Os anos 70 foram ricos em termos de produto da nossa indústria automobilística. Lançamentos no final dos anos ’60 como Chevrolet Opala, da General Motors, Corcel, da Ford, Dodge Dart da Chrysler, sedã 1600 4-portas, da Volkswagen, e Puma com chassi e conjunto motriz de Fusca, iniciaram essa safra de variedades com carros para todos os gostos e necessidades.
Os anos ’70 foram se enriquecendo ainda mais à medida que transcorria o tempo. Não demorou para que as versões esportivadas do Opala, batizado de SS6, do Dodge Dart, evoluído para Charger R/T, e do Corcel, em versão GT, viessem apimentar ainda mais nosso mercado ávido de novidades.
Além disso, tivemos a chegada do esportivo SP2 em 1972, com motor 1,7-litro arrefecido a ar; do Ford Maverick (foto de abertura), que aportou por aqui em 1973 e trouxe consigo sua nervosa versão GT com motor V-8 de 4,95 litros. Na primeira metade dos anos ’70 o salseiro já estava armado: tínhamos a disputa do Opala 250-S equipados com motor 4,1-litros de 6 cilindros em linha mais potente que brigavam de frente com o rápido Maverick GT Quadrijet, ambos dando continuidade aos enfrentamentos dentro de nossos autódromos. Época rica do nosso automobilismo e de nossos carros de corridas.
Em 1976, depois de dois anos do lançamento do Passat, chegava sua versão esportivada batizada de TS. Esse carro, concebido inicialmente na Alemanha, deu o que falar no mercado nacional. Acelerava quase igual ao Opala 4,1 e ao Maverick GT, só que seu motor era de 1.600 cm³. Na época, gerava discussões de horas nas rodas de aficionados. Esses três carros, quando colocados nas pistas de corrida, proporcionavam disputas magníficas. Na classe dos motores grandes, Opala e Maverick promoviam brigas ferrenhas, ora vencia um, ora vencia outro, uma disputa equilibrada que durou anos.
O Passat TS, por sua vez, reinou sozinho na classe até 2.000 cm³. Seus concorrentes, o maior deles o Dodge 1800, não conseguiam atingir seu desempenho e viam de longe as suas vitórias onde quer que o Passat corresse. Eu mesmo iniciei minha carreira de piloto em um Passat TS em 1981, terminando minha corrida de estreia em um honroso segundo lugar. E logo em 1983 já conquistava minha primeira vitória de classe na Mil Milhas Brasileiras daquele ano — claro, pilotando um Passat TS. O carro não era fácil! O Passat TS reunia o que era muito bom para as pistas: baixo peso, bom desempenho do seu motor 1,6 principalmente quando movido a álcool, boa rigidez torcional do monobloco e um equilíbrio muito favorável entre e eixo dianteiro e sua tração e o eixo traseiro. Tudo isso junto, permitia uma pilotagem fácil e agradável que resultava em bons tempos em cada volta na pista.
Mas muita gente deve estar se perguntando: por que é, então, que o Dodge Charger R/T que possuía o motor V,8 5,2-litros mais potente de toda essa turma, não fez sucesso nas pistas? Realmente, isso é um fato. Mas o Charger R/T, apesar da grande potência do seu V-8, tinha características que não o tornavam competitivo nas corridas. Uma delas, creio que uma das principais, era o seu peso excessivo. Carro pesado precisa de mais espaço para frear, contorna curvas mais lentamente pois tem dificuldade de manter a trajetória nas curvas e, o que é pior, é mais lento para retomar a velocidade nas saídas de curva. Em circuitos travados, como a grande maioria dos nossos autódromos, o Charger R/T não teria a menor chance contra Opala e Maverick. Se tivéssemos autódromos velozes ou circuitos ovais, as chances do Dodge aumentariam bastante.
Outra briga inesquecível, essa mais restrita as ruas e estradas e longe das pistas de corrida, acontecia entre o Puma GT, dotado originalmente com o motor 1600 de dupla carburação 32, e o SP2. No lançamento deste em 1972, seu estilo arrojado e sofisticação no acabamento interno fez com que muito dono de Puma partisse para o esportivo da Volkswagen porque o carro era estampado em chapa de aço em vez do compósito de plástico e fibra de vidro do Puma, e o acabamento era mais luxuoso e caprichado. Mas, claro, como tudo na vida, nada é de graça. A sofisticação e a carroceria de aço faziam dele um carro pesado, sacrificando o desempenho, as frenagens e o contorno de curvas. A pessoa acabava tendo um carro mais bacana, mas que andava menos que seu Puma mais leve com motor 1600.
O resultado era que todo dono de SP2 ou se conformava com o seu desempenho limitado, ou partia para o “veneno” no motor para tentar deixar o carro mais rápido. O problema é que não era incomum encontrarem pelos caminhos nas ruas ou estradas donos de Puma que também tinham mexido em seus motores. Nesses casos, os donos de SP2 eram espancados e tinham que se conformar com isso. Era o preço da sofisticação e do conforto. Nesses casos, vale lembrar que a própria Puma vendia kits de maior desempenho para os motores VW arrefecidos a ar. Existiam comandos e molas de válvulas mais fortes, bombas de óleo de maior capacidade de vazão e até bombas de óleo duplas para arrefecimento externo do lubrificante, cabeçotes com válvulas maiores tanto na admissão quanto no escapamento, e por aí vai. Para aqueles que gostavam de motores preparados, um deleite.
Aqueles que viveram intensamente os anos 70, tenho a certeza de terem saudade. Aqueles que não viveram essa época, eu só posso lamentar, pois era um tempo muito rico para quem curte carros. Nessa época, ainda molecote, eu trabalhava numa oficina de preparação de motores no Cambuci e seu dono, o italiano Raffaele Cecere, preparava motores VW para a Fórmula Vê, Fórmula Super Vê e turismo Divisão 3, todos arrefecidos a ar, além de vários tipos de carros de rua. Aprendi muito nesse período de vida, tanto nas pistas quanto nas ruas. Experiências das quais jamais me esquecerei.
DM