Como é sabido, o AUTOentusiastas nasceu da ideia do Paulo Keller em compartilhar publicamente o que um grupo de amigos, todos autoentusiastas, vinha trocando de ideias por e-mail desde o final dos anos 1990. Eu era um desses e já conhecia o Paulo, nessa época éramos colegas na GM em São Caetano do Sul, ele no marketing, eu na área de relações com a imprensa.
No dia 24 de agosto de 2008 recebi um e-mail-circular do Paulo comunicando a criação de um blog chamado justamente AUTOentusiastas. Acessei-o em seguida para ter a grata surpresa de ver nos comunicando com os internautas na rede mundial de computadores! Esse alcance, tudo aquilo, me tocou muito. Era um novo mundo.
Lembro-me que o Paulo montou a página com fundo preto e caracteres brancos e que imediatamente aderi à ideia. Na época eu ainda era colunista da revista Quatro Rodas, um trabalho iniciado em junho de 2005, ainda tinha a coluna semanal “Do Banco do Motorista” no Best Cars, e era consultor editorial da revista Engenharia Automotiva e Aeroespacial, da SAE Brasil (continuo lá, já são 15 anos). Isso além de inúmeros trabalhos como free-lancer para publicações automobilísticas e como editor e revisor para autores de livros, como “Entre ases e reis de Interlagos”, do Bird Clemente, e vários livros do Fábio Steinbruch sobre automóveis. Logo percebi que o futuro estava naquela mídia.
Logo vi também que eu poderia contribuir para o blog com toda a minha experiência no jornalismo automobilístico — tive dois mestres, primeiro o Fernando Calmon, depois o Josias Silveira na revista Oficina Mecânica. Eu tinha condições de dar ao blog um formato e estilo profissional, com linguagem clara, uniforme e livre de erros de ortografia e de gramática. Eu adotaria os preceitos do Manual de Redação e Estilo d’O Estado de S. Paulo, que reputo uma leitura precisa e agradável.
O Ae (assim era a sigla; quando passamos a site passou a ser AE) iria se beneficiar também da minha vivência e contatos na indústria automobilística no sentido de termos acesso imediato aos carros de teste e aos lançamentos, apesar de ser um blog novo, ainda na sua infância. Eu já havia trabalhado na Fiat e na Volkswagen.
Logo fiz ver ao Paulo e aos demais naquele início que deveríamos interagir ao máximo com os leitores, fazendo uso da facilidade oferecida pela internet, recebendo comentários e os respondendo-os quando fosse o caso. Mas cerca de dois anos depois começamos a ter problemas de comentários abusivos, ofensivos, repetidos em volume absurdo numa só matéria a título de molecagem, e tivemos introduzir a moderação. Houve descontentamento de muitos leitores, mas logo todos entenderam ela ser necessária. O ambiente passou a ficar saudável e agradável como é até hoje.
Outras decisões nossas, logo nos primeiros meses, foram, uma a de ficarmos na rede ininterruptamente, nos 365 dias (ou 366 nos anos bissextos) do ano, sem pausas de fim de ano, e assim foi e continua até hoje. O AE nunca deixou de ser atualizado um único dia nesses 10 anos. Outra, estabelecer uma ordem de postagem e com horário.
A passagem a site em outubro de 2014 trouxe duas novidades. Uma, criamos os espaços para Histórias dos Leitores e Carros dos Leitores, um passo firme na interação com quem nos lia e que renderam e rendem belas histórias de autoentusiastas. Outra, passarmos a arregimentar colunistas de renome para presença semanal cada um. Atualmente são sete, ou seja, uma coluna nova todo dia.
Parodiando o “Globo News”, o AE não desliga nunca.
Outra novidade mais ou menos por essa época foram os vídeos, maneira moderna, dinâmica de falar sobre produto e que só mídias eletrônicas como os sites permitem — mídia impressa, impossível, e televisão tem seu eterno problema de tempo, em que 2 minutos é uma eternidade — valendo-se da velocidade de conexão em banda larga.
O início dos vídeos foi uma iniciativa pessoal do Arnaldo Keller, no começo exibidos num canal de vídeo dele apenas. Não demorou para abraçarmos a ideia, com o PK cuidando da captação (e o Arnaldo dos vídeos dele) e edição. Se um quadro vale por mil palavras, um vídeo vale por mil quadros.
Recentemente passamos a contar com o serviço de edição de vídeo do Márcio Salvo, leitor que nos acompanha desde o início, e da fotografia do Fernando Silva, outro seguidor do AE de longa data.
Eu, autoentusiasta
Como todos — rigorosamente todos — da equipe do AE, sou um autoentusiasta sob diversas óticas. Uma delas é o que está escrito brasão de São Paulo, esta incrível metrópole que me acolheu no dia 20 de agosto de 1978: Non dvcor, dvco — não sou conduzido, conduzo, em latim: adoro, tenho imenso prazer em me sentar ao volante — qualquer volante —, o oposto em qualquer outro lugar num automóvel. Sou o que se chama de “fominha”.
Quando não tem jeito, como quando pequeno, adorava ficar de pé entre os dois bancos do Mercury 1946 cupê do meu pai — sempre saía briga com meu único irmão, mais velho, para ficar ali — só para vê-lo dirigir. Ou então quando apareceu na linha de lotação Estrada de Ferro-Gávea um cara-chata com mecânica OM — exceção, todos eram Mercedes-Benz Diesel ou Chevrolet a gasolina “dois-volumes” — que tinha uma particularidade que me cativou: o câmbio era na coluna de direção.
Tanto que um dia tomei-o no final da linha, bem perto de casa, e tratei de ocupar o banco ao lado do motorista só para poder vê-lo trocar marchas. Fui até o início da linha (Estrada de Ferro Central do Brasil), não desembarquei, voltei para o final da linha — e repeti o ciclo! Eu tinha 10 anos e tempo, estava de férias na escola. Foram mais de quatro horas no OM.
Toda minha vida gravita em torno do automóvel, tudo tendo começado ao assistir diversas corridas no Circuito da Gávea, em que uma parte do circuito era a Rua Marquês de São Vicente, a 50 metros da nossa casa na Rua Piratininga. Os carros eram de Grand Prix, os monopostos que em 1950 constituiriam a Fórmula 1. Ficaram indeléveis na minha memória o som do Maserati 4CLT 1,5-litro de oito cilindros em linha com compressor e, principalmente, o cheiro exalado do escapamento: mistura de gasolina, álcool etílico e benzeno, mais o do óleo lubrificante à base de rícino (que 20 anos depois se repetiria nos DKW-Vemag de corrida, que usavam o óleo Castrol R40, de mesma base).
O envolvimento com o mundo do automóvel continuou célere com a leitura de revistas especializadas, nacionais e estrangeiras, que nunca faltaram em casa, eu e meu irmão tínhamos a sede de aprender tudo o sobre carros e motores: estes começaram pelos pequenos dois-tempos para bicicletas, depois vieram os scooters Lambretta e Vespa, e os carros. Tive a ventura de conhecer um carro americano em 1950, potente para a época e com câmbio automático Hydramatic, o Oldsmobile 88 do meu pai; lá de casa, um novo e estranho carro chamado Volkswagen, em 1953, um utilitário de nome Kombi em 1955 e um novo carro, o DKW-Vemag sedã, em 1959. Respirava automóvel, como o Juvenal Jorge escreveu na matéria dele sobre os 10 anos do AE.
Daí em diante o autoentusiasmo só cresceu e nem sinal de arrefecer aos 76 anos que completo daqui a dois meses. Envolvi-me com o automobilismo de competição do qual participei durante 24 anos. Aprendi a respeitar a máquina mesmo que ela não seja minha, adquiri noção de segurança e cuidar de tudo e o que está à minha volta no trânsito. Aprendi a ser paciente com os meus colegas motoristas de veículos maiores, facilitando-lhes sempre o conduzir.
Cada vez mais me dói ver pessoas perdendo a vida ou ficando com sequelas graves, quando a maior parte dos acidentes poderia ser evitada com treinamento e noção de responsabilidade.
Enfim, meu autoentusiasmo encontrou no AE o cenário e as condições perfeitas para aprofundá-lo ainda mais, a par de poder contribuir de maneira decisiva para difundir ainda mais esta que é uma verdadeira paixão.
BS