Relendo minha coluna da semana passada e especialmente os comentários, percebi como pagamos diariamente e durante anos no trânsito o preço do ensino deficiente de somente algumas semanas de aulas em autoescolas despreparadas.
É óbvio que nem todas são assim. Eu mesma sou a exceção para isso. Tive a enorme sorte (sim, hoje eu vejo que foi sorte, mesmo) de ter tido aulas numa autoescola boa e especialmente com um excelente professor. Antes que me perguntem, não me lembro o nome do sujeito, mas foi no Touring Clube, faz séculos, pois meu pai era sócio e davam desconto nas aulas. Esse foi o primeiro motivo que me levou até lá, já que era meio longe. Morava em Higienópolis e as aulas eram na Av. Tiradentes — uns 5 quilômetros em linha reta mas que eu vencia de ônibus no final do dia — ou seja, se convertiam, fácil, em uma hora de transporte público em cada sentido.
Atualmente há aulas em simuladores (foto de abertura), o que sempre ajuda na formação, embora seja perceptível que a aluna esteja sentada incorretamente, com as costas não plenamente apoiadas no encosto, erro muito comum.
Em segundo lugar fui por acreditar que seria algo parecido ao que era o Automóvel Clube Argentino, o famoso ACA. Para quem não conhece, considero que foi (hoje não sei, por isso não digo nem uma coisa nem outra) um marco no automobilismo na Argentina em todos os sentidos. Desde formar ótimos condutores até fiscalizar e organizar o automobilismo esportivo no país. Fundado em 1904 é algo assim como a meca dos autoentusiastas. Engraçado que até hoje me lembro nitidamente do prédio do ACA em Buenos Aires, embora não entre lá desde, sei lá, meus 11 anos de idade talvez. Fica na formosa avenida del Libertador, 1850.
Lá fui eu de novo dar uma volta até a Lua e voltar. Mas sempre volto, né? Então, matriculei-me (minha ênclise da semana) no Touring apesar de já ter boas noções de direção, graças ao meu famoso tio César e ao meu pai, que me levava de vez em quando à Cidade Universitária para treinar. Já no primeiro dia, o sujeito me levou até uma rua tranquila e me fez dirigir um pouquinho. Vendo que já sabia bastante, me fez continuar na direção e mandou: virar à direita, vira à esquerda, segue e… fui parar na marginal do Tietê.
Era por volta das 17h30, pois minhas aulas eram das 17h00 às 18h00. Já naquela época aquilo era um furdúncio de carros e caminhões. A teoria dele era que uma das coisas mais perigosas no trânsito é um motorista medroso e, vendo que não era o caso da sua nova aluna, me mandou “perder o medo” que, aliás, eu não tinha. Mas ainda assim me deu um certo frio na barriga, apenas diminuído pela tranquilidade dada pelo duplo comando e pela experiência do instrutor. E assim foram todas as 20 aulas obrigatórias. Não faltaram pegadinhas para saber se estava atenta, como me mandar virar numa rua que era contramão. E não, não caí nessa, mas duvido que hoje tenha disso para saber se o aluno está atento à sinalização.
O sujeito era mesmo excelente. Sabia a teoria e a prática de direção e, para minha felicidade, concordava com tudo o que já haviam me ensinado meu tio e meu pai. E sabia por que devíamos fazer cada coisa. Ou seja, nada de frear no meio da curva nem andar em ponto morto, algo muito comum na minha época de autoescola. Nos dois casos, com as explicações das leis da Física, mas, resumindo, porque assim você não tem o controle do carro.
Não deu outra: passei no exame na primeira tentativa. E, claro, poderia ter feito muito mais do que o teste exigia. Lembro que a única coisa que ele me corrigiu foi algo que tendo a fazer até hoje: acionar relativamente pouco o pedal do freio. Como boa argentina, uso muito as reduções de marcha nos carros com câmbio manual. Faço isso no plano e nas descidas, especialmente. Segundo o instrutor, ainda fazendo isso é bom dar um toquinho no pedal do freio quando estamos em trânsito pesado como o da marginal para avisar a quem está atrás que estamos reduzindo a velocidade. Sempre achei que fazia sentido, especialmente no Brasil onde, acho, a maioria das pessoas tende a frear demais ou principalmente sem necessidade, quando na maior parte das vezes basta tirar o pé do acelerador apenas. Mas vou falar disso em outro momento.
Vi muitos comentários semana passada de leitores (ou conhecidos de leitores) que tiveram maus instrutores. Isto é péssimo por vários motivos. O principal, claro, é que essas pessoas eventualmente conseguem habilitação e levam vícios de direção pela vida afora, como pegar errado no volante, em especial o que chamamos no AE, a “ordenha de vaca”: pegar o volante por dentro para “puxá-lo”, herança dos tempos de direção pesada.
Outro é que é muito, mas muito difícil mesmo corrigir erros que foram ensinados logo no início. Já tive discussões intermináveis com amigos porque não concordo com a doutrina de Paulo Freire ou de Jean Piaget no ensino. Mas prometo que não vou me engalfinhar nisso aqui. Apenas acredito firmemente que permitir que se fixem conceitos errados no início do aprendizado (ou escrita de palavras, no caso destes educadores) é a melhor forma de levar a que o comportamento se repita erradamente pelo resto da vida – se não, no mínimo, vai ser extremamente difícil para a própria pessoa mudar isso.
Qual é a pessoa criada a refrigerante, batata frita e hambúrguer duas vezes por dia durante 20 anos que vai passar a consumir tofu e suco de couve de um dia para o outro e achar gostoso? Ainda sabendo que pode ser melhor para sua saúde, requer uma grande força de vontade, autodisciplina e convicção de que é por um bem maior. Parênteses, gosto de comida saudável, mas detesto tofu, tá?
Como fazer com que alguém que acha que está certo transitar pela esquerda mude o hábito e o faça pela direita e vá para a esquerda apenas para ultrapassar? Difícil, claro. Especialmente porque exige que o motorista entenda que durante xis anos fez isso errado. E, convenhamos, admitir que se está (ou esteve) errado não é a qualidade mais frequente nos seres humanos, não? Ou como mudar hábitos como andar na marcha errada? Sabe aquele carro que sofre nas subidas porque o motorista insiste em não baixar de quarta marcha numa pirambeira? Geralmente o próprio condutor nem percebe que o motor chora, os carros atrás vão se juntando e, muitas vezes, não sabe como corrigir isso apenas porque não lhe foi ensinado a andar na marcha certa.
Vários leitores comentaram sobre as dificuldades em sair com o carro parado numa subida, como num sinal de trânsito. Bem, eu mesma só me deparei com esse “problema” quando vim morar no Brasil. A Argentina quase inteira, e Buenos Aires especialmente, são tão planos que o freio de mão é um mero enfeite nos carros e nunca é acionado, nem ao estacionar. Acho que ele só existe por uma questão de legislação…. hehehehe. Mas no Brasil é fundamental saber como fazer isso corretamente.
O leitor Matuck comentou que a esposa “aprendeu” (uso isso na falta de outro verbo, pois certamente não é o adequado) a arrancar com o carro apenas soltando a embreagem. Bom, nem em Buenos Aires plano como um pires, isso é ensinado assim. Chance de dar certo em outro lugar não plano? Nenhuma, é claro. Mas pode fazer com que a pessoa leve esse vício para o resto da vida e que tente essa barbaridade em terrenos em aclive ou declive.
Não estranho que haja tantas autoescolas que trabalham com a “solução de traumas” de condutores. Deve ser um belo filão de mercado, pois motoristas assim devem tomar mais buzinadas do que os outros, xingamentos, etc, o que só aumenta o medo de dirigir.
Já vi instrutor de autoescola tampar o retrovisor interno para evitar que o aluno olhe. Na estapafúrdia teoria do “professor’ o motorista deve olhar apenas para a frente. Novamente, como mudar um hábito desses? Imaginem os motoristas que saem dessas aulas…
Outro leitor, o Christian Govatski comentou que à esposa não ensinaram a ajustar banco e espelhos. Como assim? Novamente, mais um mau hábito que pode se levar pela vida afora se não fosse o atento marido. Mas quem diz que os outros alunos desse instrutor tiveram essa sorte?
E por falar em marido, o meu dirige que é um espetáculo. Mas é um péssimo professor. Quando namorávamos (sim, estamos juntos há tanto tempo que nem me lembro da minha vida sem ele) tentamos uma vez. Andei exatamente 80 metros. Nem completei um quarteirão. Nessa distância, ele conseguiu colocar a mão na direção duas vezes, puxar o freio de mão (que eu não vi pois estávamos no plano e não sei porque ele fez isso, e quando tentei acelerar claro, o Fusca não saía do lugar). Antes da esquina, encostei o carro e trocamos de lugar. Depois disso, só com minha CNH na mão. E sem direito a muito palpite, não. Até hoje.
Mudando de assunto: Vi a corrida de Cingapura de F-1 umas três vezes. Só a largada acho que umas oito! Vocês sabem que adoro o Kimi, mas desta vez acho mesmo que ele não teve nada a ver com o acidente. Apesar de não ser tão fã do Vettel também não tenho certeza que ele tenha causado a lambança, pois ele joga o carro para cima do Verstappen depois que o holandês toca no finlandês. Em fim, um pouco de barbeiragem do Verstappinho com acidente de corrida. Pena ver os dois Ferraris fora tão cedo. Mas reconheço que as largadas do Hamilton e especialmente do Alonso foram sensacionais. Pena que outro que eu gosto muito, o Hulkenberg, não conseguiu terminar pois com um carro bem mais ou menos ele consegue quase fazer milagres. E o Sainz fez um corridaço, assim como o sempre ótimo Ricciardo. Vou me abster de comentar a brincadeira dele na entrevista no final, pois acho que baixou o Nelson Piquet no australiano. Ri quase tanto quanto o Bottas com a palhaçada… E o Hamilton? Bem, além de ótimo piloto o sujeito tem a b… virada pra Lua este ano. Acho que leva o título mesmo.
NG