Entre as dicas estapafúrdias, tem até a que recomenda adicionar querosene no tanque do carro flex…
O carro flex tem 15 anos. Lançado em 2003 (Gol Total Flex, foto, o primeiro), foi a solução para reabilitar o motor a álcool que caiu em desgraça no final da década de 80: a falta de planejamento resultou em filas de carros nos postos em busca do derivado da cana. Os motoristas que acreditaram na campanha do governo (“Carro a álcool, um dia você vai ter um”) se arrependeram amargamente de ter aderido à novidade. Oficinas mecânicas que tinham adaptado milhares de automóveis para o álcool passaram a fazer a conversão “do arrependimento”: a operação reversa que voltava o motor para a gasolina.
A redenção do álcool veio com a eletrônica que permitiu desenvolver o flex, que queima os dois combustíveis e permite ao dono do carro optar entre eles a qualquer momento. Em termos financeiros, se o álcool estiver custando mais de 70% da gasolina, não vale a pena abastecer com ele. Percentual que varia entre diversas regiões do país e conforme o estoque do álcool.
Passados estes quinze anos, apesar de o flex estar presente em todos os modelos nacionais e até em alguns importados, ainda é vítima de dezenas de boatos.
Um deles diz que, se você estiver usando álcool, ao decidir mudar para gasolina tem que esvaziar o tanque antes de mudar o combustível e vice-versa. Uma “dica” às avessas e que vai de encontro ao conceito básico do flex, de receber qualquer combustível: álcool puro, gasolina pura ou uma mistura em qualquer proporção de ambos. Embora “puro” seja um eufemismo, pois ambos são batizados (água no álcool, álcool anidro na gasolina).
A rigor, o motor pode passar meses ou anos queimando etanol puro. Se um belo dia o motorista decidir mudar para gasolina (por ser mais conveniente em termos financeiros, ou pela maior autonomia já que seu consumo é menor), pode fazê-lo mesmo que o tanque ainda tenha metade de etanol. E vice-versa.
O que permite esta mistura em qualquer proporção é um sensor (“sonda lambda”) no escapamento. Ele analisa a quantidade de oxigênio presente nos gases queimados e passa esta informação para a central eletrônica, que ajusta a mistura ar-combustível para um perfeito funcionamento.
A melhor mistura é “mezzo a mezzo”? Depende: se o motorista quiser aproveitar as vantagens de ambos os combustíveis, então vale a pena abastecer com 50% de cada. Mas se ele insiste em autonomia, deve usar só a gasolina, que tem consumo menor. Se faz questão de desempenho, a indicação é o álcool no tanque. E se a preocupação for financeira, depende do custo relativo entre os dois combustíveis.
Adicionar querosene? Dica estapafúrdia, a menos que o veículo do prezado não seja um carro flex, mas um jatinho…
Algumas concessionárias recomendam abastecer o carro novo exclusivamente com álcool no primeiro mês. Nenhum fundamento, pois o flex queima qualquer combustível desde o primeiro até seu último dia. Se o carro vem da fábrica com álcoool é por custar menos: em milhares de litros por dia, faz diferença.
Outra: se o tanque só recebe álcool, de tantos em tantos abastecimentos o motorista deve usar a gasolina. E vice-versa. Nada contra essa prática (até recomendada em alguns manuais), mas desnecessária.
E, finalmente, se o tanque tinha um combustível mas foi abastecido com outro, então o motorista só pode estacionar a noite após rodar “x” km. Não é bem assim. Só é verdade se:
– a mudança foi da gasolina para o álcool;
– o carro ainda tiver o tal tanquinho de gasolina;
– a temperatura ambiente estiver abaixo de 15 ºC.
O problema é que o sensor demora alguns quilômetros até reconhecer o álcool no tanque e poderia não acionar o sistema de partida a frio no dia seguinte.
BF