Curiosamente, o Toyota Yaris XLS 1,5-l flex CVT, de placas GER5A93 (era GER 5093), passa pela mão do terceiro editor do AE. Primeiramente o Juvenal Jorge avaliou este carro e publicou matéria com vídeo da avaliação. Posteriormente o mesmo carro foi emprestado ao Roberto Agresti para o teste de 30 dias (semana 1, semana 2, semana 3 e semana 4), e agora o mesmo carro chega às minhas mãos para conhecer melhor o produto.

Antes, um pouco sobre a Toyota

Dentro da indústria automobilística mundial, a Toyota é reconhecida pela excelência em QRD – Quality, Reliability e Durability (Qualidade, Confiabilidade e Durabilidade). E um dos responsáveis por levar a empresa japonesa a esse nível foi Tatsuhiko Yoshimura, um executivo de engenharia que trabalhou a vida toda na Toyota e após se aposentar escreveu o livro “Toyota Style – Mizenboushi Method – GD3” (Estilo Toyota – Método de Prevenção) que descreve como prevenir um problema antes que ele ocorra. Esse livro foi publicado no Japão pela JUSE Press Ltd., e a versão em inglês era restrita para os empregados da GM, empresa da qual fui funcionário por 30 anos. Hoje o conceito é facilmente encontrado em diversos sites e livros.

Após sua aposentadoria, Yoshimura-san foi contratado pela General Motors Corp. como consultor técnico, e seu método de análise e revisão de projeto, baseado em resultado de testes, foi parcialmente implementado em várias divisões da GM ao redor do globo. O objetivo foi melhorar os índices de QRD dos carros da GM, buscando a equiparação aos produtos Toyota. O esforço trouxe resultados, porém a medalha de ouro de excelência em QRD segue no peito dos japoneses.

Tive a oportunidade de me reunir com Yoshimura-san por algumas vezes em sessões individuais ou em grupos, e com ele aprendi um pouco do conceito Toyota de desenvolvimento e validação de produtos.

Ao ler as matérias dos meus colegas do AE e começar minha avaliação deste sedã lançado no Brasil em 2018, identifiquei muitos pontos do que aprendi com o executivo japonês.

A Toyota tem como princípio o máximo aproveitamento de componentes de um projeto para outro. Com isso consegue garantir a qualidade, confiança e boa durabilidade já atestado em um carro que seja idêntico no novo modelo.

Essa filosofia frustra alguns consumidores que gostam de novidades, inovações e desenhos arrojados. Por outro lado, fideliza os usuários que já conhecem a marca e seus bons resultados de QRD. Essa falta de renovação traz a impressão que o carro já era conhecido, mesmo quando é um lançamento. E no caso do Yaris foi um novo carro lançado em 2018. Talvez esteja aí a razão para o carro não ter deslanchado nas vendas por aqui, como a Toyota esperava. O brasileiro quer carros livres de problemas, mas também quer carros inovadores e bem diferente do anterior ou do vizinho.

Bom para o dia a dia

No primeiro contato o carro não entusiasma, mas também não decepciona. O espaço interno é suficiente para acomodar cinco pessoas de estatura média. O porta-malas comporta 473 litros de bagagem. A capacidade de carga é de 400 kg, o que representa 350 kg dos ocupantes, mais 50 kg no porta-malas. Ou seja, um bom carro para a família média brasileira.

O motor 2NR-FBE de 4 cilindros em linha 1,5-l flex é construído com bloco e cabeçote de alumínio e sua arquitetura é de duplo comando de válvulas, obviamente no cabeçote (DOHC, a sigla da descrição em inglês) com acionamento por corrente e variação de fase contínua na admissão e no escapamento (VVT-i). É um motor de curso bem longo, 90,6 mm, que com o diâmetro dos cilindros de 72,5 mm resulta na cilindrada total de 1.496 cm³.

A potência máxima é 105/110 cv a 5.600 rpm, e o torque máximo, a 4.000 giros, é de 14,3/14,9 m·kgf. É basicamente o mesmo motor que já equipava o Etios, com uma recalibração que lhe conferiu 3 cv a mais.

O câmbio CVT Multidrive tem simulação de 7 marchas a frente, sendo outro item que não decepciona, mas também não encanta. As borboletas atrás do volante permitem uma condução com troca de marchas no manual, o mesmo que pode ser feito através da alavanca seletora. O escalonamento das marchas permite extrair o melhor da potência do motor dando ao carro de 1.150 kg um desempenho razoável.

Para uso urbano o conversor de torque apresenta patinação excessiva para o meu gosto, similar a outros carros do mesmo nível com câmbio CVT que já dirigi. Conduzir no modo manual, facilitado pelas trocas de marchas nas borboletas, mostrou-se mais agradável, apesar de eu não ser ferrenho defensor da necessidade de borboletas para troca de marcha em todos os veículos.

A 120 km/h em última marcha o motor gira a 2.700 rpm. A aceleração de 0-100 km/h é realizada em 11,8 segundos e a velocidade máxima é de 173 km/h. São números que estão longe de dar uma conotação esportiva ao modelo, mas que para o uso diário transmitem boa sensação ao volante.

Basicamente o Yaris só rodou por rodovias nesta semana. Do total de 600 km rodados, apenas 20 km foram em trajetos urbanos e 50 km na estrada dos Romeiros. O restante foi conduzido na rodovia dos Bandeirantes, Castello Branco e Rodoanel, sempre com o ar-condicionado ligado e controle de velocidade de cruzeiro ativado na velocidade máxima da via. A média geral de consumo foi de 13,8 km/l de gasolina. Os números homologados junto ao Inmetro são 12,0/8,3 km/l no ciclo urbano e 14,6/10,1 km/l, no rodoviário.

Dinâmica veicular

O conforto a bordo é obtido através da calibração da suspensão adequada ao piso apodrecido das nossas vias. Este é outro aprendizado que tive com Yoshimura-san. A Toyota costuma ter dois ajustes de suspensão para cada projeto global. O primeiro para utilizar em países desenvolvidos, onde as vias têm melhores condições, e o segundo para países em desenvolvimento, onde o Brasil é referência, dado o volume de carros vendidos por aqui anualmente.

O sistema de direção com assistência elétrica carece de melhor definição de centragem do volante (on-center feel). Característica que foi comentada por todos que avaliaram este carro, e para mim é um dos únicos itens que sai fora do conceito Q do QRD. Tecnologicamente o sistema é capaz de oferecer um melhor comportamento, necessitando apenas um refino na calibração pelos engenheiros da Toyota. Com relação a esforço estático e progressão no dinâmico, não há o que reclamar.

Para complementar um bom resultado em dinâmica veicular é necessário boa posição ao dirigir, e nesse quesito toda ergonomia ao volante do Yaris é muito bem estudada. Os bancos têm bom conforto e regulagens manuais, incluindo ajuste de altura. O revestimento em material sintético imitando couro tem texturas diferenciadas entre o centro das almofadas e laterais.

Os pneus Bridgestone Ecopia EP150 na medida 185/60R15H transmitem pouca aspereza para dentro do habitáculo e são equilibrados para curvas e frenagens. Mais um item que não compromete e também não traz maiores emoções. As rodas de liga de alumínio têm face diamantada e pintura escurecida.

Freios a disco ventilado na dianteira e tambor atrás são comandados por cilindro-mestre assistido à vácuo. O ABS (obrigatório) está presente com controle eletrônico de distribuição das forças de frenagem. O freio de estacionamento utiliza a tradicional alavanca no console central.

Todo esse conteúdo é muito eficaz, e cumpre com o esperado em termos de desempenho. Muitos componentes são derivados do Etios ou Corolla e bem integrados neste novo carro que preenche a lacuna entre os outros dois sedãs. Mas a pergunta que fica é: será que a Toyota precisava ter três sedãs em seu portfólio no Brasil?

Bom conteúdo com conectividade

A lista de conteúdo do Yaris XLS é bem completa e oferece a maior parte dos itens de conforto que um consumidor médio espera em um carro desse segmento e faixa de preço.

Os sistemas de auxílio ao motorista mais avançados como alerta de saída involuntária de faixa, controle de velocidade de cruzeiro adaptativo e frenagem autônoma de emergência não estão presentes no Yaris. Só foram apresentados na linha Toyota na última remodelação do Corolla. Talvez, após ser bem validado no seu irmão maior, o Yaris possa receber esse adendo no futuro.

Na linha 2020 do Toyota Yaris, que carrega o sobrenome Connect, foi apresentada a nova central multimídia com espelhamento de smartphones através da tecnologia Android Auto e Apple CarPlay (vide matéria do Bob Sharp com modelo XS Connect). É um grande avanço em relação ao espelhamento SDL que equipava este modelo avaliado.
Senti falta da luz de rodagem diurna, obrigando ligar faróis baixos durante o dia. Existe, mas como acessório original para montagem na concessionária. Estranhei também não haver a função três-piscadas sem armar a seta.

Exterior equilibrado

O desenho do exterior do Toyota Yaris é bem resolvido, com boa proporcionalidade dos volumes dianteiro, central e traseiro. Sem utilizar do artifício de carregar o carro com frisos cromados, o chamado Jewell Effect (Efeito Joia), os designers da Toyota conseguiram um bom equilíbrio utilizando o preto fosco e o black piano — secisão acertada do ponto de vista econômico para posicionar o carro em uma faixa de preço compatível com o mercado.

Os faróis com lâmpadas convencionais têm formato envolvente e incorporam no mesmo conjunto as setas direcionais. Solução similar foi utilizada na traseira, onde as lanternas tem um apêndice na tampa do porta-malas. Farol e luz de neblina estão posicionados nos para-choques dianteiro e traseiro, respectivamente.

Todo conteúdo externo é muito bem acabado e, principalmente, bem construído. Nota-se que as folgas de portas com carroceria, para-lamas com capô dianteiro, grades frontais, entre outras, são uniformes e com pouca variação ao longo do carro. Considerando-se que esta unidade avaliada está há quase dois anos na frota de imprensa da Toyota, e com 10 mil km rodados, a integridade de todo esse conjunto é admirável, atestando, assim, a confiabilidade do produto. A durabilidade somente seria possível verificar em veículos com mais de 100 mil km rodados.

Mercado

Acredito que as equipes de planejamento, engenharia e comercial da Toyota no Brasil estão trabalhando para encontrar a saída da equação em que se encontram. Hoje a empresa possui três sedãs muito bons que ao invés de se completarem acabam se sobrepondo dentro das concessionárias da marca. Precisam encontrar uma maneira de trazer o consumidor fiel a outras marcas para conhecer os predicados de QRD que a marca possui. Além de ser necessário um pouco mais de ousadia para criar diferenciações mais expressivas, e quiçá, sacrificar Etios ou Yaris, já que Corolla ninguém é louco de mexer.

Na versão hatchback é um pouco mais fácil, pois são apenas dois modelos (Etios e Yaris), basta dar uma depenada em um, e um pouco de ousadia no outro, e os dois podem seguir juntos por mais tempo.

Outra boa fatia de mercado que o Yaris sedã ocupa é nos PcDs (Pessoas com Deficiência), duas versões específicas XL Live (MT e AT), com menor conteúdo são oferecidas por R$ 69.990 para atender a esse público. Nesse ponto a Toyota explorou bem a oportunidade, pois existem patologias e condições específicas na lista do programa PcD em que não é exigido câmbio automático.

GB