No fim do ano passado, por conta de uma viagem ao Rio Grande do Sul, alugar um carro foi inevitável. Durante uma semana fiquei com um Volkswagen Gol 2018, versão Trendline 1,6-litro flex na bela cor azul Lagoon, com pouco mais de dez mil quilômetros rodados. Há alguns anos eu não andava em um Gol atual, então este foi como se fosse uma novidade.
Ao primeiro contato, muitas similaridades com o Gol tradicional dos anos anteriores. A posição de dirigir e ergonomia geral são basicamente as mesmas dos modelos de meados dos anos 2000. O que vemos claramente que evoluiu e muito foi a qualidade de acabamento do carro. Ajustes de portas, montagem do interior e encaixe das peças nitidamente melhoraram muito.
O Gol já não tem mais o ar de carro barato que por muito tempo marcou suas versões. É o que chamam na indústria de quality feel, ou numa tradução simplista, a impressão de qualidade transmitida.
No percurso, um misto de urbano e rodoviário que totalizou perto dos 480 km, o Gol mostrou sua reputação de carro econômico. Fiz uma média de 12,7 km/l de gasolina calculada pelo método de zerar o hodômetro parcial com o tanque cheio e comparar a quilometragem rodada no próximo reabastecimento. Esta média foi andando sempre com o ar-condicionado ligado.
No trânsito da cidade, o Gol vai bem. Os comandos de pedais são leves e não cansam. O freio poderia até ser um pouco mais firme. As trocas de marcha continuam como nos antigos Gols, onde a curta alavanca parece estar sobre uma grande esfera e a 1ª e 2ª ficam meio “torcidas” para a esquerda, e a 5ª torcida para a direita. Eu particularmente não gosto, mas os engates eram bons.
O rádio com CD-player contava com entrada auxiliar e conectividade Bluetooth para o celular, de fácil operação para conseguir parear o aparelho, mas não muito intuitiva para operar as ligações do telefone. E este era todo o recurso tecnológico deste VW. Nada mais. O painel de instrumentos, para minha surpresa, ainda possui conta-giros e termômetro do líquido de arrefecimento, este um item que em muitos carros já não existe mais. Pessoalmente acho melhor assim, são informações importantes para o motorista.
A suspensão é firme na medida para não ser desconfortável. Mesmo nas ruas de paralelepípedo, a vibração interna era aceitável e sem muito ruído. O carro passa por lombadas e valetas sem a menor dificuldade. O volante ainda passa a sensação de estar deslocado para o lado, mas logo acostuma-se. A direção com assistência hidráulica exige algum esforço em velocidades de manobra, mais pesada do que a de outros carros com sistema eletroassistido.
Viajando sozinho, o porta-malas de 285 litros acomoda bem as bagagens sem problema nenhum, como era de se esperar, mas para uma viagem em família pode ser pouco.
Na estrada, o motor MSI 1,6-litro de quatro cilindros com 104 cv e 15,6 m·kgf de torque (com álcool; com gasolina, 101 cv e 15,4 m·kgf) fica devendo, pois já é um pouco defasado em relação aos concorrentes que para a mesma cilindrada, estão na casa dos 120 cv com álcool. O motor deste carro é o conhecido EA111. É preciso usar bem o câmbio manual de cinco marchas para compensar. O carro pesa 1.045 kg, o que não é muito nos padrões atuais, mas mesmo assim faltou um pouco de motor.
Um dos destinos foi a cidade de Canela, onde agora tem mais de um museu de carros antigos. Pela serra gaúcha, passando pela BR-116 e pela RS-235 que liga Nova Petrópolis a São Francisco de Paula, encontrei alguns trechos livres de tráfego que permitiu sentir um pouco mais do Gol quando abusamos um pouco. Mantendo o motor cheio na faixa útil de torque (o motor possui duas válvulas por cilindro, não adianta trabalhar perto da rotação máxima pois pela sua calibração ele já está perdendo rendimento), o carro aproveita melhor o torque e o câmbio.
Os freios seguram bem o Gol no lugar, mas a modulação não é das melhores. Com algumas freadas, consegui pegar o jeito do pedal. A suspensão para andar mais rápido dá conta do recado, mesmo com um nível de rolagem de carroceria elevado. Obviamente vamos manter em mente que estamos em um Gol de locadora, não é nenhum Golf GTI com acerto de suspensão e direção esportivo.
Chegando na cidade turística de Canela, vizinha a Gramado (9 km), logo na entrada da cidade vemos o que pode ser um dos mais bem estruturados museus de carro antigo do país, o Museu do Automóvel de Canela, inaugurado em 2016 pela iniciativa de dois irmãos, colecionadores gaúchos.
O fachada do museu (foto de abertura desta matéria) já chama a atenção de quem passa pela RS-235, bem na entrada da cidade. O espaço conta com um acervo de aproximadamente 40 carros, com previsão de expansão em um futuro próximo. O que chama a atenção para este acervo são a apresentação geral e a raridade de muitos dos carros expostos. Todos impecavelmente limpos, com totens digitais contando detalhes dos carros e fotos históricas.
O que o pessoal do museu me explicou é que da coleção particular dos proprietários foram selecionados os carros mais interessantes e raros para serem expostos, e que de tempos em tempos, parte do acervo será renovado. Já me adianto e peço desculpas pela qualidade das fotos, pois infelizmente só tinha o celular para fotografar no momento.
Dos modelos mais interessantes, boa parte eram nacionais. Destaque para o IBAP (Indústria Brasileira de Automóveis Presidente) Democrata 1968, o controverso carro brasileiro que captou recursos de muita gente e que não vingou. Um dos dois exemplares que sobreviveram está restaurado e como destaque em uma das alas do museu, onde pode-se ver os detalhes do interior em madeira com apelo esportivo. Falando em esportivos, no museu vemos também o Willys Interlagos berlineta, um GT Malzoni DKW, VW SP2, Brasinca 4200GT e também um Hofstetter turbo.
Outros modelos bem raros presentes na exposição são o Willys Itamaraty Executivo, a limusine brasileira que transportou até presidentes da República, o Lafer LL, irmão distante do nosso conhecido MP Lafer. Também a família Simca está presente com um Esplanada GTX, uma Jangada e um Présidence.
Os importados são bem representados logo na entrada do museu, com um belo Cadillac Série 62 conversível 1953, um Ford Thunderbird, um raro Pontiac 1942 da época da Segunda Guerra Mundial, além do famoso Ford Modelo T, Corvette 1970 e Ferrari 308, dois Marmon dos anos 20, entre outros.
É uma visita que vale fazer se estiver na região, que também conta, em Gramado, com o Hollywood Dream Cars, outro museu mais focado nos carros americanos dos anos 50 e 60, com modelos não tão exclusivos como o de Canela, mas que também vale dar uma olhada por serem próximos.
Voltando pela mesma rota da RS-235 e BR-116 em direção ao norte, agora com um pouco mais de trânsito, as ultrapassagens eram raras, pois como o trecho é bem sinuoso e com poucas retas propícias para ganhar velocidade e ultrapassar com segurança, o Gol deixava a desejar e pouco conseguia fazer para sair de trás dos mais lentos. Novamente, o motor menos moderno não ajudava.
Um percurso que vale a pena ser feito na região é pegar a estrada RS-444, passando por Farroupilha, Bento Gonçalves em direção à Santa Tereza. Neste caminho, passei pelo Vale dos Vinhedos, uma região muito bonita e com ótima comida e vinhos para quem gosta.
De forma geral, o Gol melhorou bem ao longo dos anos, principalmente quanto ao acabamento. Outras versões mais completas e com o motor, também MSI, só que da família EA211, de 120 cv (110 cv com gasolina) devem ser mais atraentes. Sendo justo, este era um carro básico de locadora e não precisava de requintes, então para o que estava sendo ofertado foi satisfatório.
Se eu pudesse opinar à VW, o Gol merecia um motor turbo da família TSI. O torque em baixas rotações destes motores traria uma nova experiência ao motorista. Faria sentido um carro muito usado por locadoras? Provavelmente não, mas ficaria bem melhor.
MB
Para mais informações sobre os museus, acesse:
www.museudecanela.com.br
www.hollywooddreamcars.com.br
Outras fotos dos museu de Canela:
Mais fotos do Dream Cars: