modelo claudicar com um sapato com salto alto num pé e uma sandália havaiana no outro.
Em suma, a Triumph realizou um trabalho admirável, pois é muito mais difícil fazer uma moto com tecnologia moderna sem desrespeitar o seu aspecto clássico. Isso requer muito mais empenho e conhecimento.
Adorei a T120, claro!
AK
FICHA TÉCNICA TRIUMPH BONNEVILLE T120 | |
MOTOR | |
Descrição | 2-cil em linha, transversal, comando de válvulas no cabeçote, 4 válvulas por cilindro, arrefecimento a líquido, munhões do virabrequim espaçados a 270º |
Cilindrada (cm³) | 1.199 |
Diâmetro e curso (mm) | 97,6 x 80 |
Taxa de compressão (:1) | 9,5 |
Potência máxima (cv/rpm) | 80/6.550 |
Torque máximo (m·kgf/rpm) | 10,7/3.100 |
Formação de mistura | injeção eletrônica multiponto sequencial |
TRANSMISSÃO | |
Embreagem | Multidisco em banho de óleo |
Câmbio | 6 marchas |
Transmissão primária | Engrenagem |
Transmissão secundária | Correia dentada |
SUSPENSÃO | |
Dianteira | Garfo Kayaba 41 mm Ø, curso 120 mm |
Traseira | Dois amortecedores com molas helicoidais, curso de 120 mm |
FREIOS | |
Dianteiros (Ø mm) | Dois discos/310, hidráulicos |
Traseiros (Ø mm) | Disco/255, hidráulico |
Pinças | Uma por disco |
Controle | ABS, dianteiro e traseiro |
RODAS E PNEUS | |
Rodas | Dianteira, 32 raios, 2,75 x18; traseira, 32 raios, 4,25 x 17; ambas de alumínio |
Pneus, medidas | Dianteiro 100/90-18; traseiro 150/70R17 |
Pneus, marca | Pirelli Phantom Sportscomp |
Quadro | Berço em aço tubular |
CAPACIDADES | |
Tanque de combustível (L) | 15 |
PESOS | |
Em ordem de marcha (kg) | 224 |
DIMENSÕES (mm) | |
Comprimento | 2.170 |
Largura sem espelhos | 785 |
Altura | 1.125 |
Distância entre eixos | 1.445 |
Altura do assento | 785 |
Cáster e avanço (º e mm) | 25,5 e 104,1 |
DESEMPENHO (revista Cycle World) | |
Aceleração 0-95,5 km/h (s) | 3,8 |
Aceleração 0-160 km/h | 11 |
Rotação a 120 km/h, em 6ª (rpm) | 3.100 |
CONSUMO DE COMBUSTÍVEL | |
Médio (km/) | 19 |